ONZE

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Depois daquele dia, a situação foi ladeira abaixo. Por mais que minha intenção fosse resolver definitivamente a situação com Christopher, nossa conversa não me deixou nem um pouco aliviada. Eu tinha deixado claro que ele não precisava ir comigo, mas suas palavras ainda pairavam na minha cabeça. Já fazia duas semanas. Tem algo que você não está me contando, disse ele. Mas eu sou paciente. Era como esperar uma bomba explodir. E além de não saber em que pé ficava a nossa situação depois daquela declaração enigmática, eu não tinha conseguido contar nada para Maite. Ainda.

Porque eu ia contar – assim que tivesse um plano de contingência para a situação do casamento. Que seria daqui a três dias. Três. Olhei para o relógio analógico que ficava em cima da mesa. Oito horas da noite, e o dia não estava nem perto de terminar. Como poderia se nada estava saindo conforme o planejado? Eu não tinha encontrado ninguém para substituir Linda e Patricia, então eu mesma continuava cobrindo as duas. Eu ainda não tinha decidido como entreteria os convidados durante todas as dezesseis horas de duração do Open Day. E tinha descoberto que um potencial cliente, Terra-Wind, estava tendo conversas com um de nossos maiores concorrentes. Não porque fossem melhores do que a gente, mas por serem uma daquelas consultorias que oferecem serviços a preços ridiculamente baixos. Uma crise com a qual eu estava lidando nas últimas três horas.

– Obrigado, Srta. Savinon – disse o homem de terno preto na tela do meu laptop. – Vamos estudar sua oferta e chegar a uma decisão. Assenti.
– Obrigada por ter reservado esse tempinho para ouvir nossa proposta, Sr. Cameron – falei, me obrigando a sorrir com educação.
– Vou aguardar seu retorno. Boa noite. Finalizando a chamada com o representante do conselho da Terra-Wind, tirei o fone e fechei os olhos por um instante.

Meu Deus, eu nem sabia dizer como tinha sido a reunião. Só esperava ter convencido o homem. Minha equipe valia cada centavo, e a Terra-Wind era uma empresa de energia renovável que tinha os recursos e o potencial para fazer a diferença no estado de Nova York. Eu queria aquele projeto. Abrindo os olhos, vi o nome da minha irmã piscando na tela do celular, o que causou um turbilhão de emoções. Em qualquer outro dia eu teria atendido automaticamente. Mas não naquele. Eu já tinha deixado várias chamadas dela caírem na caixa postal. Se fosse uma emergência de verdade, a família inteira estaria ligando sem parar.
– Lo siento mucho, Isa – falei como se ela pudesse me ouvir.
– Não tenho tempo de lidar com mais um apocalipse nupcial. Silenciei o celular, virei a tela para baixo e passei para a pilha de currículos que o RH tinha enviado para as vagas que eu precisava preencher. Duas vagas. A ideia era dar uma olhada em alguns currículos e levar o restante para casa. Quatro currículos depois, larguei meu fiel marca-texto e estiquei as costas no encosto da cadeira. Minha cabeça girava, possivelmente porque eu estava de estômago vazio. De novo. Porque estava fazendo dieta. Bem provável que do jeito errado. Fechando os olhos mais uma vez, me repreendi por ser tão burra. Mas, por mais que eu me odiasse por isso, não conseguia parar de pensar que teria de encarar Daniel. Meu ex-namorado, que era irmão e padrinho do noivo. Que, ao contrário de mim, estava noivo e feliz. Eu teria, na verdade, que encarar todo mundo. Já sentia cada um dos convidados olhando para mim, para nós. Medindo minha reação e me analisando – da minha aparência em geral a como eu estaria de lábios brancos quando finalmente o encarasse. Procurando por respostas que explicassem por que eu ainda estava solteira depois de todo aquele tempo, e Daniel não. Será que ela superou ele? Será que ela superou tudo o que aconteceu? É claro que não. Coitadinha. Deve ter mexido muito com ela. Então, será que eu era realmente muito boba por querer parecer ótima? Não só bem. Não só seguindo em frente. Eu queria parecer completa. Bonita, impecável, impassível. Eu precisava causar a impressão de que minha vida tinha voltado aos trilhos. De que eu estava bem resolvida. Feliz. Objetivamente, eu sabia o quanto tudo isso parecia bobo, que eu não devia atrelar meu valor a um homem, a estar mais magra ou a estar com a pele boa. Mas eu sabia que todas as outras pessoas fariam exatamente isso. Balancei a cabeça, tentando expulsar esses pensamentos, mas minha cabeça girava e o movimento só piorou tudo. Aos berros, meu corpo pedia por qualquer coisa que aplacasse o vazio no estômago. Água. Isso vai ajudar. Pegando o celular e colocando o crachá no bolso da calça, levantei com as pernas mais fracas do que eu gostaria e saí da sala. Tinha um bebedouro no final do corredor. Mais três chamadas perdidas da minha irmã. Com a diferença de fuso horário, agora ela estaria dormindo.

A farsa...  (adaptação) Vondy Onde histórias criam vida. Descubra agora