Sabores

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Taehyung arrumou a última folhinha de hortelã sobre o prato da sobremesa, quase que cirurgicamente, com a ponta da língua pra fora dos lábios num auxílio inconsciente à sua concentração.

— Perfeito!

— O quê é perfeito? — Hibis passou pela mesa, jogando o casaco de couro preto pra trás de um dos ombros — Chamar seu namorado pra jantar e servir só a sobremesa? Eu ia ficar meio bolada se fosse ele.

— É que ele não vem jantar comigo... — Taehyung secou brevemente as mãos no avental — Veio pra um jantar com investidores, a negócios... mas disse que ia sair da festa antes de servirem a sobremesa pra passar mais tempo comigo, por isso que eu pensei...

— Ouh, entendi — A moça deu uma boa olhada no prato finalizado do seu colega estudante de confeitaria e pastelaria: estava dividindo o apartamento com ele perto da filial francesa de culinária profissional fazia uns três meses; bem, o aluguel na capital era meio apertado pra ela continuar pagando as contas sozinha, mesmo que ali fosse minúsculo — É inspirada em maçã do amor, essa sobremesa? Ou hoje à tarde eu fumei muito?

— É sim — Taehyung abriu aquele seu sorriso quadrado pra ela, tirando o avental pendurado no torso — Acha que ele vai gostar?

— Se sim você vai ficar sabendo logo, não? — Ela girou num calcanhar, fazendo as solas dos coturnos negros rangerem no chão de taco — Ele não vem às dez? Já são nove e cinquenta.

— Quê???? — Taehyung até soltou o avental no chão, procurando desesperadamente pelo seu celular nos bolsos da calça, na esperança da colega de turma estar errada — Me-meu Deus! E-eu nem tomei banho ainda! — Achou o telefone: ela errou mesmo, eram nove e cinquenta e cinco.

— Relaxa... se ele gostar mesmo de você vai comer seu cú sujo mesmo...

— Hibis!

— Ué, mas não é? — Destrancou a porta do apartamento, depois de pegar a chave da moto do gancho de parede.

— Não, não é — Taehyung foi atrás dela, no pequeno apartamento, poucos passos sendo necessários pra isso — E você não precisa sair, eu disse...

— Quer que eu fique aqui segurando vela pra você? — Ela bufou com deboche, jogando pro lado a cortina de cabelos compridos pintados num laranja choque, deixando exposto o side cut recentemente retocado por ela mesma — Nem vem.

— É que eu sinto que estou te expulsando... — Taehyung ainda lamentava, vendo ela sair pela porta aberta enquanto vestia o casaco de couro sobre a camiseta rasgada no colarinho.

— Fica de boa, cara — Mas ela falou tranquila, tirando um chiclete do bolso da jaqueta, desembalando e pondo na boca — Eu vou curtir uma balada, beber uns drinks... e com sorte beijar uma gatinha.

— Como se você precisasse de sorte pra isso... — O outro riu, se sentindo menos culpado.

— Não é? — A moça ergueu-lhe as sobrancelhas, convencida — Não vou voltar tão cedo, então curte a madrugada aí com seu boy — E se despediu, já de costas, sumindo pelo corredor daquele andar e escadas abaixo. Taehyung sorriu consigo, mas mal tinha fechado a porta e esticado os braços cansado pra cima, pensando "ok, talvez de tempo de um banho", a campainha tocou e claro, era Jimin, com seus cabelos castanhos perfeitamente alinhados pra trás num penteado elegante, combinando completamente com o terno sob medida, inteiramente preto não fosse pelas finas e verticais riscas vermelhas: por dentro a camisa vinho, e a gravata escura, com seu nó sobre o primeiro botão cuidadosamente fechado: ou seja, chique, cheiroso, e às nove em ponto.

— A-ah...o-oi, amor... — Taehyung passou rapidamente os dedos pelos cabelos desalinhados, se sentindo ainda mais esculhambado com aquela comparação inevitável entre como os dois estavam para aquele encontro — E-eu perdi a hora e não consegui me arrum-mh! — Mas Jimin praticamente pulou no seu pescoço e o beijou mesmo assim, sem "oi" nem "com licença", esfregando os lábios com gosto de creme de cacau nos seus como que numa tentativa desesperada de passar o excesso do batom na sua boca pra dele. Ah!... se aquele batom fosse pigmentado... Taehyung iria ficar, além de suado pelas horas de trabalho na cozinha e amarrotado, todo borrado de vermelho. Por que o pensamento lhe veio à cabeça, afinal? — ...Mnh... — Bom, talvez porque estivesse morrendo de saudades de que aqueles lábios gostosos o marcassem todo, como da última vez que tinham se visto — Ha... calma... — Pediu um tempinho, rindo, segurando na cintura do mais baixo por cima do tecido caro e apertando um pouco — Você vai me matar de asfixia.

More than friends - VminOnde histórias criam vida. Descubra agora