Perfumes

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— A-ah... Jimin... Bo-bom dia.

— Taehyung. Bom dia.

Taehyung e Jimin foram os primeiros a se levantarem no dia seguinte, e acabaram se encontrando na cozinha, ambos ainda com roupas de dormir, com a intenção de pelo menos passar um café. Taehyung estava exausto, apesar de ter dormido, e o cheiro forte de margaridas que exalava do outro o deixou mais desconcertado que a própria lembrança do que tinha visto na noite anterior.

Os dois prepararam uma garrafa de café, juntos, e por incrível que pareça do começo ao fim num absoluto silêncio: e deu num bom café. Taehyung soprou a fumaça que subia da sua xícara e bebericou devagar, enquanto via de soslaio Jimin tomar rapidamente entre sopros e goles largos; deveria estar com pressa.

— Am... — Massageou o pescoço, meio desorientado — Né, Jimin, sobre ontem...

— Taehyung — Jimin pôs a xícara vazia sobre a pia — É muito bom te ver de novo — E de repente olhou nos olhos dele: aquele mesmo olhar frio e fixo — Espero que você se sinta em casa — Que durou tão pouco, pois ele logo deu meia volta e saiu da cozinha.

"Espero que você se sinta em casa", aquilo foi um "esqueça o que houve ontem, está tudo bem", não foi? Sim, foi, com certeza foi...

— Ei... Ei! Taetae!

— Ah, sim, eu — Taehyung finalmente respondeu, depois de um tempo em que Florzinha abanava a mão à frente do seu rosto.

— Aonde está sua cabeça? — Estavam no sofá da sala, ajudando a senhora Kim e a senhora Park a desenrolar novelos de tricô — Tá aí viajando faz pelo menos uns cinco minutos...

— Foi mal... am... — Balançou de leve a cabeça, como que afastando os pensamentos insistentes no ato — Do que você estava falando?

— Do Jimin.

Ah, que ótimo...

— Que eu tenho tentado de tudo, inclusive vim morar aqui perto, mas...

— Mas...? — Taehyung desenrolava os fios de um novelo vermelho — Vocês não estão noivos? Pensei que o namoro estivesse indo bem...

— Bom, sim, o namoro vai bem... — Já Florzinha desenrolava um novelo laranja, da cor do seu vestido — Mas, sabe, ele é meio distante e... — Ela suspirou — E é muita areia, entende? Pra um caminhão pequeno...

— Ei — Taehyung parou de desenrolar seu novelo pra deixar uma carícia na bochecha redonda da moça, com as costas dos dedos — Não diga isso de si mesma: você e o Jimin são um belo casal...

— Huh... — Florzinha sorriu pequeno, agradecida, porém descrente — Obrigada, né, Taetae...

Agradecida, porém descrente... era exatamente como a senhora Park estava no jantar, quando se sentaram à mesa sem Jimin porque ele não havia chegado, e ainda mais depois, quando subiram pros quartos já depois das onze e nenhum sinal dele. Taehyung ficou acordado, girando na cama por umas longas horas, até mais ou menos umas duas da manhã, quando ouviu Jimin chegando. Por algum motivo desconhecido Taehyung sentiu um ímpeto de sair da cama: pôs um robe por cima do pijama, vestiu nos pés as pantufas e saiu do quarto, encontrando Jimin já subindo as escadas pro corredor.

— Taehyung? Acordado a essa hora? — Ele perguntou, frio, como sempre, e como quem não quer nada.

— Eu.. não consigo dormir... — Observou suas roupas, levemente amarrotadas — Bem vindo de volta — E os cabelos castanhos recém molhados, como se tivesse tomado banho antes de retornar.

— Uhm, obrigado — Então passou por ele, a passos nem curtos, nem largos, apenas precisos — Se um calmante te ajudar a dormir... acho que ainda tem na caixa de remédios que está no banheiro...

— Jimin — E Taehyung sentiu seu cheiro: um perfume forte, que não era nem o típico perfume de rosas daquela casa, nem o de margaridas do shampoo que Florzinha usava nos cabelos. Era outro perfume, de mulher, mas completamente diferente de qualquer um que Taehyung pudesse identificar naquele momento: um perfume de fora, que o fez pegar no braço de Jimin e o impedir de continuar andando — Aonde você... — Olhou pra ele, para aqueles olhos estreitos e frios, que o encararam de volta sem sequer piscar — Jimin, aonde vocês estava?

— Por que eu devo responder isso pra você? — Jimin moveu a cabeça prum lado, fazendo a franja molhada escorrer pela testa imóvel numa expressão de indiferença inabalável — O que você é, por acaso? Minha namorada? Minha mãe?

— E-eu... — Engoliu em seco, afrouxando a mão no pulso fino, sem conseguir descrever pra si mesmo o que estava sentindo ao ver Jimin o olhando daquele jeito — Sou seu amigo...

— Você não é meu amigo, Taehyung — Jimin apenas disse, simples, como se não fosse nada — A última vez que nos vimos tínhamos treze anos: eu sequer teria te reconhecido quando te vi se já não soubesse que era você.

— Ma-mas eu... — Sentiu uma falta de ar repentina, uma taquicardia e um retornar de ácido na boca do estômago — Eu pensei que...

— Que poderia se meter na minha vida com a desculpa de ser um "amigo de infância" — Jimin finalmente puxou seu braço, não por Taehyung estar impondo força nos dedos, muito pelo contrário, mas pra deixar óbvio que não queria ser tocado — Pelo amor de Deus, Taehyung, cresça!

— Ji...min...

Taehyung ergueu aquela mesma mão rejeitada ao léu quando Jimin lhe deu as costas e saiu, logo sumindo atrás da porta pro seu quarto, aonde Florzinha provavelmente estava já fazia tempo dormindo. De fato, ele não conseguia descrever pra si mesmo o que estava sentindo desde que reencontrou o amigo de infância. Ele conseguiu descrever a nostalgia que sentiu no abraço da senhora Park, mesmo que envelhecida, e que sentiu no perfume de rosas pela casa, mesmo que a casa não fosse a mesma, e que sentiu no sorriso de Florzinha, mesmo que estivesse amadurecida. Mas com Jimin... Simplesmente não havia mais nada nele que lhe remetesse aos belos tempos da infância, ao mesmo tempo em que havia tudo nele que deixava sua nuca arrepiada, seus lábios pinicando, suas mãos suadas e seus joelhos trêmulos. Era triste admitir, mas sim, era verdade: sequer o teria reconhecido se já não soubesse que era ele, que era Jimin, chegando em casa de madrugada, deitando na cama da sua futura esposa depois de traí-la sem escrúpulos ou cerimônias.

Jimin tinha crescido, tinha assumido os negócios do pai falecido e passado a gerir as despesas da casa, da mãe, e se tornado pronto pra formar ele mesmo uma nova família. Jimin tinha se estabelecido, financeiramente, e se fechado, emocionalmente, pra não ter de dar satisfação pra ninguém do que fazia ou deixava de fazer por ser ele mesmo quem pagava as próprias contas. Jimin tinha mais que envelhecido, mais que amadurecido: Jimin era, de forma completa, um adulto, algo que Taehyung estava tão longe de ser.

Talvez estivesse se sentindo assim, distante: distante de Jimin apesar de tantas vezes perto o bastante pra sentir seu perfume. 

More than friends - VminOnde histórias criam vida. Descubra agora