Vol 1 - Capítulo 20 - Noite

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Trinco perdera a noção da direção para onde eles o levavam. As únicas coisas que ele tinha conhecimento, era dos movimentos contínuos dos javalis e das poucas conversas entre os dois caçadores.

Aquilo não era de se surpreender. Afinal, os caçadores haviam coberto a gaiola de retenção com uma capa escura, que o impedia de identificar qualquer coisa ao seu redor. Fora isso, por mais que trinco tentasse, as propriedades arcanas daquela pequena jaula o impediam de passar os dedos por entre as frestas ou lançar qualquer tipo de feitiço.

A princípio, o feérico aguardou ansiosamente a chegada das suas salvadoras – acreditando veementemente que elas não o deixariam ser levado para muito longe. No entanto, diante do vagaroso arrastar das horas, Trinco foi perdendo as esperanças.

Ele não sabia exatamente o que esperar adiante. Quando Trinco era transportado como um “recurso” para a tropa dos Nadran, eles não o utilizavam com tanta frequência. Segundo a moça que extraía a essência do seu corpo para repor a energia dos seus equipamentos, ela não tinha a intenção de abusar daquela fonte. Segundo ela, a tropa não tinha tantos itens arcanos assim para tal exigência. Ela dizia que Trinco era “fofinho demais” para ser exaurido dessa forma, então ela o poupava mesmo que não houvesse necessidade.

Trinco a achava estranhíssima para o padrão dos humanos. A maioria das pessoas do “Além-muralha”, viam criaturas mágicas apenas como ferramentas. Haviam poucas pessoas de lá capazes de surpreender Trinco e subverter suas expectativas, e aquela mulher era uma delas. Porém, se ela era uma exceção à regra, Trinco não queria pensar no que seria a regra.

Diante do desconhecido, seu estômago afundava. Ele não queria pensar tão negativamente na sua situação, mas após tanto tempo sem sinal de que aquelas duas viriam para salvá-lo, esse tipo de pensamento seria impossível de evitar.

As horas se arrastaram e Trinco desistiu de esperar – recostando-se na grade da gaiola a espera do inevitável. Fechando os olhos ele tentou descansar um pouco, somente para ser acordado abruptamente pouco depois.

Ele não havia percebido quando os javalis pararam de andar. Apenas quando a sua gaiola foi levantada brutalmente e o tecido escuro arrancado, foi quando ele acordou do seu sono breve.

Com um resmungo, Trinco se levantou, o topo da sua cabeça quase batendo no teto da sua prisão. Depois de tantas horas no escuro completo, seus olhos tiveram dificuldade em se ajustarem à claridade. Assim que conseguiu voltar a enxergar apropriadamente, ele avaliou a situação em que se encontrava.

Os caçadores finalmente chegaram ao acampamento, e acabavam de mostrar sua mais recente captura a um especialista em seres mágicos. O especialista ajustou os óculos na base do nariz ao observá-lo, e anotou alguma coisa numa prancheta. Pelo visto acabara de anoitecer, e pelo olhar dos caçadores que o trouxeram até ali, havia um misto de alívio e cansaço neles.

O homem que analisava o feérico anotou mais algumas coisas antes de fazer uma série de perguntas aos caçadores, como por exemplo “onde eles o encontraram” e “se haviam outros da mesma espécie por perto”. Trinco não deu ouvidos a eles, observando atentamente os detalhes do acampamento ao redor.

As vestes que os membros da tropa usavam eram bem diferentes daquelas usadas pela tropa Nadran. Só por isso, Trinco pôde inferir que eles não eram de regiões próximas. O sotaque também era diferente. Bandeirolas pendiam sobre as entradas das barracas, exibindo o símbolo losangular da casa nobre que financiava aquela incursão. Fogueiras estavam acesas pela área, algumas sendo usadas para forjar armas e armadilhas, outras para cozimento. Torres de vigília feitas da madeira das árvores recém-derrubadas delimitavam as bordas do acampamento.

Entre as cinzas (GL)Onde histórias criam vida. Descubra agora