O Matrimônio

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Perder o sono a noite era algo que estava tornando-se comum para o deus do trovão, e isso começava a desgastá-lo.
A noite que antecedeu seu casamento não foi diferente. Thor remexe-se sobre a cama, mudou a posição na esperança de estar mais confortável, mas nada trazia seu sono de volta. O loiro já sentia a cabeça latejar quando decidiu se levantar e andar pelo quarto. Seu corpo e mente estavam exaustos, mas seus olhos recusaram-se a fechar.
O deus andou até as portas que permitia acesso a sacada e as abriu, ele precisava de um pouco de ar, de um pouco de paz.
Repentinamente sua respiração acelerou e Thor sentiu-se claustrofóbico trancado naquele quarto. O loiro andou pela sacada e apoiou os braços no peitoril, enquanto olhava para a lua brilhante e alta no céu, acalmando seu coração a cada olhar e a cada respiração.
Era muito tarde da noite, ainda faltavam três ou quatro horas para o amanhecer, e a lua brilhava forte no céu, assim como as estrelas. Thor suspirou ao ser inundado por memórias de infância. O loiro lembrou de si mesmo quando tinha quatorze anos de idade e Loki doze. Já faz tanto tempo, mas o deus ainda se recorda das noites em claro ao lado do irmão de criação, em que ambos montaram acampamento nesta mesma sacada para contar quantas estrelas haviam no céu noturno. Todas as noites, sempre havia estrelas a mais pintando o céu e eles nunca conseguiam contar todas. Era divertido, puro e inocente.
Thor às vezes se questionava sobre qual foi exatamente o momento em que sua relação com Loki começou a desandar. Thor às vezes sente falta do seu antigo irmão. Não aquele desequilibrado louco por poder que atacou Midgard tempos atrás, não; este, Thor queria ver morto; o loiro sentia falta do Loki sorridente, travesso e brincalhão que vivia pregando peças em todo mundo, que se esgueirava até seu quarto para dividirem a cama sempre que chovia forte e os trovões balançavam os céus – Loki nunca gostou de trovões, o mais leve deles o fazia tremer de corpo inteiro, chegava a ser irônico. Thor sentia falta do irmão que ele admirava.
Agora, tudo o que restou desse enorme carinho que sentiam, foi o ódio e rancor, talvez o medo. Loki não suportava vê-lo ou estar perto dele, Thor por outro lado, estava tão decepcionado com o irmão por tudo o que ele fez que se chateava apenas de olhá-lo.
E agora, os dois estarão casados em breve.
Thor cumpriria com a promessa que fez a sua mãe, ele o protegeria de todo o mal, mesmo que esse mal fosse ele próprio. Mas o deus tinha a certeza de que não conseguiria viver o resto dos tempos ao lado de Loki. Mais cedo ou mais tarde, algo grave irá surgir desta união sem frutos; talvez acabem matando um ao outro, pois Thor não tinha achado em seu coração a força necessária para perdoar todos os crimes do irmão.
Esse casamento estava fadado ao fracasso, assim como seus planos de vida. Ele já podia sentir o peso disso sobre os ombros.

– Eu consigo ver a fumaça saindo de suas orelhas enquanto você pensa.
Uma voz delicada disse, assustando o deus do trovão. Thor tossiu, colocando em ordem os pensamentos. À sua esquerda, sempre à sua esquerda, estava Jane Foster. Thor sequer notou quando ela chegou ali, tão longe estava seu espírito deste lugar.
– Desculpe assustá-lo – Jane disse, enquanto debruçava-se sobre o peitoril.
– Não me assustou – Thor mentiu, forçando o riso em seus lábios – Além disso, eu é que devo me desculpar, acho que acabei acordando você.
– Não, eu também não consigo dormir – falou a mortal, olhando para o céu. A lua ainda estava em seu esplendor, assim como as estrelas, mas ao leste, nuvens carregadas aproximavam-se, lentamente apagando o brilho noturno. Pouco a pouco a brisa aconchegante tornou-se fria, e Jane Foster abraçou o próprio corpo.
– Você está apreensivo.
Thor nada disse, apenas esticou o braço forte ao redor do corpo feminino e frágil, tentando protegê-la do frio. Jane deitou a cabeça sobre o peitoral largo do deus do trovão e suspirou.
– A lua está linda hoje – Jane murmurou, com tristeza carregada em sua voz.
– As estrelas também – Thor lhe respondeu, beijando seus cabelos.

Os dois permaneceram abraçados, de pé naquela sacada, até que as nuvens tomaram todo o céu e a garoa leve começou a os molhar. Thor soltou Jane e a levou de volta para dentro do quarto, trancando as portas da varanda. Os dois deitaram outra vez, lado a lado, sobre a grande cama centralizada no quarto. Jane colocou a cabeça sobre o peito de Thor, traçando com a ponta dos dedos os rastros de cabelo loiro que cobria uma pequena parte do peitoral do deus do trovão, este por sua vez, abraçou a cintura magra e acariciou a pele sob o tecido fino que Jane Foster vestia para dormir, depois puxou as grossas cobertas sobre ambos, mantendo os corpos aquecidos.
Nenhum dos dois dormiu até bem cedo naquela manhã, os dois presos em seus próprios pensamentos. Thor cochilou no momento em que o sol deveria nascer; ele dormiu por cerca de duas ou três horas, e quando tornou a abrir os olhos, Jane já não estava mais ao seu lado. O deus levantou-se e olhou ao redor, mas não a achou em lugar algum, viu apenas uma bandeja deixada ao lado da cama com o seu desjejum servido. Porém, pela primeira vez em sua vida, Thor não sentia nenhum pouco de fome.

