Não sei quanto tempo, seu corpo ficou aquecendo o meu, ou melhor, eu sei. Foi exatamente trinta e dois minutos e alguns centésimos que não tive a capacidade para contar.
A chuva foi parando aos poucos, juntamente seus braços também foram soltando-se do meu corpo, e eu parecia um pequeno filhote indefeso, que quando está com medo abriga-se em sua mãe.
Minhas pernas vão desencolhendo, e meus braços vão desatando, podendo espreguiça-se. A mulher continua agachada na altura do sofá, seus olhos não saem de mim, e por um momento, sinto pudor, por ela ter visto-me daquele jeito.
Tudo que quero fazer agora, é pedir para que ela vá, sem ser rude.
— Obrigada, — curvo levemente, e sei que agora ela está olhando para uma pessoa vazia. Mesmo que ela negue, sei que pensa isso através dos meus olhos. E foi por esse exato motivo que mês passado eu quebrei o único espelho que havia na minha casa.
Porque eu não me aguentava olhar para a pessoa triste que eu sou, para a pessoa em que me transformei.
— Você tem pluviofobia? — Não só tenho isso como vários outros problemas e imperfeições dentro de mim, porém não estou a fim de criar intimidade com ela. Porque eu já não tenho mais a vontade de lidar com os seres humanos, porque eu odeio as pessoas e o mundo, e é por esse exato motivo que quero ver-me livre dele.
— Pode por favor ir embora? — Minha fala soa grosseira, e bate um desespero para que ela vá logo, e finalmente eu possa ficar sozinha novamente, como a pessoa que eu sou.
Ela parece não guardar mágoa ou ficar ofendida pelo meu jeito ríspido, pelo contrário, a mulher levanta-se, checando as horas em seu relógio de pulso. Seu celular apita, e ela o olha, caminhando em direção até a porta, e como estava distraída com o aparelho, aposto que ela nem percebeu que seus pés inevitavelmente a levou para fora do meu apartamento.
Inclino a cabeça para trás, e deixo que o peso da minha cabeça faça meu torso cair de novo no estofado acinzentado. Meu celular ainda está ligado no contato de Lisa. E sem que eu precise entrar nas conversas, noto algumas mensagens de sua parte.
[9:30] PokPak
Jennie, você está bem? Começou a chover e estou preocupada. Acho que não vou conseguir sair do restaurante agora. Por favor, me liga.
[10:00]
Você não me ligou, está tudo bem? Estou ficando preocupada. Retorna as minhas chamadas.
[10:15]
Espero que você tenha fechado as janelas, mas sei que mesmo assim não vai melhorar suas crises 😞.
[10:20]
Se dê eu vou passar mais tarde aí. Por favor, esteja bem. E coma, veja minhas mensagens, preciso saber se está tudo bem.
[10:30]
A chuva já passou. Mandu, você está bem?
Quando olho a caixa de chamadas, passavam-se de trinta, então sinto-me mal por fazer ela ficar preocupada comigo e eu ter ocupado seu tempo, em que ela poderia está usando com seu restaurante.
[11:00]
Estou bem, Lisa. Volte a trabalhar
Vejo que ela logo visualiza e responde com um emoji de coração, e agradeço quando ela não puxa mais assunto ou pergunta-me sobre minha crise, mas tenho a certeza que ela fará isso pessoalmente mais tarde.
Levanto do sofá, encontrando o piso próximo à varanda molhado, então carrego meu corpo até a lavanderia, pegando um pano e secando o chão para não correr o risco de eu cair, logo após fecho a porta de vidro da sacada.
E olhando para o apartamento, percebo que não tenho nada para fazer, a não ser lamentar-me.
A única coisa que me chama a atenção é um livro infantil, escondido debaixo do sofá, pergunto-me quando foi parar lá. Minhas mãos tremem um pouco para alcançar o livro, porque eu sei o que vou encontrar e não quero ativar as lembranças.
— Omma, lê pra mim esse livro —A criança corre atrás de mim, agarrando minhas pernas, impossibilitando locomover-me. Mas isso não incômoda, pelo contrário, sinto um conforto dentro do meu peito.
— Claro, mas escove os dentes antes e coloque o pijama — Falo, e a pequena miniatura corre pelo corredor, chegando até o banheiro.
Quando entro no seu quarto, ela já estava em posição de dormir, coberta com o edredom até a cintura, e o livro em sua mão, escrito: Rapunzel.
Ela entrega-me o livro, e eu faço um carinho pelos seus cabelos, em resposta ela sorri e seus olhos brilham como o sol.
— Era uma vez um casal que há muito tempo desejava inutilmente ter um filho… — Começo a ler, e ela presta a atenção atentamente no som da minha voz, percebo que quando estou no meio da história, seus olhinhos se fechando e sei que ela já não escuta mais a leitura.
" Então, levou Rapunzel e as crianças para seu reino, onde foram recebidos com grande alegria. Ali viveram felizes e contentes. Fim. — Termino de contar, então passo a mão pelo seu pequeno rostinho, e deposito um beijo em seus cabelos, com cheiro de shampoo de criança, e isso me faz sorrir, porque olhar para sua aparência genuína, e inocente, traga-me calma."
Choro sobre a capa do livro, porque tenho a enorme certeza que me tornei a Rapunzel, presa em uma torre, que não tem escadas, janelas, nada que me faça querer fugir. Estou aprisionada há muito tempo, e não tem nada nem ninguém que me salve.
O mundo é cruel, egoísta e sombrio. Qualquer sinal de alegria que ele encontra, ele destrói.
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O Que Tem Por Trás Da Chuva? - Chaennie
Fiksi PenggemarApós uma ocasião desastrosa na vida de uma ex-psicóloga. Jennie desenvolveu Pluviofobia, um medo recorrente da chuva, trancando-se em casa nos dias chuvosos. E também foi diagnosticada em um quadro de depressão. Dentre isso, ela se vê deprimida em u...