Vol 1 - Capítulo 5 - Caminho

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Dois dias depois, Ágata conseguia dar alguns passos por si só, mas precisava se apoiar em uma bengala improvisada com um pedaço de madeira. A situação seria considerada humilhante para uma nobre como ela, mas na atual conjuntura, aquele era o cenário mais otimista se concretizando diante dos seus olhos.

Devo ter lacerado minha perna há uma selíria, mas já consigo andar com alguma ajuda. Se esta patrulheira for apenas uma pessoa normal, então ela deveria ser contratada como médica imperial.

Pensava a nobre ao experimentar se deslocar utilizando a bengala. A patrulheira a observava perto da saída da caverna, seus pertences na bolsa jogada de qualquer jeito sobre um dos ombros, a ponta do cachimbo alojado num dos cantos da boca.

"Fiz um ótimo trabalho, não é mesmo?" Veldra contemplava orgulhosamente a nobre mancando pelo chão da caverna, acostumando-se com o tipo de deslocamento que ela conseguia realizar no momento.

"Sim, seus analgésicos estão me enganando muito bem." Respondeu Ágata secamente, mesmo sem conseguir ocultar um pequeno sorriso de alívio em seu rosto.

Seu humor agora que ela conseguia andar por si havia de fato melhorado, principalmente se ela não pensasse ativamente nos seus súditos. Alguns deles eram seus colegas há tempos, mesmo que o dever e as obrigações os mantivessem profissionalmente distantes nos últimos ciclos. Existia muita confiança mútua e um passado extenso entre eles, e a ideia de que eles estivessem em perigo, feridos ou, até mesmo, mortos, era o suficiente para preencher a mente de Ágata, exaurindo todas as suas tentativas de alívio.

Se eu estivesse acompanhada de alguém que confio, talvez eu me sentisse um pouco mais tranquila.

Pensava a herdeira, enquanto experimentava carregar a sua bolsa e andar com a bengala. Não era uma tarefa fácil e indolor, afinal, ela também estava se recuperando de fraturas nas costelas. Graças aos seus esforços, algo na sua expressão logo chamou a atenção da patrulheira que não demorou para aparecer ao seu lado.

"Deixe que eu seguro a sua bolsa para você. Temos que aproveitar que estou inteira." Veldra prontamente retirou a bolsa a tiracolo dos ombros de Ágata, oferecendo-lhe um sorriso calmo e despreocupado.

Seu olhar confiante certamente chamava a atenção, e a herdeira se perguntava se isso era um bom sinal. Talvez suas palavras fossem reflexo de arrogância, e nunca é sábio pensar que você é muito competente em uma região tão perigosa quanto os Charcos das Dríades.

"Obrigada." Respondeu Ágata, desviando o olhar para não deixar transparecer seus pensamentos.

Vendo a mercenária cheia de pertences em suas costas e cintura, Ágata não pode deixar de reparar na discrepância de trabalhos e afazeres entre as duas – frente a isso, ela sentiu uma onda de vergonha. As duas estavam sozinhas, mas todo o peso da responsabilidade caía nas costas daquela mulher. Mesmo asism, ela parecia tranquila, e sua expressão não continha um traço sequer de tumulto interno ou preocupação. Seu sorriso se mostrava alheio à situação presente.

Piscando algumas vezes antes de olhar para a saída da caverna, Ágata deu seus últimos passos naquele lugar desejando não voltar ali novamente. Após afastar as raízes, vinhas e teias penduradas que bloqueavam a entrada retorcida daquela caverna, Ágata precisou ajustar os olhos perante a claridade do dia que a atingiu, e se acostumar com os seus arredores. Por vários dias ela encarou as paredes retorcidas de uma caverna, e a mudança súbita de ambiente certamente causava estranhamento.

Depois que se acostumou com a claridade, e se afastou um pouco da sua "morada" dos últimos dias, Ágata olhou para trás. A caverna fora formada graças a erosão provocada pela queda parcial de uma das árvores anciãs, que jazia agora pendida para o lado, seu tronco suportado por uma majestosa árvore mais jovem e robusta, cujos caules se fundiam ao seu tronco antigo e a alimentavam. O som de água corrente fluía dos cascalhos abaixo e, cutucando com a ponta da sua bengala, Ágata pôde perceber que se tratava de um pequeno riacho semi subterrâneo.

Entre as cinzas (GL)Onde histórias criam vida. Descubra agora