༺༻

Heimdall bateu com força sua espada sobre a Bifrost, força suficiente para partir qualquer ponte de pedra ao meio, mas não a ponte do arco-íris. O som da espada reverberou por toda a Asgard e a sua frente um grande portal se abriu, e de dentro do portal saíram oito criancinhas. Heimdall afastou-se e deu passagem para os pequeninos, saudando a todos. Mas, bem, essas não eram crianças de verdade, pois os meninos tinham barbas longas e as meninas tinham seios grandes. Apenas tinham o tamanho de uma, entretanto estes eram o séquito de anões de Nidavellir.
O líder, Ivaldi rei dos anões, e sua mulher pararam perante Heimdall, e ambos eram tão baixos que sequer alcançavam a cintura do protetor de Asgard.
– Olá, guardião da Bifrost – Ivaldi disse, curvando-se em reverência, e Heimdall achou aquele homenzinho curioso.
Apesar da altura, era um homem parrudo, com um nariz largo e olhos castanhos grandes e cintilantes. Sua barba, que era da mesma cor dos olhos, era tão longa que tocava o chão, e Ivaldi precisava enrolá-la em volta do pescoço para não findar tropeçando em si próprio.
Heimdall também o reverenciou, e para os anões foi como se a maior das montanhas se dobrasse para eles.
– Bem vindos ao reino dos Aesir, há carruagens esperando para levá-los ao palácio dourado – o guardião se adiantou em falar, apontando com a mão a direção em que a corte deveria seguir.
Ivaldi, ou qualquer outro anão, não disse mais nada. Os oito seguiram para as carruagens, e assim que subiram, os cavalos relincharam e começaram a correr depressa rumo à morada de Odin. Estes eram os cavalos mais rápidos do reino, tão velozes que transformavam a paisagem ao seu redor em um mero borrão de tinta, eles corriam como o vento; e em pouquíssimo tempo os anões já se encontravam diante da fortaleza dourada.
Os anões de Nidavellir deixaram as carruagens, ainda aturdidos com o curto passeio, sequer tiveram tempo para admirar a beleza imponente da famigerada Asgard; em seguida, guardas do Palácio vieram os receber.
– Viemos para testemunhar o casamento dos príncipes de Asgard – Ivaldi explicou para um dos guardas, e seu nome era Fandral.
– Nós sabemos – Fandral respondeu, tão sério quanto os outros guardas.
– A cerimônia começará em breve, por favor nos sigam – outro guarda falou, dando as costas para o grupo de anões e começando a andar.
– Mas já? – a mulher de Ivaldi falou pela primeira vez desde que chegou, enquanto tentava acompanhar os passos largos dos guardas, e seu nome era Edda – Nós sequer vimos o príncipe Thor ou cumprimentamos Odin, nós trouxemos presentes – a mulherzinha falou, gesticulando para as caixas que outros anões carregavam consigo.
– Por favor, meu senhor e minha senhora – Fandral começou num tom apaziguador – E peço perdão por nossa pressa, mas fomos instruídos pelo próprio deus do trovão a guiá-los até o salão do casamento assim que Vossas Senhorias chegassem aqui, mas garanto que terá todo o tempo para falar com o pai de todos e os príncipes durante o banquete comemorativo que será servido depois da cerimônia.
Os olhos de Edda brilharam ao ouvir isso, e ela apressou o passo. Ivaldi nada comentou a respeito, apenas deixou-se guiar até o destino de Thor e Loki.

