Can we talk?

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Beatrice desistiu, voltando assim que alcançou a escada. Levaria Ava com ela.

— Se teletransportou? — Brincou, mas Bea não riu. 

— Acho melhor você ficar lá em casa. — Sugeriu. — Você não pode forçar isso aí, vou colocar os pontos falsos, mas se abrir, terá que costurar de verdade no hospital.

Beatrice estava mais séria que o normal, não que ela a conhecesse a tempo suficiente para saber disso com propriedade, mas quase não falava ou sorria há longos minutos.  

  — Bea, não precisa, você já fez muito por mim.  

— Ava, eu quis fazer, ok? Não precisa se preocupar.

Ava sorriu, colocando o notebook dentro da mochila e esticando o braço para ser ajudada por sua vizinha de frente. Bea passou o braço dela em volta de seu pescoço e foram em direção a casa no segundo andar o The Library. 

Quase quatro horas da manhã, as duas haviam tomado banho e Beatrice fez o curativo com as mãos hábeis, evitando ao máximo aumentar qualquer desconforto da mulher em seu sofá. A dona do lugar saiu em direção a cozinha, prometendo trazer algo para comerem, antes de  dormir.

Ava aproveitou para ligar para a amiga e contar o que aconteceu.

— Estou inteira, Mine, amanhã a gente se fala. Se cuida também. — Fechou a tampa, colocando o computador numa caixa no chão. — Você foi rápida.

— Air fryer é a maior invenção do século. — Brincou, colocando uns salgadinhos e batata frita entre elas no sofá. 

Comeram assistindo uma reprise do jornal local, que precisava reunir notícias de todas as cidadezinhas ao redor de Durham para ter algum conteúdo. Ava estava terminando seu café, quando notou a luz do dia começando a vencer as nuvens carregadas.

— Não com sono? 

— Um pouco, você pode ficar com a minha cama, durmo no sofá. 

— Bea, por favor, eu fico aqui, esse sofá é pelo menos dez vezes mais confortável que o meu colchão. — Sorriu.

— Sim, mas o folgado do Hans costuma entrar aqui bem cedo, sem aviso.

Riram uma para a outra e ela foi deixada na cama enorme e muito confortável da dona do pub. 

*

Acordou toda quebrada, não teria a menor condição de continuar fazendo aquilo por mais tempo. Cada musculo de seu corpo dolorido como o inferno, graças ao estresse. Precisaria comprar os remédios receitados pelo seu médico, mas as farmácias não venderiam nada sem que ela se identificasse. Bufou irritada, gemendo de dor ao colocar a perna ferida com mais força do que deveria, no chão.

— Ava? — Bea deu três batidas na porta, entrando em seguida. — Tudo bem? Sentindo alguma coisa?

— Eu estou com uns espasmos musculares, hm, por causa do estresse. — Bea fez que entendeu e saiu sem avisar, voltando alguns minutos depois, com um remédio e um copo em mãos.

— É um relaxante muscular. — Ava tomou rápido, esperando que aquilo fizesse algum efeito o mais rápido possível. 

— Que horas são? — Apontou para o relógio, duas da tarde. Arregalou os olhos, surpresa.

— Não faz mal, você precisa descansar.

— Eu já posso voltar, preciso pensar em um plano. — Beatrice fez uma careta engraçada e ela estreitou os olhos, quase ofendida. — Eu vou realmente pensar em um plano dessa vez!

— Ava, escuta, vamos comer alguma coisa e conversar, certo? Você acabou de acordar, no banheiro tem tudo que você precisa, qualquer coisa me chama, vou estar no escritório te esperando. 

E saiu, fechando a porta atrás de si. Ava fechou a cara. Não queria enfiar mais ninguém naquele cenário de terror. Muito menos alguém tão incrível como a dona do pub. Fez a higiene matinal e saiu para encontrar sua vizinha.

— Ava! Eu sabia, sua safada! — Colocou a mão no peito, assustada.

— Ei, Hans! — Bea repreendeu o amigo, que sorriu sugestivo para elas e voltou para o escritório. — Desculpa, Ava. 

— Ele é ótimo, tá tudo bem. — Riu.

Sentaram na mesinha para duas, na cozinha americana de Bea e comeram em silencio. O remédio estava começando a fazer efeito. Assim que terminaram, a dona do pub começou:

— Hm, então, podemos conversar agora? — Ava assentiu, ajudando a tirar a mesa, mesmo com o protesto da mais alta.

— Posso resumir tudo em uma frase, Bea, não tenho como te agradecer pelo que você fez ontem e está fazendo, mas não quero envolver você nisso. — A mais alta ouviu em silêncio, abrindo duas garrafinhas de cerveja sem álcool.

— Eu cheguei aqui sem saber o que fazer da vida, se iria para outro país, se continuava por aqui, se tentava mudar de profissão, mil e uma dúvidas. — Tomou um gole de sua cerveja. — E sempre achei que queria fazer tudo sozinha. Mas olhando hoje, sinto que teria passado por tudo aquilo de um jeito menos traumático se tivesse tido ajuda. 

— Bea-

— Você sabe que eu sou treinada para isso, também, não sabe? Essa loucura toda faz parte da minha vida, apesar de estar um pouco enferrujada, confesso. 

— Por quê você quer tanto me ajudar?

— Porque eu queria ter sido ajudada, Ava, queria que alguém me ajudasse com isso — Puxou a blusa para cima, revelando sua barriga definida com uma cicatriz notável, perto da cintura. — Eu fui baleada e precisei recorrer ao Luke, que na época, odiava a polícia e só não me deixou morrer porque no fundo, é um cara maravilhoso. Não quero que você precise se virar, eu sei bem como isso é uma merda.

Sorriu, se inclinando para abraçar Bea pelo pescoço. Ela demorou um pouco para retribuir, mas o fez. Não tinha visto as coisas daquele ponto e de fato, sequer teria sobrevivido ao primeiro movimento que fez, sem a mulher em sua frente.

— Obrigada. — Sussurrou se afastando e já poderia admitir que aquilo era melhor que o tédio e a solidão do apartamento em frente.

— E eu sou investigadora, bem-

— Não começa com isso, pensei que você fosse diferente, mas aparentemente, vocês são todos iguais. — Bea riu.

— Ouch! Não temos culpa se vocês não pensam tanto quando a gente.

— Que audácia! 

Continuaram discutindo mais alguns minutos, até Hans voltar ao apartamento.

— Desculpa interromper vocês de novo, mas preciso da chave da caminhonete para ir buscar os petiscos de hoje. — Assim que Bea se levantou para pegar a chave da gaveta e jogar contra seu peito coberto por um casaco grosso, ele levantou as sobrancelhas, mais uma vez sugerindo que as duas estavam tendo alguma coisa. Ava riu, sem saber como desmentir aquele mal-entendido.

Die for you | Avatrice [ShortFic]Onde histórias criam vida. Descubra agora