Décimo dia e sua perna já estava muito melhor, não precisava mais mancar ou medir a força para pisar, apesar do corte ainda demandar algum cuidado. Ela agradecia sempre por não ser tão vaidosa, aquilo seria uma cicatriz pra vida toda.
A dona do pub fazia questão de dirigir até a cafeteria todos os dias, para que Ava pudesse se distrair um pouco. Estavam cada vez mais imersas nas buscas e Michael estava ajudando, infiltrando na central em Cambridge. Sentia que Ava precisava ver o lado de fora para recarregar as energias. E de fato, a mulher sempre voltava mais disposta dos passeios.
— Quer comer algo específico hoje? Vou pedir nosso almoço. — Negou, enquanto a mais alta se ajoelhava em sua frente, para fazer o curativo dela.
— Eu posso cuidar disso, Bea. Não quero te incomodar mais, sério.
— Se você estiver incomodando, eu vou te dizer, ok? Agora só fica quieta aí e me deixa limpar isso direito.
— Ouch, tudo bem. Mandona do cacete. — Resmungou e Bea deu um tapinha fraco na lateral de sua perna, rindo.
*
Ava estava com o notebook no colo, terminando de analisar algumas horas de gravação da câmera de segurança do prédio de Vincent, com Yasmine.
— O vice-prefeito vai estar em um evento em Brighton em um mês, acho que essa é a nossa grande chance.
— O Michael te disse? — Assentiu do outro lado da tela.
— Eu chequei e está na agenda dele. Eu vou começar a minha viagem em uma ou duas semanas, preciso estar aí com você dessa vez.
— Toma cuidado, vai me dando notícias em cada parada, ok?
Desligaram a ligação e ela foi para o escritório contar a Beatrice sobre o novo plano. Estava nervosa e pra ser sincera, não queria que a mulher fosse junto. E queria ao mesmo tempo. Estava tentando ignorar aquela bagunça crescente e embora não fosse tão difícil assim, dado o momento caótico, estava ficando cada dia mais complicado de fingir que nada estava mudando dentro de si.
Tinha que se mover rápido o bastante para não perder seu cargo e sequer sabia se o queria ainda. Sua única certeza era que precisava fazer alguma coisa, queria voltar a viver livre e sem temer por sua segurança até enquanto dormia.
— Bea? — A dona do pub levantou a cabeça, estava bebendo uma cerveja e assistindo um jogo de futebol. — Posso falar com você agora ou quer esperar o jogo terminar?
— Estamos perdendo, pode falar. — Riu achando graça do "estamos", o fã de futebol fazia questão de tentar converter todo mundo a torcer pelo seu time.
— O vice-prefeito vai estar em Brighton em um mês, quero chegar antes.
— Tudo bem. — Levantou, procurando o celular. — Quando você quer sair?
— Amanhã. — Disse decidida e Beatrice arqueou uma sobrancelha.
— Quer me dar detalhes do plano primeiro?
— Vou tentar ficar a sós com ele e arrancar alguma coisa.
— Ok, vamos providenciar esse encontro.
— Bea, não sei se quero que você vá. — A mais alta colocou a garrafa em cima da mesinha de centro com tanta força que quase quebrou o vidro.
— Nós já conversamos sobre isso, Ava. Não vou te deixar sozinha.
— A Yas vai estar comigo dessa vez, não quero arriscar a sua segurança.
— Esse é o único motivo? — Assentiu. — Então eu vou com você. Só vai se livrar de mim se trocar esse disco, gatinha. — Riu, sentindo seu coração errar uma batida. Ela era tão solicita, prestativa, cuidadosa, empática, qual a necessidade de também ser tão linda? Parecia muito injusto com todo o resto da humanidade.
— E o pub?
— O Hans pode cuidar de tudo, ele vai adorar dobrar o salário por um mês e eu estou precisando mesmo de férias.
— Você quer chamar isso de férias?
— Quem disse que a gente não pode se divertir?
*
Foram dormir cedo e acordaram pouco antes do dia amanhecer, precisavam organizar tudo antes de deixar Durham. E fizeram, a dona do pub deixou uns vinte bilhetes para Hans, incluindo instruções para conversar com Mary sobre o apartamento de Ava. Tomaram um café rápido e pegaram estrada rumo a cidade beira-mar.
Cinco horas de viagem, algumas paradas para abastecer e muitos monólogos de Ava, Beatrice finalmente estacionou em frente a um prédio pequenininho, o mar do outro lado da rua.
— Eu conheço a dona, assim a gente não precisa se identificar para nenhum sistema. — Apontou para o lugar. — Perguntei ontem se tinha algum quarto disponível e sim, acha a localização boa?
— Tá ótimo, perfeito — Se inclinou para beijar a bochecha de Bea e desceu do carro em seguida, deixando uma mulher no auge do gay panic lá dentro.
*
— Oi Dora, essa é a Ava — As duas trocaram um abraço amigável.
— Sua chave, chefinha. — Ava riu, deduzindo que Dora provavelmente trabalhava no pub com Hans e Beatrice.
Subiram com as malas até o primeiro andar, entrando em um quarto pequeno, cama de casal e uma cozinha americana. A decoração excessivamente colorida, assim como Brighton, mesmo nos dias nublados.
— A Dora deve ter entendido errado, eu vou pedir outro quarto-
— A gente pode dividir a cama, quer dizer, se você quiser, é grande o bastante pra nós duas.
— Certeza? Não tem um sofá aqui-
— Você não dormiria no sofá se tivesse um, está dormindo mal há mais de dez dias, seria a minha vez. — Tirou uma muda de roupa da mochila. — Vou tomar um banho e dormir, espero que a senhorita faça o mesmo, a viagem foi cansativa.
Mas ela não fez. Tomou um banho e assim que Ava dormiu, foi comprar tudo que iam precisar nos próximos dias.
Ava despertou menos de uma hora depois, quando notou que Beatrice ainda não estava de volta no quarto.
Bea aproveitou para conversar com Dora. Era sua antiga chefe no pub e ela havia se mudado para cuidar do hotel da família há poucos meses.
— É sua namorada? — Sentiu o rosto esquentar.
A investigadora estava tentando negar qualquer vestígio de atração por Ava e quando pensava nela de outra forma, se obrigava a resumir a isso, atração. Ava é uma mulher bonita, não é difícil de confundir os sentimentos por alguém tão linda. Repetia como um mantra. Sequer sabia se Ava gostava de mulheres também, mas isso não importava. Ela iria ajudá-la e depois mal iriam se ver.
— Quê? Não! — Dora riu.
— Vocês são fofas juntas, sabia? Já considerou isso?
— Pelo amor de Deus, Dora, somos amigas. Ou algo do tipo.
— Tudo bem, tudo bem. O que estão fazendo aqui?
— Te conto assim que deixar de ser confidencial e por favor, não mencione pra ninguém nossos nomes, ok?
Dora concordou e elas conversaram mais um pouco sobre como andava a vida lá em Durham e como ela estava tocando o negócio que agora era seu.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Die for you | Avatrice [ShortFic]
FanfictionA delegada Ava Silva acaba de solucionar um caso e é transferida para outra cidade, para sua segurança. Mas não é suficiente e ela vai precisar contar uma ajuda inesperada.