༺༻

Thor estava pronto. Bem, não realmente pronto para o que viria a seguir, mas ao menos ele já estava vestido da cabeça aos pés com a sua armadura mais polida, a capa vermelha estava pendurada em seus ombros e em sua cintura estava sua espada mais afiada, e não o Mjölnir como de costume. Sobre sua cabeça estava o elmo prateado, o que sempre usava quando ia a qualquer batalha, os arranhões de guerra o traziam certo alento. Porém, dessa vez, o elmo parecia estar muito apertado, quem sabe a cabeça de Thor aumentou, ou talvez o elmo encolheu, o fato é que o estava incomodando demais, e Thor não conseguiu se imaginar passando o dia inteiro com aquela coisa na cabeça, mas mesmo assim não o removeu.
Em sua mão direita, protegida pelos cinco dedos, estava a aliança que colocaria logo no dedo anelar de Loki, Thor a segurava tão apertado que questionou-se se não teria a danificado. O loiro abriu a mão para conferir, e a aliança continuava intacta. Afinal era feita do metal mais fino e resistente de toda a Asgard.
Tomando fôlego e pedindo forças a Var, Thor entrou no salão em que sua cerimônia de casamento seria realizada. Havia certo burburinho, mas todos calaram-se quando ouviram os passos do deus do trovão, todas as cabeças moveram-se juntas para olhá-lo. Thor acenou para alguns conhecidos e também alguns líderes importantes de outros reinos enquanto continuava a sua marcha de queixo erguido até o altar, onde estabeleceu-se a direita, tão rígido quanto uma rocha, de frente para a pequena "plateia" de convidados que vieram testemunhar união tão aguardada.
Parecia que muitas horas tinham se passado, quando na verdade fazia apenas alguns minutos que Thor estava ali. O deus desejava que aquele dia terminasse logo, e quanto mais ansiava por isso, mais o tempo parecia demorar.
Levou alguns bons minutos para que aquela cerimônia finalmente começasse.
Odin, vestido com sua armadura dourada, estava diante do altar, no centro, afinal sendo ele o Pai de Todos, era certo que ele autenticasse esta união. O ancião não parecia estar contente, assim como Thor, mas o mais jovem ao menos tentava disfarçar. Sua feição estava fatigada, sua barba estava em um tom mais grisalho do que Thor se lembrava, e o velho apoiava-se em Gungnir.
Thor perguntou-se internamente se seu pai estava doente e não o tinha comunicado, ou se por acaso as maçãs de Iduna não surtiam mais o efeito desejado sobre ele, ou ainda quem sabe fosse apenas o fardo de governar que estava finalmente esmagando seus ombros e o deixando um pouco corcunda.
Entretanto, embora Odin parecesse fisicamente cansado, o brilho jovial em seus olhos continuava o mesmo.
Thor queria conversar com o pai, mas manteve-se quieto quando ouviu os guardas baterem suas lanças no chão, anunciando a chegada da noiva.
Os convidados, que permaneciam calados desde que Thor chegou, agora pareciam prender até a respiração, antecipando os próximos segundos.
Loki acabara de entrar no salão, de braços dados com Frigga que o acompanhava até onde Thor estava, sua mãe estava linda, como sempre estivera, mas Loki parecia, bem – deslumbrante – Thor precisou admitir para si mesmo.
Duas crianças Asgardianas andavam na frente do deus, derramando terra sobre o chão e sementes de todos os tipos para que ele pisasse em cima. Quanto mais sementes seus pés nus esmagassem melhor seria, pois isso simbolizava a fertilidade das noivas. Loki achava isso uma tolice, além de sujar tudo, e enquanto o deus da trapaça discretamente evitava pisar sobre as sementes, o deus do trovão aproveitou para dar uma curta olhada para o irmão de criação, tendo um vislumbre da roupa que ele usava e das flores em seu cabelo, que pareciam ser as mesmas flores que enfeitavam todo o lugar. Depois, Thor desviou o olhar para os convidados, não desejando se fixar em Loki.
O loiro reconheceu todos os rostos ali, não haviam muitos, mas todos os que estavam lá eram aliados de Asgard, todos concordavam com aquele casamento, ou assim parecia.
Thor viu Ivaldi e sua esposa logo na frente, acompanhados de seu séquito, e sentados nos bancos, seus pés sequer alcançavam o chão direito. Logo atrás estavam os elfos de luz de Álfheim, amigos que Thor conquistou a muito tempo. Suas faces brancas e iluminadas eram mais belas ao olhar do que o próprio sol. Depois vieram Frey e Freya, representando os deuses vanir de Vanaheim, também eram belos e tão idênticos aos olhos de Thor que pareciam ser apenas uma única pessoa. E perto deles, estava seus amigos; sua família.
Balder estava lá, e sua barba tinha sido aparada naquela manhã, ele estava bem de aparência, e para alguns ele era o deus mais belo de toda a Asgard. Sif estava ao seu lado, tão sisuda como sempre esteve durante toda sua vida, e ao lado dela estava Vidar, deslumbrado com a decoração do local. Ele aparentava ser o único confortável naquele salão, e as pessoas ao redor dele pareciam desfrutar de sua beleza e calmaria quase etérea.
E em um dos últimos bancos, no fundo do salão e longe da vista de todos, exceto a de Thor, estava Jane Foster; a mulher mais bela daquele salão, segundo o filho de Odin, ela estava olhando para ele. Entretanto, mesmo que sua aparência fosse perfeita e seus lábios lhe lançassem um sorriso, seus olhos não puderam esconder a tristeza e desapontamento que sentia, e a mulher desviou-se dele.
Thor fechou os olhos e inspirou, e quando tornou a abri-los os dois já estavam parados em sua frente.
Frigga segurou a mão de Thor, com a palma virada para cima, e depois pegou a mão de Loki, depositando-a sobre a do deus do trovão, entregando a ele seu filho amado.
Thor segurou a mão delicada entre seus dedos e a puxou com cuidado até que Loki estivesse parado a sua esquerda.
E Loki resistiu ao desejo de livrar sua mão do toque repulsivo do irmão adotivo.
Frigga beijou a testa de Thor e deu uma última olhada em Loki, depois afastou-se, indo se sentar ao lado dos Aesir.

E finalmente Odin pode iniciar a cerimônia.

Existia todo um ritual durante a cerimônia de casamento, envolvendo fogo, espadas e hidromel, mas nada daquilo aconteceu naquele dia. Loki sequer tinha um buquê de flores para carregar. Não houve muito empenho nos preparativos de seu casamento, mesmo que tenha sido anunciado a meses atrás, todo o resto foi deixado para última hora. Odin parecia estar com pressa e Loki ficou internamente grato por isso.
Mesmo assim o velho não abriu mão do discurso. Ele falou sobre como aguardava aquele dia, sobre o quão feliz estava em presenciar a união de seus dois filhos, o biológico e o de criação que ele salvou da morte, Odin fez questão de ressaltar. Também falou sobre o quão satisfeito estava em saber que Loki estava amargamente arrependido de tudo o que fez, e principalmente disse o quanto os amava.
"Eu vos amo, meus filhos", Odin falou com um sorriso nos lábios, tocando o ombro de cada um, mas Loki sabia que tudo aquilo era fingimento, Odin nunca o amou, ele tinha a certeza.
Depois, uma longa salva de palmas seguiu, e o momento dos juramentos chegou.

Primeiro, Odin se voltou para Thor, batendo Gungnir levemente no chão, e as chamas das lâmpadas de azeite da sala tremeram. O deus do trovão imediatamente ajoelhou-se, arrastando Loki para baixo consigo, afinal ainda estavam de mãos dadas.
– Você, Thor, filho de Odin, aceita se unir a Loki como seu companheiro até o fim dos tempos e além? – Odin perguntou, em um tom estrondoso.
– Sim – o loiro respondeu sem hesitar, rápido demais, ansioso demais.

