Vamos com calma...

612 28 2
                                    


Anahi achou difícil dormir naquele dia. Deitou na cama e rodou de um lado para o outro. Cama quente e macia, edredon fofo, travesseiro confortável. Aquilo era muito diferente da sua realidade de três anos. As costas pareciam agradecer aos céus por tamanho milagre.
Outro motivo era que não conseguia tirar aqueles olhos verdes da sua mente, rodava na cama lembrando de seus lábios tão convidativos, seus braços que deveriam ser maravilhosamente fortes e incríveis de tocar.
Reprovou esses pensamentos e forçou os olhos a ficarem fechados. Precisava dormir.

-/-

Ding-Dong
Deu um pulo da cama ao ouvir a campainha, deveria ser apenas o porteiro ou o síndico do prédio. Bocejou e coçou a cabeça ainda lutando para manter os olhos abertos.
Ding-Dong
- Já vai!! - gritou limpando os cantos dos olhos que talvez deveriam estar sujos.
Abriu a porta e abriu a boca em seguida.

-/-

Ela estava lá, parada no batente da porta, com o cabelo desgrenhado, o rosto completamente amassado, um pijama de verão curtíssimo, que mostrava suas coxas grossas e bem torneadas.
- Er.. Bom dia! - Poncho disse segurando um sorrisinho.
Ela arregalou os olhos tentando puxar o shorts do pijama para baixo, em vão. Tentou arrumar os cabelos, estava visivelmente desconcertada.
- Como descobriu o número do meu apto?
- Perguntei para o porteiro... Srta. Anahi Giovanna! - ele sorriu.
- Ai caramba.. Deixa eu vestir algo apresentável... Entra aí e senta... Fica a vontade...
Correu para o fim do corredor e ele deu risada enquanto se sentava no sofá.
- E quem disse que eu queria que você subisse hein? - ela perguntou gritando.
- Acho que o porteiro gostou da minha carinha de cachorro abandonado que caiu do caminhão de mudança... Disse que precisava urgente falar com você e ele me deixou subir...
- E se você fosse um maníaco??? - ela gritou novamente e ouviu sua risada.
- E quem te garante que eu não sou?
Silêncio.
- Você não é, né? - perguntou mais baixo.
- Na verdade sim... Onde você guarda suas facas grandes de corte? Estou tentando achar aqui para te matar, mas não encontro... - ele riu e ela o acompanhou.
- Segunda gaveta da direita..
- Achei...!!! - gritou. - Agora estou indo atras de você.. Só tente não gritar ok? Não quero levantar suspeitas...
- Só me prometa que será rápido e indolor...
- Como a Srta deseja!
- Bom saber! - ela surgiu na sala vestindo uma calça jeans justa com um blusa rosa bebê. - Alem de me matar, o que veio fazer aqui?
- Er... - ele coçou a nuca. - Hoje é meu dia de folga e bom.. Pensei que poderíamos fazer algo... Sei lá.. Se você quiser né? - ficou um pouco vermelho e olhou para baixo.
Anahi sentiu seus olhos brilharem, o modo como ele havia ficado desconcertado a deixou suspirando. Se existisse um homem perfeito, com certeza seria esse parado em sua frente. Tinha sua vingança para colocar em prática, um emprego para arrumar, sua vida para organizar, mas vendo aqueles olhos verdes não conseguiu pensar em mais nada.
- Hm... Também não tenho nada para fazer hoje... O que tem em mente?
Ele a olhou sorrindo.
- Gosta de cavalos? - ela assentiu com a cabeça. - Tenho dois cavalos em um hípica e pensei em vê-los hoje... Topa ir comigo?
- Claro!!! - sorriu com todos os dentes. - Vou só colocar uma bota e já vamos!

