Boneca do destino

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Jogo a mochila consideravelmente e perceptivelmente mais pesada agora sobre as costas, seguro a aste da mala de oxigênio e dou um beijinho na bochecha da minha mãe e da Bruna, saio de casa e suspiro enquanto entro no carro para a parte de trás, em qual meu pai estava no banco do motorista. Tinha recebido alta ontem e não vi June desde minha crise de ansiedade, justo no dia em que aceitei o pedido de namoro... Quimioterapia era meu ponto fraco, mais do que o próprio câncer ou a morte. Demorou anos para o meu cabelo crescer e minha autoestima florescer mais uma vez, os resultados sairão daqui uma semana e eu torço com todas as forças que me restam para que esses tumores de bosta não tenham que receber quimio para diminuir. A medicação usada me deixa tão mal que pareço estar quase inconsciente e a ânsia fixa mesmo que eu sabia que não existe vômito algum me deixa enlouquecida. Pego meu celular e desço as várias mensagens e acho o contato de June.
      "Oi, Milley. Desculpa por tudo, eu estava fora de mim e eu não sabia daquilo... Eu não achei que fosse algo tão sério, achei que você estava brincando, mas no final, era tudo bem pior do que eu sequer já pensei ser."
     " Sei que provavelmente não vamos reatar, mesmo que eu deseje muito isso. Queria que isso fosse destinado a acontecer, e por mim aconteceria, mas nenhum casal é formado por uma única pessoa."
     " Milley, é sério. Estou preocupada. Ninguém sabe de você há dias... Não precisa responder nada sobre as coisas acima, mas por favor, me diga que está bem..."
     "Ei, Milly... São quatro dias que eu não tenho nenhuma notícia sua... Está tudo bem? Tem haver com o câncer?"

    Vejo a conversa dela com minha mãe e então uma mensagem até que recente... Era de ontem.

     "Oi, amor, está tudo bem? Ninguém me atualizou sobre como você está e na saída não me deixaram voltar por quê descobriram que não somos noivas, hehe. Sei que só deve me responder amanhã, mas não aguento mais esperar."
    "Ah, O carro da minha mãe está no mecânico por conta de um vazamento e meu pai bateu a moto ( pela milésima vez ) em um poste antes de ontem, está para concerto até semana que vem... Acha que consegue passar aqui amanhã para me buscar? <3"
  
    — Pai?
    — Não, você não pode ficar no meio do caminho para ir fazer alguma outra coisa. — rio.
    — Não é isso, bobo. A June não tem como ir para escola... Passa na casa dela para podermos buscá-la? — ele me olha pelo espelho e sorri.
    — Passo sim. Não se preocupe... O endereço é aquele que me passou por mensagem mesmo?
    — Ah, não, não... Aquele é o de Anne. Se você seguir reto e na quinta quadra virar a direita, você chega na rua dela. É uma casa bem grande com um gnomo bem ridículo na frente.
     — Sua descrição é incrível. — rimos e o mesmo brinca com o rádio, colocando Bohemian Rhapsody, de Queen.

    "Oi Juju, você já conseguiu carona?"

Não demora mais que alguns minutos para ela visualizar.
  
     Girlfriend <3 está digitando...

    "Oi pequena, não consegui não... Anne está com o namorado e não quer me deixar de vela, vê se pode?!"
    " Já está na escola?"

     "Que nada, vamos passar aí. Saí de casa agora, então não se preocupa, ainda tem uns quinze minutos.
    
      "Você é um anjo, só pode."

      "Bobona."
      "Vamos passar no banheiro antes das aulas?"
     
      "Com certeza... A minha primeira aula é de português, não é tão importante. Posso faltar, se quiser...
     
      "A minha é biologia. Nem um pouco importante."