Então Odin virou-se para Loki e lhe fez a mesma pergunta, e sua voz não soou calorosa do mesmo jeito que soou para Thor, Loki assim achou. Segundos de silêncio seguiram, mas o deus da trapaça não disse nada. Odin repetiu suas palavras, mas outra vez não obteve resposta do moreno.
Os cochichos começaram entre os convidados acerca da hesitação de Loki.

"Ele dirá não?", "mas eu achei que ele estava apaixonado…"

Loki baixou o olhar e mordeu o lábio inferior, depois olhou para a única janela daquele salão e checou o tempo; o céu estava tão negro quanto seu coração naquele momento. Thor apertou forte a sua mão, mas Loki nada respondeu. O deus da trapaça fechou os olhos e respirou fundo, e quando voltou a abri-los, as lágrimas ameaçavam deixá-los.
– Odin, por favor… – Loki sussurrou com a voz embargada, olhando-o de baixo. Esta era a sua última chance de barganhar com o velho – Por favor, pai, farei qualquer coisa…
– Você aceita, Loki filho de Laufey, aceita unir-se em matrimônio com meu filho até o fim dos tempos? – Odin perguntou outra vez, sem esboçar qualquer sentimento sobre os apelos do moreno. Afinal, ele o criou e conhecia todos os seus truques, até mesmo o choro falso que apresentava agora.
Loki fechou os olhos no momento em que suas lágrimas caíram e fungou, um sorriso desagradável infiltrando-se sem seus lábios finos, o desespero e a dor transbordavam sobre o deus. Loki atuava perfeitamente diante dos convidados.
Quando os abriu, Odin o olhava fixamente, o vinco profundo entre as sobrancelhas indicava o quão próximo o pai de todos estava de perder a paciência com tudo aquilo. Loki olhou de soslaio para Thor, que continuava na mesma posição, porém desta vez seus olhos também estavam fechados.
Loki percebeu sua visão começar a embaçar e seu corpo ameaçar ceder no momento em que Odin soltou o ar pelas narinas e apertou Gungnir em seu punho. Sua mão apertou a barra da capa e o deus da Mentira respirou fundo, acalmando-se, pois sentiu que sua morte chegaria logo.
– Pois bem, se esta é a sua escolha, então assim será – disse o Pai De Todos, palavras que soaram apenas dentro da cabeça de Loki.
Logo, uma brisa fria seguida do vento forte encheu o lugar; era Gungnir preparando-se para golpeá-lo.
– Ele aceita! – Loki ouviu alguém falar justo quando achou que tudo estava acabado, pois se dependesse de sua vontade, ele jamais aceitaria.
– Meu filho aceita casar-se com o deus do trovão – era Frigga, a sua mãe, quem falava por ele. A deusa correu para o seu lado, e também ajoelhou-se, colocando a mão em seu ombro.
–Loki aceita – ela repetiu, olhando diretamente nos olhos do rei de Asgard agora – Peço desculpas a todos, mas meu filho está tão emocionado com esta cerimônia que perdeu as palavras.
Frigga falou para todos na sala, e mostrou o rosto banhado de Loki, depois voltou-se outra vez para Odin e pediu para que ele continuasse.
Odin a olhou de cima a baixo com seu único olho bom, e prosseguiu depois.
– Agora digam seus votos – disse o velho, e Thor virou-se para Loki, sem encarar seus olhos, pronunciando suas juras. Frigga ficou de pé e afastou-se dos dois, apenas o suficiente.

– Com esta mão espantarei suas tristezas – o deus começou, erguendo a mão que segurava a aliança – Sua taça jamais ficará vazia, pois eu serei o seu vinho – Thor continuou a pronunciar, enquanto colocava a aliança sobre o dedo magro da mão de Loki.
O deus da travessura sentiu um arrepio percorrer seu corpo no momento em que o metal gelado tocou sua pele. Mesmo sendo pequena, a aliança parecia ser tão pesada quanto a corrente mais forte dos nove reinos.
– Com esta espada, protegerei o teu caminho de todo o mal – e Thor desembainhou a espada, colocando-a sobre os joelhos dobrados de Loki – E com esta aliança, eu lhe peço que seja meu.

Thor beijou os nós de seus dedos enquanto pronunciava as últimas palavras, e Loki fechou os olhos para conter o desejo de agarrar aquela espada e cravá-la no coração de seu irmão adotivo.
Depois, Loki repetiu os mesmos votos. Frigga lhe deu o anel para ele colocar em Thor, e por fim os dois estavam irrevogavelmente comprometidos um com o outro.
Não houve beijo, mas ainda assim a plateia os aplaudiu de pé, desejando felicidades aos recém-casados.
Odin ofereceu o braço a Frigga e os dois foram os primeiros a sair. Thor ajudou Loki a ficar de pé e guardou sua espada, saindo bem atrás dos pais, e logo a pequena multidão dispersou-se, indo comemorar em outro lugar.

