ALERTA GATILHO:
Vamos entrar numa parte delicada da história, e esse flashback traz muita coisa à tona.
Aos poucos, vocês vão poder entender muitas coisas.
Esse flashback traz insinuação de violência, então, caso seja um assunto sensível para você, sinta-se livre para pular.
Vejo vocês no final.
Rio Azul – 2002
Eu corri para casa sem nem olhar para trás.
Sabia que, no momento em que cruzasse aquela porta, toda a minha vida teria ruído. Eu mesma estava ruindo por dentro enquanto as lágrimas insistiam em rolar pelo meu rosto e molhar a gola da camisa pólo que compunha o uniforme escolar.
A Simone de dezesseis anos de idade ainda não sabia, mas aquela era a última vez que ela voltaria para casa depois da escola. E aquele não era um retorno feliz, não tinha como ser depois que ela precisou sair correndo do lugar onde estava.
Ameaçada.
Posta para fora.
Envergonhada.
O que a sociedade de Rio Azul pensaria quando descobrisse tudo que eu vinha fazendo nos últimos dois anos? O que meus pais achariam quando soubessem das minhas depravações? Pior, como eu ficaria na cabeça de meu padrinho, Marcos Thronicke, patrão dos meus pais?
E tudo por causa dela. A minha vida estava sendo virada de cabeça para baixo por causa dela. Eu iria perder o amor da minha vida por causa dela.
Não, eu nunca perdoaria Soraya Thronicke.
Não perdoaria por sua atitude, não perdoaria por tudo que eu perderia por sua causa. Pior, não a perdoaria por me fazer refletir que o maior erro de toda aquela história estava em mim, por querer viver algo que eu sabia não poder viver.
Entrei em casa num rompante, sem me preocupar com a terra grudada em meus tênis escolares. Meu pai estava sentado no sofá de dois lugares, de frente para a televisão, e tinha a cabeça afundada entre as mãos. Minha mãe, em pé na porta da cozinha, chorava como se alguém tivesse acabado de morrer. As duas presenças que eu não esperava ver ali eram Marcos, seu olhar calmo como sempre, e Soraya agarrada em suas pernas.
Maldita.
Corri para os braços de meu padrinho e ele prontamente me abraçou, fazendo carinho em meus cabelos negros. Sussurrou em meu ouvido que eu hoje precisaria ser forte, mas que tudo eventualmente daria certo.
Eu duvidava bastante disso. Nada poderia dar certo em minha vida, as minhas escolhas eram as maiores culpadas disso. A culpa que me corroía só conseguia ser abrasada quando eu lembrava que se não fosse por ela, aquela situação não seria real.
Eu queria poder fechar os olhos e fingir, realmente, que nada daquilo era real. Subir num cavalo e galopar para bem longe, numa terra onde a felicidade pudesse ser minha amiga.
A dor lacerante que rasgava o meu peito parecia nunca ter fim. Nada pior do que ouvir o amor de sua vida dizer que você não era nada, que você nunca significara nada. Eu sabia que nada daquilo era verdade, do contrário, todos os juramentos, todas as promessas, todas as noites em que me entreguei para ela, teriam ido em vão.
Parecia ser difícil respirar, e a dor do coração se tornou física quando as unhas de minha mãe cravaram em meu braço, me arrastando com força para o sofá.
Naquela manhã, eu perdi um grande amor.
Naquela tarde, eu ouvi as piores coisas que uma filha pode ouvir da mãe.
Naquela noite, eu fui colocada para fora de casa.
Me prometi que nunca mais pisaria em Rio Azul novamente. Nunca mais estaria naquele antro de intolerância que tanto me fizera sofrer um dia, que havia pisado no mais puro dos sentimentos apenas para reforçar estereótipos e padrões arcaicos.
A Simone do passado nunca mais pisaria em Rio Azul, mas a Simone do presente estava ali para ajudar a pessoa que um dia fora a minha algoz.
"As palmadas da mãe não doem metade
Do que as palmadas da vida doem na gente."
- Bráulio Bessa
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FAZENDA OLIMPO [Simone | Soraya]
FanfictionSoraya Thronicke queria tudo, menos a responsabilidade de administrar uma Fazenda falida. Localizada no coração do Mato Grosso do Sul, a Fazenda Olimpo outrora se destacou por sua extensiva criação de Gado e por possuir um Haras capaz de exportar...