June só visualiza e bloqueio o aparelho. Encosto na janela do carro vendo os vultos das casas passarem pelo vidro. Meu pai estava indo até que rápido e estava sorrindo, isso era muito suspeito. O humor dele sempre foi uma bosta de manhã e de uma hora para outra ele está todo sorridente? Aí tem coisa. O mesmo finalmente vira na quinta quadra e lhe indico a casa com aquele maldito gnomo verde musgo de tanta bactéria que ele provavelmente continha. Ele estaciona e buzina duas vezes, desço do carro e espero algum tempo, que merda, ela estava tomando banho ou trocando de roupa ainda?! E sim, Brown sempre toma banho para ir para escola porquê sempre sinto o cheiro de framboesa do sabão preferido dela, e claro, aquele desodorante de marca duvidosa que cheirava como lenço umedecido de bebê.
     Bato na porta e escuto alguém vindo abrir. Jayne aparece de shorts largos e sem camisa, todos os Brown são tão... Sério, como é que ele tem um abdômen tão definidinho assim?! Eu podia lavar roupa ali. Ele sempre teve essa tatuagem de água na cintura? Jay estava com cara de sono e boceja assim que me vê.
      — June? — concordo — Quarto. Essa imunda combina as coisas e ainda se atrasa... Vem, entra. Se quiser esperar com ela... A casa é sua.
      — Valeu Jay. — adentro a casa e subo as escadas, seguindo pelo curto corredor até o quarto da garota. Bato na porta e ela resmunga.
       — Íris, eu já falei que não vou arrumar seu quarto! Eu estou atrasada. — rio baixinho e bato de forma ainda mais irritante — Íris, porra! — ela grita.
       — Oque foi sua chata?! Eu estou no meu quarto! — escuto a garota gritar do quarto ao lado, rio baixinho e cruzo os braços.
       — Quem é que tá batendo nessa porra?! Eu estou sem blusa, caralho! Se quiser entrar, entra então. Cacete.
       — Não é como se eu já não tivesse te visto sem. — resmungo e um longo instante de silêncio reina até ela correr para abrir a porta desajeitadamente, a mesma cora e rio baixinho — Bom dia para você também.
        — Que horas são?! — dou de ombros — Meu Deus, eu devo estar muito atrasada. Eu estava tomando banho... Você não me julgaria por tomar banho de manhã, não é?
         — Eu já sabia. — adentramos o quarto e fecho a porta mais uma vez.
      — Sabia? Eu não lembro de ter contado. — ela diz pondo um top acinzentado e ajeitando o cabelo em um espelho, me olhando de canto de olho pelo reflexo.
      — Mas você sempre está com cheiro de framboesa, que é do teu sabão preferido. Isso você me disse. — ela ri baixinho.
       — Coisa de psicopata, Milley. — ela pega uma blusa preta qualquer e veste, batendo nela para tirar o excesso de amassados.
       — Por quê nenhum dos seus irmãos estão se preparando para a escola? — resmungo.
        — Eles faltam a última semana, mas eu estou de recuperação... Sério, quanto tempo temos? — penso um pouco.
      — Acho que uns vinte minutos, por quê?
      — Me atualiza... Os tumores, tudo.
      — Ah... Fizeram os exames e os resultados saem em uma semana, realmente espero que não precise de quimioterapia... Eu odeio. — ela concorda.
       — Eu imagino que deva ser péssimo... Damian também odiava. — suspiro.
        — Mas me disseram que ainda tenho meus seis meses e três semanas.
        — É tão pouco tempo... — concordo e seguro sua mão — Queria ter todo o tempo do mundo.
         — Quem me dera... Meus dias estavam contados desde que nasci... Queria que pudéssemos namorar, casar...
       — E ter dois filhos loiros. — rio e lhe mostro a língua — Vai me dizer que não gostaria?!
        — Gostar é pouco... Amor... — ela me olha e entorta um pouco a cabeça — Eu não quero ir para a escola... — ela ri baixinho — Eu quero ficar com você, abraçada, dando beijinhos e vendo alguma daquelas suas séries bobas na televisão...
         — Primeiro, não posso meu anjo, por mais que eu queira ficar aqui, preciso muito recuperar a nota. Quero me formar esse ano... E segundo, minhas séries não são bobas!
        — Não, nem um pouco. Não é como se uma lésbica de uns dois metros com uma espada mágica de aliens não pudesse salvar o mundo com um beijo com uma garota meio gato. Isso acontece todo dia, claro. Sério?
        — Essa série é minha favorita! Como você ousa?! É uma série animada de fantasia, claro que não vai ser real. — rio baixinho — As suas séries são muito estranhas também. — saímos do quarto e vamos descendo a escada.
         — Não são, elas são mais normais que as suas, com certeza.
         — Você literalmente vê como vender drogas on-line. Isso é normal? Sério? — rio baixinho.
         — Pelo menos é baseada em fatos reais e fala de um assunto que acontece diariamente até os dias de hoje. E não de uma lésbica alta com sérios problemas de autoestima e descobertas sobre uma espada mágica de aliens, isso enquanto tenta matar um cara muito feio pra salvar a garota que queria matar ela a cada episódio da série...
       — Não fala mal da Adora, ela tentou o melhor dela. E a Felina se arrependeu, já é um começo... — ela pega a mochila jogada ao lado da lareira e volta ao meu lado.
       — Somos bem o oposto delas. — June me olha e franze as sobrancelhas — Se pegarmos a garota gato e a princesa interestelar e colocarmos no nosso relacionamento, eu seria Adora e você a Catra. E somos bem o oposto de cada uma. — entro no carro e ela também o faz, pensativa.
        — Realmente... Eu sou bem mais alta e não quero te matar, e claro, sou humana.
      — E eu sou consideravelmente menor e meu cabelo não é estupidamente comprido. — ela ri e me beija.
      — Só para deixar claro que meu carro não é motel. — meu pai reclama com um sorriso radiante no rosto e então June se desconecta de mim, corando.
       — Pai, não começa. — a puxo pela manga da blusa e a beijo mais uma vez.
      

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⏰ Última atualização: Sep 28, 2022 ⏰

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