༺༻

O banquete em comemoração à união dos deuses foi servido especialmente na sala do trono. Odin e Frigga entraram primeiro, de braços dados, indo direto se sentar nas cadeiras que lhe são de direito. Thor e Loki entraram em seguida, também de braços dados, mesmo contra a vontade do moreno, e encabeçaram a mesa posta no meio do salão, de frente para os pais, na outra extremidade.
Desde que aquela cerimônia começou, Thor não foi capaz de olhar no rosto do "marido" uma única vez; tampouco desejava olhá-lo. O loiro estava tão rígido quanto a corda de um arco, toda a sua tensão estava acumulada na ponta dos dedos, e Thor segurava com força o braço do marido, mesmo que permanecer ao seu lado fosse um tormento. Foi necessário um grande esforço da sua parte para não se virar para trás e checar Jane Foster. Ele precisava manter as aparências, tudo era pelas aparências. Com exceção de seus amigos mais próximos e Jane Foster, ninguém mais nos nove reinos sabia de seu arranjo fictício com Loki.
O que circulava era a história de como o deus da trapaça lastimava terrivelmente seus crimes, tanto que chegou a adoecer tamanha era a sua culpa; de como o deus do trovão, com seu enorme coração, se compadeceu sobre o irmão de criação, e de que dessa sua compaixão floresceu um amor ardente e desenfreado, que era recíproco. O boato que rodava os nove reinos e além foi de que Thor, o deus mais forte de toda Asgard, portador do Mjölnir e protetor de Midgard, jurou que arrancaria a cabeça de quem ousasse chegar perto do seu "amado".
Para todas aquelas pessoas, Loki era um novo homem. Para todas aquelas pessoas, Thor e Loki estavam caindo de amores um pelo outro. "Se eles soubessem…"
Por fim, entraram também os convidados.
Lady Sif e os guerreiros sentaram perto dos recém casados: Balder à sua esquerda, e à direita de Loki, sentou Vidar e depois Sif. Jane sentou ao lado de Balder, e ao lado dela o casal de anões que governava Nidavellir; Ivaldi e Edda. Logo o salão se encheu de conversas animadas e sussurros inconvenientes sobre o mais novo casal.
Odin não discursou como costumava fazer em grandes banquetes, o último discurso já foi suficiente, e Frigga parecia um pouco abatida. A comida foi servida e logo todos começaram a devorá-la, esquecendo momentaneamente toda a estranheza daquele dia.
Loki pegou os talheres, mas não conseguia colocar nada para dentro do estômago, seu desconforto era tão grande que o impedia de sentir fome. E além disso, estava desagradavelmente frio naquele salão, mesmo que a grande lareira estivesse acesa.
O deus puxou mais a capa e esfregou os pés descalços juntos embaixo da mesa, tentando aquecer-se, mas não adiantou.
– Não vai comer, Loki? – Vidar inquiriu num murmúrio, olhando para o prato intocado do deus da mentira. Ele mesmo já tinha comido quase toda a comida em seu prato.
Loki o olhou de canto, mas não disse nada, ergueu o queixo e pegou sua taça de vinho, bebendo um pequeno gole dela. Ele ainda esfregava os pés, tentando aquecê-los, e o movimento atraiu a atenção de Vidar.
– Por acaso está com frio? – Vidar lhe perguntou, tentando a todo custo manter uma conversa com o deus.
Vidar era um homem interessante, Loki observou. Era alto e bem eloquente, além de ter uma ótima aparência; às vezes Loki o achava até mais bonito que Thor. Ele também tinha um bigode branco e bem feito, tão branco quanto sua pele da cor de leite, seus cabelos eram curtos. Era muito exótico para um Aesir; ele parecia mais com um elfo.
– E você não está? – murmurou erguendo uma sobrancelha, ainda sem olhar direito para o guerreiro ao seu lado. Seu humor pouco a pouco piorava mais.
– Não. Você é o único a sentir frio aqui – Vidar falou, inclinando a cabeça e sorrindo para Loki.
O moreno de olhos verdes olhou ao redor, ninguém aparentava sentir frio, todos estavam bem agasalhados, enquanto ele ainda vestia as vestes cerimoniais.
– Deve ser porque ele usa essa camisola – lady Sif falou bem ao lado de Vidar, alto o suficiente para alguns ouvirem, e Loki pôde ver alguns prendendo o riso.
– Oh, sim, as vestes de casamento da mulher aqui em Asgard são realmente… exóticas! Em Nidavellir nós usamos algo mais parecido com uma armadura no dia do casamento – exclamou Edda, descontraída, ao seu lado Ivaldi concordava com a esposa.
– Ainda mais que o clima está frio, se você não fosse um daqueles gigantes de gelo, estaria tremendo agora dentro dessas roupas – Ivaldi comentou ainda rindo, e bebeu um grande gole do seu vinho, dirigindo-se à Thor.
– E devo dizer, deus do trovão que foi uma grande surpresa para nós quando soubemos que você se casaria com um tipo desses – Ivaldi falou, e Loki o olhou de imediato, largando os talheres.
– Um tipo desses? – o deus sibilou, apertando os punhos sobre a mesa. Vidar pôs a mão em seu joelho e pediu em um sussurro para que ele não se inflamasse, mas Loki não lhe deu ouvidos, apenas olhou para o "marido" e esperou que ele também se pronunciasse. Thor por sua vez, manteve-se em silêncio e olhou para o rei dos anões, erguendo uma sobrancelha questionadora. Edda, percebendo o comentário infeliz do marido, tentou remediar a situação rapidamente.
