Desesperança

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Nikolai não fez as perguntas que deveria ter feito, ele apenas me segurou em seus braços até que os soluços cessassem. Eu podia gritar aos quatro ventos o quanto o Darkling era monstruoso, contudo, não podia me isentar da culpa, não daquela vez. Eu sabia, no fundo eu sabia que isso aconteceria. Eu sabia que chegaria um momento onde tudo viria a baixo, como uma casa de cartas. Meu desespero por poder, por ser melhor, mais forte e a altura de Aleksander foram pecados suficientes para que eu deixasse a Conjuradora da Luz perecer de uma vez por todas.

Eu achava que não sentia falta da luz, de ver a garota que destruiu a dobra refletida no espelho, porque ela era um lembrete constante dos fracassos em minha jornada. Mas ali, com o chão gelado abaixo de mim e sem qualquer resquício do sol dentro de mim, a solidão me fez congelar.

As sombras ainda estavam comigo, assim como o Merzost que ameaçava me consumir tanto quanto já consumia Nikolai. Lamentei o momento em que meu poder se fundiu ao do Darkling naquela capela.

Nem eu e nem o Lantsov fomos capazes de dormir naquela noite. Ele me segurou por tempo suficiente para seu corpo estar tão dolorido quanto o meu, depois disso, a lareira foi acesa e, enquanto Nikolai escrevia cartas às pressas sobre assuntos dos quais eu não me importava, eu me encolhi como uma criança assustada em frente ao fogo. Assisti as chamas até que elas se apagassem e, quando isso aconteceu, ouvi Nikolai falar meu nome baixo, me convidando para a cama, para que nós pudéssemos continuar a nossa bela farsa na corte.


☾◯☼


Genya irrompeu pelas portas do quarto poucas horas depois do sol raiar, ela sorriu para mim e para o rei na cama. Vi Nikolai piscar para ela pouco antes da ruiva começar uma ladainha, indo até as cortinas para abri-las. Em um bater de palmas, cinco serviçais entraram para arrumar o quarto, todas pareceram constrangidas ao encontrar a Sankta do sol nos braços do rei. Fingindo pudor, o Lantsov pigarreou e lançou à alfaiate um olhar de repreensão, quase no mesmo instante a Safin expulsou todos do quarto, dizendo ter cometido um erro e que voltaria mais tarde. Bastou as portas serem fechadas para que o loiro pulasse da cama.

Puxei as cobertas mais para mim, a camisa emprestada continuava sendo minha única vestimenta e o ar frio da manhã fez os pelos da minha nuca se arrepiarem. Assim que vestiu um casaco vermelho por cima das roupas, Nikolai anunciou as tarefas diárias que teríamos de comparecer. Assenti automaticamente, atenta ao semblante triste do rei para mim.

Quando uma lágrima rolou por meu rosto, compreendi o porquê do rei das cicatrizes odiar tanto a pena. Ela não tinha como ser pior para aqueles que já foram condenados.

"Estarei lá" murmurei, escondendo o rosto para evitar os olhos do tsar.

Vi o Lantsov hesitar antes de atravessar as portas do quarto, mas fechei os olhos e fingi pegar no sono, permitindo que ele se fosse.


☾◯☼


O Apparat não tardou em me lembrar das promessas que fiz sobre comparecer à uma missa em celebração ao casamento e à nova ordem que se instaurava em Ravka. Eu sabia a importância de unir coroa e fé, mas aquilo nunca pareceu tão sem propósito e tão mentiroso quanto naquele momento. Ainda sim, me dispus a desempenhar meu papel e pedi à Genya por ajuda com os preparativos.

A mulher arrumou meus cabelos, não deixando que eu me esquecesse de usar a coroa de safiras. Aquela era uma demonstração de poder e das alianças que agora mantinham Ravka em paz, eu sabia de sua importância, assim como também sabia que, mais que nunca, não passava de uma farsa. Não havia nada que eu pudesse fazer além de fingir.

Poder e Ambição - Nikolina • Malina • DarklinaOnde histórias criam vida. Descubra agora