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Na manhã seguinte, chego na calçada de Jennie cinco minutos inteiros atrasada. Não faço de propósito, só perco a hora mesmo. Ela está lá fora em pé, impaciente, o cabelo longo perfeitamente liso, a maquiagem impecável. Ela segura uma garrafa térmica gigante prateada e o celular do mesmo jeito que todas as meninas bonitas fazem: reto na palma da mão, como se ela estivesse prestes a sussurrar fofocas no alto-falante a qualquer instante.

Espero um comentário sarcástico sobre meu atraso, mas Jennie fica em silêncio quando abre a porta. Ela coloca as bolsas no banco de trás e a garrafa térmica no meu porta-copos sem pedir permissão. Parece invasivo, ainda mais nesse espaço contido e íntimo. Um espaço que normalmente só compartilho com as pessoas mais próximas: minhas irmãs, Roseanne ou, até mais recentemente, Tally.

Dou ré na garagem e aumento o volume da música para disfarçar o silêncio estranho. Meus nervos estão à flor da pele, esperando ela dizer alguma coisa. Noto quando ela pigarreia. O aroma amadeirado e acentuado do perfume dela me faz fungar.

Quando viramos na rua principal, decido quebrar o silêncio.

— Desculpa o atraso. — Eu me inclino no banco, fingindo que estou me sentindo à vontade. — Espero que não tenha sido muita inconveniência.

Ela passa a mão pelo cabelo.

— Não foi — diz, categórica. — Eu geralmente saio às 7h30. Falei 7h25 porque sabia que você se atrasaria.

Por um segundo, tudo que consigo fazer é encará-la.

— Peraí, quê?

— Ano passado você nunca chegava na aula de História antes do segundo sinal tocar. — Ela olha para mim. — Não é uma ofensa, só uma observação.

Meu sangue ferve. É verdade que eu sempre me atrasava para nossa aula de História Avançada dos Estados Unidos, mas só porque o armário de Tally ficava ao lado da sala e eu enrolava ali com ela até o último segundo possível. É um lembrete do qual não precisava tão cedo assim.

— E daí? — ralho. — Por acaso você é fiscal do horário de chegada dos outros?

Jennie ri, descontraída.

— É tão fácil te irritar.

Consigo imaginar a impressão que devo ter passado para ela entrando correndo na aula todo dia. Será que ela me via com Tally ano passado? Será que conseguiu enxergar as rachaduras nesse relacionamento antes de mim? Era por isso que ela me achava uma otária? Uma sensação de vergonha preenche meu peito.

— Sou melhor em chegar na aula de História Europeia a tempo — digo, incisiva. — Mas acho que você não saberia disso, já que não conseguiu uma vaga nessa.

É uma coisa muito esnobe de dizer, mas quero irritá-la e não tenho muitas cartas na manga. Parece funcionar, porque ela coloca o celular de lado e me lança um olhar fulminante.

— Eu consegui a vaga pra aula. Só não quis fazer.

— Quê? Por quê?

— Ah, qual é? História europeia? Uma aula onde você literalmente estuda como os homens brancos trazem desgraça com as Cruzadas, colonização e catapora? E ainda assim não temos orçamento para oferecer História da África ou História da Ásia. Tá bom. Se esse é o ápice dos estudos acadêmicos que nossa escola tem pra oferecer, eu passo. Pode falar o que quiser da aula normal de História Moderna da srta. Bowles, mas ao menos ela tenta desconstruir essa coisa de hegemonia europeia, e isso é um uso muito melhor do meu tempo.

Não consigo pensar em nada para dar como resposta, e não só pelo fato de que ainda estou tentando entender o que hegemonia significa.

Jennie dá um gole satisfeito da garrafa e balança a cabeça.

A Jogada do Amor (Jenlisa)Onde histórias criam vida. Descubra agora