Cora estava aparentemente muito ocupada, limpando com extremo cuidado a prataria guardada em uma cristaleira estrategicamente posicionada próximo à porta do escritório de seu patrão, o misterioso duque da Parnaíba, quando ouviu o som alto e abafado das duas vozes trancadas naquele aposento, aparentemente discutindo. Olhou para os dois lados do corredor, a fim de certificar-se de que estava sozinha no local, e deixou de lado o trapo que usava para a tarefa antes de esgueirar-se cuidadosamente até a alcova fechada, encostando o ouvido contra a madeira grossa.
Depois de alguns minutos, bateu o pé com irritação contra o assoalho encerado de tábuas. Não conseguia ouvir uma palavra do que diziam seu patrão e a doidivanas por quem ele era responsável. Suas vozes eram muito baixas, e, por esse motivo, a madeira de lei da porta fazia seu trabalho esplendidamente e impedia que o som vazasse.
Mordeu o lábio inferior, ansiosa. Dona Celina não ia gostar daquilo. Sua patroa havia sido muito específica em suas orientações. Cora devia ocupar-se com a prataria daquela cristaleira e, caso estivesse sozinha, devia dar conta de ouvir a conversa do duque com a tresloucada Rebecca, a fim de evitar que a irresponsável iludisse o duque com suas mentiras e tentasse escapar da punição destinada a ela pela dona da casa.
Suspirando com indecisão, a criada estava prestes a se afastar quando ouviu o estrondo abafado de um corpo caindo no chão, e a voz masculina abafada, com um tom de súplica e preocupação. Curiosa, e querendo levar informações a dona Celina, Cora bateu discretamente na porta, ouvindo o som ecoar no escritório fechado.
– Entre! – Ordenou o duque, e Cora obedeceu, girando a maçaneta. Entrou no aposento e deixou a porta aberta, estacando diante da deliciosa visão na qual deu com os olhos.
O famoso e até então desconhecido duque da Parnaíba estava agachado no assoalho encerado de tábuas, tendo nos braços uma pálida e aparentemente inconsciente Rebecca. Era um homem evidentemente alto, forte, com ombros largos, usando calças e casaca escuras, botas e uma camisa clara. Seus cabelos eram negros e curtos, levemente arrepiados. Devido à posição, os músculos fortes dos braços pareciam se comprimir contra o tecido da parte de cima de suas roupas, e ele se levantou com facilidade, carregando a desacordada nos braços como se ela não pesasse nada.
Teve que sufocar a vontade de revirar os olhos diante da suposta fragilidade da moça desmaiada. Havia passado os últimos dias servindo Rebecca, e a fachada de moça boazinha e inocente da outra garota dava nos nervos de Cora, que tinha vontade de dar-lhe umas bofetadas. A futura baronesa só sabia chorar e se lamuriar pelo destino imposto por dona Celina, sem saber a sorte que tinha ao ser prometida a um velho rico e sem filhos que, sem sombra de dúvidas, não duraria muito depois do casamento, deixando-a uma viúva jovem e muito rica. Além disso, a infeliz comia como um passarinho, mesmo sabendo que suas refeições eram contadas. Parecia que queria mesmo definhar e morrer, em vez de aproveitar as bênçãos que a vida havia colocado em seu caminho. Algumas mulheres, realmente, tinham toda a sorte.
Ao ver Rebecca devidamente acolhida nos braços fortes do duque, Cora sentiu novamente o desprezo que vinha cultivando pela garota mimada gritar dentro de si. Todos os funcionários da casa pareciam enfeitiçados pela suposta inocência (evidentemente fingida) da garota, e aparentemente, o duque também logo se enfeitiçaria – se é que já não estava enfeitiçado. Sua patroa estava certa: Rebecca era mesmo uma serpente ardilosa, pronta para dar o bote em todos os homens desavisados. Infelizmente para Rebecca, porém, ela não sabia que, no tocante à arte da sedução, nem ela nem ninguém jamais poderia competir com Cora. Ainda mais uma menina sem qualquer experiência de vida, que nunca havia visto além das paredes daquela casa grande antes daquela semana.
Cora sentiu a boca secar, e uma parte especialmente íntima de sua anatomia umedecer, ao ficar frente a frente com a figura imponente do duque. Ele lhe lançou um olhar muito breve, quase parecendo não a ver, mas ela devorou os traços de seu rosto com os olhos. Tinha o rosto quadrado, com o nariz reto e bem-feito, a boca bem desenhada, de lábios rosados e finos, e olhos escuros e brilhantes. A garota aproximou-se ainda mais do duque, e aspirou discretamente o aroma marcante da pele masculina.
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When I Fall in Love | Rebecca & Rubião
Historical FictionJosé Maria Rubião, o Duque de Parnaíba, está furioso ao descobrir que a jovem moça que chamou sua atenção (e com quem trocou beijos ardentes) em um baile de máscaras é a sua tutelada que fugiu dos cuidados de sua tia na fazenda, Rebecca. Tendo confi...