– Peço desculpas, vossa alteza, não foi a intenção do meu marido ofendê-lo de alguma forma – falou a rainha Edda, alternando seu olhar entre Thor e Loki – Acontece que no passado, nós os anões sofremos muito com ataques dos gigantes de gelo, Jotuns não são bem vistos em nosso reino, não importa se são bons ou maus. E nós também sabemos que Aesir e Jotuns são inimigos mortais. Foi chocante para nós saber do seu casamento, mas isso não significa que nós não aprovamos, se fossemos contra, não estaríamos aqui.
– Sim, sim. Minha esposa tem razão, eu também peço desculpas. Além disso, vossa alteza foi criado como um Aesir, correto? Não carrega nada em sua aparência que lembra aqueles monstros, sequer tem a altura para ser um.
Loki sentiu seu sangue ferver na hora. Como aqueles anões ousavam o desrespeitar dessa forma? Seu rosto ficou vermelho e as narinas dilataram, ele não ficaria mais um segundo na presença daqueles que o ofenderam. O príncipe Asgardiano se levantou de súbito, prestes a sair, mas Thor o agarrou fortemente pelo braço e o puxou para baixo, fazendo-o sentar outra vez.
– Aonde vai? – o deus perguntou sério e grave, olhando Loki pela primeira vez na cara. Loki franziu a testa e puxou o braço do aperto do "marido".
– Acabo de ser terrivelmente ofendido, e você espera que eu continue aqui? – falou Loki com uma expressão totalmente azeda em seu rosto.
– Não faça uma cena. Além disso eles lhe pediram desculpas, eu não vejo razão para você se exaltar – Thor pontuou firmemente, e todos ao redor da mesa pararam o que faziam para prestar atenção na conversa.
– Por favor, meus príncipes, por favor, já chega disso. Eu não quero ser o causador da primeira briga de casal, por ter me expressado mal. Novamente eu peço desculpas por minhas palavras – disse Ivaldi, levantando-se da cadeira e curvando-se levemente para Loki. De pé, o homenzinho parecia ser ainda menor do que quando estava sentado.
– Acho que chegou a hora de darmos nosso presente aos recém casados – Edda se intrometeu, mudando completamente o foco da conversa, ela também se levantou e colocou-se ao lado do marido, que bateu palmas.
Em seguida as portas do salão abriram-se, e quatro anões corpulentos entraram, carregando nas mãos algo grande, e aparentemente pesado, coberto por um tecido branco. O tal presente foi depositado cuidadosamente no chão ao lado de Thor e Loki, e os quatro anões afastaram-se. Edda e Ivaldi deram a volta na mesa, e ambos puxaram o pano. O espanto atingiu todo o salão, depois o alvoroço. Alguns batiam palmas, outros riem e alguns sussurravam entre si. Thor olhou estupefato para o presente, e depois gargalhou. Loki franziu o cenho, mas não esboçou maior reação.
– Este é especialmente para o príncipe Loki – disse Edda, sorrindo.
– Um berço? – Thor perguntou, rindo ainda mais alto – Ora, meus caros, Loki é um homem, para que ele precisaria disso?
– Bem, ele é um Jotun, correto? – a rainha dos anões começou a explicar – e como qualquer Jotun, seu marido também é capaz de gerar vida. Um pouco diferente das mulheres gigantes de Jotunheim, mas ele ainda é capaz. Você não sabia disso, meu príncipe? – Edda perguntou a Thor, e o loiro parecia chocado quando negou com a cabeça. Seu riso tinha morrido na garganta.
– Oh, mas é verdade, eu garanto! Meu povo sabe muito sobre os gigantes de gelo, afinal já matamos muitos! – Ivaldi falou sorrindo enquanto bebia do seu cálice, alheio à perplexidade das pessoas ao seu redor.
– E este berço é muito especial, príncipe Loki. Ele foi feito pelos nossos melhores artesãos; é de ouro puro! E a magia entranhada nele foi criada para acalmar qualquer bebê que estiver dentro do berço. Você terá noites de sono tranquilas, meu príncipe. Além disso, você não precisa se preocupar com a qualidade do berço, afinal nós também construímos Mjölnir e Gungnir, e elas nunca falharam em seu propósito – Edda falava e falava, empolgada com sua explicação sobre o tal berço, mas Loki quase não prestava atenção.
"Eu nunca ouvi uma barbaridade dessas!", "que tipo de aberração ele é?", "então ele pode parir? Mas ele é um homem!"
Loki podia ouvir todos esses sussurros dos asgardianos na mesa. Todos, com exceção dos anões, sua mãe e o Pai De Todos, pareciam chocados com a descoberta de sua biologia.
"ignorantes".
Loki olhou para Thor, e Thor olhava para o berço de ouro, sua expressão era uma incógnita.
– Olha, se prestarmos bem atenção nele, ele realmente parece com uma mulher, ainda mais nessas roupas. Não sei porque todos nós ainda estamos surpresos! – Balder exclamou, batendo a taça na mesa, e o salão explodiu em risos, alguns concordando com a sua fala.
– Já chega disso. Já chega desse assunto, meus amigos, vamos todos continuar a beber e a comer! – falou Vidar, erguendo sua taça no ar. Todos repetiram seu movimento e depois as viraram de uma vez só. Logo o clima amenizou e todos voltaram a festejar no salão.