-/-

Passaram um dia muito divertido, o sonho de Anahi sempre foi montar. Teve um pouco de dificuldade no começo, mas Poncho a ajudou em todos os momentos, sempre ficando ao lado dela. Se aproveitou da situação para segurar em sua cintura, e manter-se sempre perto o suficiente para sentir o cheiro de seu perfume de baunilha.
Decidiram almoçar juntos em um restaurante de comida caseira perto da hípica.
- Nunca havia montado né?
- Uma vez.. Em um pônei... O orfanato fez um passeio para um sítio e montamos nesse pônei.. - Anahi mexia a comida de seu prato, sorrindo. - Eu até que andei bem... Mas quem levou um belo tombo foi minha irmã.. - arrependeu-se em seguida, não queria lembrar a irmã, não queria se recordar dos momentos falsamente felizes que teve ao lado dela.
- Não gosta de falar nela né? - ele perguntou erguendo os olhos.
- Na verdade não... Dói muito...
- Então é melhor mudarmos de assunto certo? Senão vai derramar rios de lágrimas de novo.. E encharcar minha camiseta como ontem...
Anahi levantou os olhos, vermelha de vergonha e lhe deu um tapinha no braço, rindo em seguida.
- Bobo!
- Você trabalha com o que? - ele perguntou.
Anahi ficou tensa novamente. Tinha que dar poucas informações sobre a sua vida, não queria que ele descobrisse agora que ela era uma ex-presidiária.
- Era bibliotecária... Aí sai do meu emprego porque passei um tempo fora da cidade...
- Foi para onde? - ele perguntou e Anahi estremeceu de novo.
- Monterrey... Passei três anos lá estudando. - encerrei esse assunto. - E você, faz o que?
- Sou empresário... Trabalho em uma multinacional.. As vezes até tenho que ir para fora do país nas filiais da nossa empresa... Trabalho com ela... - ele não falou o nome, mas Anahi entendeu.
- São parceiros? - perguntou sentindo uma pontada de ciúmes.
- Sim... Por isso eu sempre pego todas as viagens, afinal ela tem uma família, e eu não...
- Não? - perguntou sem entender.
- Meus pais moram no Brasil..
- Perai, mas você é...?
- Sou mexicano mesmo.. Mudei para o Brasil quando tinha, acho que 12 anos, e vivi lá até os 20, quando vim para cá com meu irmão mais velho... Sempre quis voltar para o México... Amo o Brasil, mas nossa terra natal é nossa terra natal né?
- Com certeza... - sorriu apoiando os cotovelos na mesa. - Mas e seu irmão? Por que não mora com ele?
- Ele se casou dois anos depois que viemos morar aqui... Tem sua própria família... E eu fiquei sozinho... - fez um biquinho e Anahi riu jogando a cabeça para trás.
- Você tem quantos anos?
- 27... E você tem 24, certo?
Anahi sorriu e assentiu.
- Adivinhou... - ponderou e sorriu. - Quer dizer, na verdade não né?
Ele riu e ela o acompanhou.
- Então você está há cinco anos sozinho? - perguntou depois de ter feito as contas.
- Tadinho do Poncho né? - ele fez mais um bico e ela sorriu.
- Não quer casar?
- Quero muito, acho que é o que eu mais quero... Mas pra isso preciso encontrar a minha alma gêmea.. Aquela que me completa em todos os sentidos sabe? Eu não quero casar por casar e separar depois... Quero casar tendo a plena certeza de que ela é a mulher da minha vida, com quem vou passar o resto dos meus dias.. - Anahi suspirou alto e logo depois se condenou, ficando vermelha. Desejou que ele não tivesse ouvido seu suspiro. - Não quero mais me enganar.. Não é nada fácil.. - ele baixou os olhos e Anahi sentiu que ele também tinha sido magoado em um relacionamento, mas com certeza não era nada comparado ao que ela passou.
- Muito bonito pensar assim... Difícil homens que pensem assim hoje em dia...
- Mas e você? - ele perguntou a encarando. Anahi empalideceu e gaguejou antes de começar a responder.
- Eu... Bom.. Nunca dei muita sorte no amor... Era traída no meu último namoro... Sofri muito... - baixou os olhos. - E depois, bom... Deixa pra lá.. Não gosto de falar sobre isso..
- Traída? - ele perguntou erguendo a sobrancelha. - Que homem, em sã consciência, trairia uma mulher tão linda quanto você?
Anahi sentiu suas bochechas queimarem de vergonha, não conseguiu levantar os olhos.
- Não sou tudo isso... - suspirou pesadamente.
Poncho tocou o queixo dela com carinho e o levantou, fazendo com que seus olhos verdes se encontrassem com aquela imensidão azul, que estavam marejados, o que os deixava ainda mais brilhantes.
- Você é sim! - ele sussurrou antes de impulsionar-se para frente unindo seus lábios aos dela. Conforme Anahi fechou os olhos, as lágrimas escorreram, tocando a bochecha de Poncho. - Você é tudo isso Annie! - ele sussurrou ainda de olhos fechados, colando sua testa a dela.
- Poncho.. - ela sussurrou em resposta.
- Shiiiii.. - sussurrou baixo tocando seus lábios com as pontas dos dedos. - Não fala nada, só sente!
Juntaram seus lábios de novo, Poncho a segurou pela nuca enquanto Anahi tocava seu rosto. Poncho pediu passagem com a língua e logo ela cedeu, deixando que se encontrassem e dançassem juntas em um ritmo apenas deles.
Foi um beijo lento e carinhoso, porém algo despertou no interior de Anahi e a mesma o empurrou delicadamente, cessando o beijo.
- Acho melhor não... - sussurrou olhando para baixo.
- Por que não? - perguntou confuso.
- Você nem me conhece Poncho... Minha vida é complicada e você é um grande amigo da minha irmã, a pessoa que destruiu a minha vida...
- Já falei que isso não influencia em nada! - ele segurou o rosto dela entre as mãos, que deixou mais lágrimas caírem.
- Não Poncho... Por favor! - sussurrou tirando as mãos dele de seu rosto.
- Eu me encantei por você... É incrivelmente linda... Sei que mal nos conhecemos, mas eu quero te conhecer, saber de cada detalhe da sua vida...
Anahi fechou os olhos com pesar novamente. Ele não poderia saber dos detalhes, claro que não... Nunca poderia saber que ela era uma ex-presidiária... Isso era vergonhoso demais!
- Então vamos com calma.. - disse devagar. - Pode ser?
Poncho sorriu mostrando todos os dentes.
- Com calma! - disse e ela sorriu amarelo.

