Vol 1 - Capítulo 16 - Sacrifício

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Trinco foi deixado para trás pela humana que ele mal conhecia. Por mais que o feérico soubesse como evitar confrontos e fugir dos perigos dos charcos, ele não sabia se conseguiria criar uma distração, principalmente em um espaço tão curto de tempo. Ele desconhecia a criatura que vinha ao seu encontro, mas sabia que não era nativa dali — senão, ele reconheceria aquela presença arcana se aproximando.

Trinco tinha objeções sobre a decisão da humana, e queria ter a impedido de ir embora. Afinal, ele não tinha culpa alguma de ser escolhido como um alvo. A mulher fora quem insistiu em sair por aí com ele para caçar. Tudo bem que ela prometeu pagá-lo, e ele a acompanhou por livre e espontâneo interesse, mas se a situação se agravasse, o pagamento proposto já não mais compensaria.

Por que eu? Juro que se eu escapar desta, eu vou cobrar bem mais do que a moeda de ouro brilhante que ela prometeu. Isso aqui vale pelo menos cinco dessas moedas!

Convencido da injustiça disso tudo, Trinco respirou fundo para se acalmar. Ele precisava se esconder no ângulo certo para chamar atenção da criatura de tal forma que ela pisasse na armadilha. Ativá-la seria essencial para escapar. Ele poderia criar uma pequena ilusão e enganar a fera que o caçava! Ou então, ele mesmo poderia se colocar como isca. Mas pensando melhor, tal ideia era muito arriscada.

Tentando agir rápido, o feérico voou por alguns poucos metros, suas asas de inseto zumbindo atrás de si. Se empoleirando no galho de uma das árvores, ele se escondeu como pôde atrás das folhas frondosas. Não tardou para que ele avistasse a criatura corpulenta se aproximando, seus cascos deixando sulcos profundos no solo por onde passava. Montado em uma sela nas suas costas se encontrava um caçador – este com uma cicatriz feia em seu rosto e bastante pêlo facial para esconder a marca. O indivíduo parecia humano, então não era necessário averiguar a fundo para saber que aquele montador não conseguiria rastrear resquícios arcanos de criaturas mágicas.

Trinco fez gestos discretos com seus pequenos dedos e se concentrou. Usando metade da sua energia, ele criou um feitiço ilusório no tronco de uma das árvores bem a frente das armadilhas. Assim que concluiu seu feitiço, uma mariposa titânica do tipo "milagrosa" parecia descansar distraidamente no tronco retorcido da árvore.

Tal criatura arcana era bastante procurada por aqueles que faziam incursões nos charcos. Seu valor não vinha por causa da sua essência – que dava a esses insetos a capacidade de se teleportarem por curtas distâncias. Seu verdadeiro valor vinha da seiva contida no abdome da espécie. Uma vez extraída, aquela seiva poderia ser transformada em um ótimo material base para a criação de diversos remédios potentes. Aquelas criaturas eram tão procuradas, que expedições inteiras de humanos vinham até ali somente para caçá-las. Se aquele montador for alguém interessado em lucrar mais do que em seguir seus deveres, era possível que a visão daquela "mariposa" fosse tentadora demais para passar batida.

Humanos são gananciosos. Ele não deixaria passar esta oportunidade de ganhar ainda mais moedas brilhantes.

Trinco sentia-se satisfeito pela sua escolha. Porém, assim que seu olhar viajou da sua bela e meticulosa ilusão, de volta para a criatura e o montador, ele percebeu que o que ele fez foi um grande erro. Em vez de avançar em direção a aparente mariposa rara, o mercenário deixou a sua montaria decidir para onde deveriam ir. Ela ergueu o focinho avantajado no ar e, após farejar adiante, virou a sua cabeça bulbosa em direção ao topo da árvore onde Trinco se escondia.

Pego desprevenido pela perspicácia daquela criatura estranha, Trinco engoliu em seco. Ele tinha certeza que o humano ainda não conseguia vê-lo daquele ângulo, mas pelo jeito, não precisava visualizar seu alvo para saber que ele não era a aparente mariposa.

Entre as cinzas (GL)Onde histórias criam vida. Descubra agora