Horas passaram-se, e Aesir, Vanir, elfos e anões continuavam a comemoração, sequer notando o tempo passar.

Thor continuava a comer e a beber. Comia como se seu estômago fosse um poço sem fundo, e bebia como se o hidromel em sua taça fosse a água limpa do rio; como se estivesse morrendo de sede, como se aquela fosse a última bebida que experimentaria em sua vida.
Loki, que não bebeu ou comeu quase nada e que ainda sentia um frio terrível, olhou para a janela e viu o céu tão escuro quanto breu; já devia passar das nove da noite.
O príncipe Jotun olhou ao redor da mesa, e constatou que ele devia ser o único sóbrio ali, os deuses desconheciam limites quando se tratava de bebida. Alguns ali já dormiam sobre a mesa, e outros falavam coisas incoerentes. Loki olhou para o trono, e notou que tanto sua mãe, quanto o Pai De Todos não estavam mais lá, o moreno franziu a testa e mordeu o lábio inferior, esticando o pescoço para ver se avistava sua mãe, pois desejava a companhia dela, porém não a encontrou.
– Algum problema, Loki? – Vidar o questionou num sussurro, aproximando o rosto para que Loki pudesse ouvi-lo, e Loki sentiu o forte cheiro de álcool que vinha à cada respiração dele.
Loki olhou para ele, ficando alguns segundos em silêncio, antes de responder. Vidar e ele nunca foram muito próximos, não eram amigos, mas também não desconheciam um ao outro. Talvez ele fosse o único ali que era capaz de manter uma conversa com o deus da Mentira sem entediá-lo. Além de parecer ser o mais sóbrio da mesa – depois dele, claro –mesmo fedendo a vinho.
– Estou procurando minha mãe – Loki falou um momento depois.
Vidar olhou para o trono e depois para Loki.
– Ah, sim. Frigga saiu agora pouco, junto a Odin. Já é tarde e até o pai de todos precisa descansar, considerando o quão velho ele é – Vidar respondeu num sussurro, lhe dando uma piscadela e sorrindo. Loki retribuiu o sorriso discretamente, era muito raro ouvir um Aesir desdenhar do rei de Asgard.
O álcool parecia soltar a língua do homem ao seu lado, e rapidamente os dois deram início a uma longa conversa.
Falaram por mais de uma hora, sobre os assuntos mais diversos, Vidar era um ótimo orador. E pela primeira vez na noite, Loki não se sentia desconfortável, tanto que ignorou quando Vidar colocou a mão acima do seu joelho. Loki não gostava muito de ser tocado, mas Vidar o deixava tão à vontade que ele não se importou, até que a mão começou a subir por sua perna e acariciar sua coxa por cima do leve vestido. Loki interrompeu a conversa e olhou ao redor, alarmado, mas ninguém pareceu notar o contato indevido.
– O que pensa que está fazendo? – Loki perguntou baixinho, não querendo chamar atenção para si.
– Desculpe, desculpe. Eu apenas não posso evitar – Vidar disse, apoiando um braço sobre a mesa e aproximando ainda mais o rosto para sussurrar – Você é tão belo que fica difícil conter-me.
– Está louco?! O que pensa que está dizendo? Você não teme por sua vida? Thor está bem ao meu lado! – Loki falou agoniado enquanto olhava para o marido. Thor conversava animadamente com Balder e Ivaldi, e sequer lhe dirigia algum olhar, além disso, os três pareciam tão embriagados quanto o resto da sala.
– Loki, por favor, não precisa fingir para mim, eu sei que tudo isso não passa de um teatro – esta última parte foi sussurrada, a mão ainda acariciava sua coxa – Além disso, eu tenho uma dúvida que quero tirar.
Vidar alternou o olhar entre Thor e Loki, e o último estava boquiaberto diante do seu atrevimento. O homem de bigode branco infiltrou sua mão sob o tecido do vestido e continuou a subir sem pudor algum.
– Diga-me Loki, – ele começou, e sua unha arranhou a pele sensível da parte interna da coxa do deus da mentira – é verdade que as noivas não usam nada por baixo do vestido cerimonial? – Vidar perguntou, com um sorriso de canto de boca, e encarando o moreno nos olhos. Loki apertou as pernas juntas quando um arrepio percorreu seu corpo, e removeu rapidamente a mão de cima dele, ele estava estarrecido e principalmente furioso. Como Vidar ousou o tocar daquele jeito, quem ele pensa que é?! Se Loki pudesse usar sua magia, Vidar não teria nenhuma das mãos agora. Mas ele não podia, ele estava sem defesas.
– Calma, eu só estava brincando – disse Vidar, tropeçando em suas palavras, erguendo as duas mãos, e Loki se aborreceu ainda mais.
O deus levantou-se, arrastando a cadeira ruidosamente contra o chão de pedra. Todos, os que estavam acordados ao menos, viraram suas cabeças para ele. Thor o olhou de baixo, com sua visão embaralhada pelo álcool.
– Para onde vai? – o loiro perguntou com sua voz grossa.
– Para meus aposentos – Loki respondeu rapidamente, só o que desejava era sair logo dali. Já tinha sofrido humilhações demais por um dia.
– Oh, mas já? Ainda está cedo, e agora que está casado você não deve ir sem o seu marido. Afinal é sua noite de núpcias – Edda falou, aquela mulherzinha intrometida, com um pequeno sorriso adornando seus lábios.

Loki fechou a cara e olhou para Thor, agarrando a ponta da capa e tentando cobrir ainda mais o seu corpo. Ele esperou Thor levantar-se e o acompanhar até seu quarto, mas o loiro lhe disse que desejava ficar um pouco mais. Loki se viu tão aborrecido que sentiu vontade de chorar, e saiu às pressas do salão, pisando duro no chão frio e ignorando completamente os chamados do marido. Danem-se as aparências.