-/-

Anabelle andava de um lado para o outro em casa, segurando o telefone nas mãos caso ela ligasse novamente. Não tinha ido trabalhar porque acordou se sentindo mal, sabia que naquele dia era a folga de Poncho, mas do jeito que se encontrava não conseguiria se concentrar em nada. O trabalho ficaria acumulado, mas resolveriam isso no dia seguinte.
- Mamãe!!! - ouviu o grito da filha e saiu correndo até onde ela se encontrava.
- JOHIS! - falou assim que a viu na frente da porta da casa sorrindo. - O que houve? Por que gritou?
- A Sam me chamou pra brincar na casa dela... Eu posso?
Sam era a vizinha do apartamento da frente, a menina tinha a mesma idade de Johanna e estudavam na mesma sala na escola.
- Tudo bem.. Vai lá, mas não saiam de casa e volte cedo!
- Ok! - correu e deu um beijo na bochecha da mãe.
Se jogou no sofá em seguida e deitou a cabeça no encosto, fechando os olhos, sentia enjôo, tontura, mal estar.
Levantou minutos depois e olhou pela janela do apartamento, suspirando. Estava paranóica.
Viu ao longe uma figura igual ela. Arregalou os olhos ao notar os olhos azuis e os cabelos escuros. A moça sorria maldosamente e lhe acenou com a mão.
Tirou de trás de si uma menina, sua boca tampada e seus olhos suplicantes.
- JOHANNA!!! - gritou abrindo o vidro. - ANAHI, SOLTE ELA!!! SOU EU QUEM VOCÊ QUER! LARGA A MINHA FILHA!!!!
Porém Anahi sorriu ainda mais abertamente e puxou uma arma do bolso, apontando diretamente para a cabeça de Johanna, que começou a chorar.
- ANAHI!!!!!!!!!! - gritou e deu um pulo do sofá.
Havia cochilado de novo e sonhado essas coisas terríveis. Seu coração batia descontroladamente e sua respiração era entrecortada.
Baixou a cabeça, massageando as têmporas e suspirou.
Era apenas mais um sonho.

Bad TwinsOnde histórias criam vida. Descubra agora