– Oh, nossa. Seu marido parece ser bem… temperamental – Edda comentou, dando outro de seus sorrisos — Você terá um longo trabalho pela frente, meu príncipe.
– Em Nidavellir, isso jamais teria acontecido. É uma enorme falta de respeito da esposa largar o marido para trás desse jeito. Agora que o príncipe Loki está casado, ele não deve nunca andar sozinho por aí, deve estar sempre atrás de seu marido. E se você se recusou a recolher-se agora, era obrigação dele aguardar ao seu lado, bem aqui – Ivaldi pontuou, apontando o dedo indicador para a mesa de madeira.
Thor respirou fundo e bateu com o punho na mesa, fazendo os copos balançarem. O deus do trovão não gostava quando os outros lhe diziam o que fazer, ele pouco se importou com a maneira que Loki agiu, todavia ele não podia parecer um fraco diante de seus aliados, alguém que era incapaz de controlar o próprio marido. Se ele não fosse capaz de cuidar de Loki, como cuidaria de Asgard quando herdasse o trono?
– Tem razão, e eu peço desculpas. Vou cuidar do meu marido agora mesmo. Aproveitem o resto da noite e sintam-se em casa.
Irritado, o deus do trovão levantou-se, sentindo-se um pouco tonto pelo álcool, e bebeu seu último cálice de vinho da noite. Vidar também se levantou e o impediu de se mover quando Thor estava prestes a sair.
– Não perca a paciência com ele – Vidar pediu, com a mão em seu ombro.
Thor apenas o olhou em silêncio, em seguida desvencilhando-se do amigo e saiu em passos largos do salão, seguindo o rastro de seu querido irmão. A sua espada balançava presa ao seu cinturão e trovões puderam ser ouvidos. O estrondo derivado deles era tão alto que poderia até mesmo partir uma montanha.
Estava chovendo forte.
Realmente, aquele era o clima para um funeral.

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Loki correu pelos corredores amplos e mal iluminados do palácio, as flores caindo do seu longo cabelo a cada passo que dava; o príncipe correu o mais rápido que conseguiu. Esta era a primeira vez em muito tempo que ele estava "livre" para andar sozinho por ali, e o deus da Mentira só pensou em uma coisa: fugir dali o mais rápido possível, ele não teria outra chance dessas. Loki continuou a correr, em direção a entrada do palácio dourado, o deus já estava ofegante e por breves segundos ele teve a ilusão de que conseguiria escapar dessa vez. Ele já podia sentir a euforia tomar conta de seu corpo, mas seus planos morreram assim que dois guardas apareceram em sua frente, Loki sequer tinha alcançado direito os portões antes de ser barrado e segurado nos braços por eles.
– Onde vossa alteza pretendia ir? – um deles perguntou.
– Thor nos disse para acompanharmos você de volta a seus aposentos – o outro falou enquanto o escoltavam até seu quarto, este era Fandral. Loki manteve-se calado.
Tolo, como ele pôde achar que escaparia assim tão fácil? O Palácio dourado é uma fortaleza muito bem vigiada, há guardas em todos os lugares, em todas as saídas conhecidas. Com certeza a segurança havia sido reforçada para o dia de hoje. Por que ele pensou que seria tão fácil? Por que ele pensou que conseguiria?
Como dito, os guardas o guiaram até seus aposentos, e quando chegou lá, Loki viu que Thor o aguardava em frente a porta. Sua expressão não era nada boa, e assim que viu o moreno, a carranca só piorou. Os guardas deixaram Loki ali e curvaram-se para Thor, em sinal de respeito, e o deus agradeceu, e assim que eles se afastaram, Thor segurou o "marido" pelo braço e o puxou para dentro do quarto, as portas bateram com força quando se trancaram magicamente atrás dos dois.

– Como você se atreve?! – Loki reclamou, agora na privacidade de seu quarto. Em resposta, Thor o jogou, sem nenhuma delicadeza, em cima da cama.
– Não, como VOCÊ se atreve! – Thor vociferou, lhe apontando o dedo na cara – sair daquele jeito, na frente dos convidados e sem a minha permissão! Você sabe que não é assim que deve agir!
– Sem a sua permissão? Me poupe, você não é meu dono! – Loki gritou de volta, levantando-se e massageando o braço. Em seu interior, Loki sabia que seu marido não o machucaria propositadamente, mas também sabia que Thor não media a própria força, principalmente quando estava irritado.
– Eu sou seu marido, isso me dá algum direito sobre você! – Thor gritou de volta, sabendo que eles eram os únicos naquela ala e que ninguém ouviria seus berros.
– Eu não sou sua propriedade! – Loki gritou de volta, batendo o pé.
– Você é sim minha propriedade, e também a minha responsabilidade. Tudo o que fizer refletirá em mim de hoje em diante! E mesmo estando ciente disso, você abandonou nosso banquete daquela maneira e ainda tenta fugir?! – Thor estava verdadeiramente enfurecido. Tão bravo que seu rosto adquiriu um tom rubro mais forte que a capa em seus ombros.
– E você esperava que eu apenas ficasse lá quieto enquanto aqueles anões asquerosos e seus amigos nojentos me ofendem? – Loki desdenhou, também enfurecido, arrancando as flores que restaram em seu cabelo – E eu só fui em busca da liberdade que você jamais me dará.
Thor olhou para ele e depois sorriu, seco e sem uma gota de paciência, depois removeu seu elmo e o jogou no chão aos pés de Loki. O deus da travessura sobressaltou-se com o baque do metal no chão, mas manteve-se firme. Thor aproximou-se dele enquanto penteava os fios de cabelo loiro com a ponta dos dedos, e Loki torceu o nariz ao odor de vinho que Thor soprava a cada respiração.
– Ouça o que vou lhe dizer, irmão – Thor começou a falar com a língua pesada pelo álcool, e Loki sentiu vontade de corrigi-lo, de dizer que ele nunca foi seu irmão, mas manteve a boca fechada – Se não for para acompanhar-me, você jamais sairá deste quarto.
– Então é assim que tudo será? Ficarei preso aqui aguardando suas vontades? – Loki perguntou entre dentes, amassando a última flor de seu cabelo entre os dedos.
– E você achou que seria diferente? Ontem eu lhe dei opções e você escolheu a mim, então acostume-se, pois é assim que viverá.
E dito isso Thor saiu às pressas do quarto, Loki viu apenas quando o raio vermelho passou pela soleira da porta, e esta trancou-se, prendendo-o.

E assim foi sua noite de núpcias.

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