Capítulo 3 - Open Wounds

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“— Entre a vida e a morte, há uma biblioteca — disse ela. — E, dentro dessa biblioteca, as prateleiras não têm fim. Cada livro oferece uma oportunidade de experimentar outra vida que você poderia ter vivido. De ver como as coisas seriam se tivesse feito outras escolhas... Você teria feito algo diferente, se houvesse a chance de desfazer tudo de que se arrepende?”

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Anahí fechou o documento do Word, clicando no X do canto da tela e torcendo para que o barulho inquieto em seu cérebro também pudesse ser encerrado juntamente com aquela página em branco. Ou ela não gostava do que escrevia ou não sentia firmeza nas próprias palavras, logo decidia apagar o que havia iniciado e voltava para o nada.

Ela sentia que deveria procurar uma distração, então decidiu abrir a caixa de entrada de seu e-mail e parar de postergar de uma vez por todas o que tinha ali dentro. Três dias atrás, antes dela começar a arrumar razões para adiar o que Mandy, sua editora, tinha escrito para ela. 

“Oi, Any, tudo bem? É hora de trazer o livro à vida, e eu sei que você sabe disso, e que sabe também que não estou tentando apressar você e o seu processo criativo, só estou ansiosa para ler mais uma das suas criações!”

Haviam outros e-mails como aquele, todos em um tom de entusiasmo que Anahí bem reconhecia, e por essa razão a culpa surgia dentro dela, desejando intensamente poder acordar magicamente e produzir algumas milhares de palavras na manhã seguinte apenas para dar uma resposta positiva para sua produtora.

Mas não estava funcionando mais a algum tempo.

Ter um bloqueio criativo era mais comum do que deveria, ela sabia disso. Não passava por aquele processo pela primeira vez e certamente não seria a última, mas a questão era a intensidade com que vinha acontecendo. O problema não se dava apenas pela falta de ideias, começava com a falta, de fato, mas seguia com o desânimo e acabava quando a tristeza vencia seu cansaço. Novamente: não era a falta de ideias, e sim a dificuldade que Anahí estava enfrentando em tentar fingir que sua vida pessoal, além de sua carreira, não estava em ruínas.

Você precisa mudar o foco, sabe? Sair um pouco, distrair a cabeça. Era o que Lauren, a irmã dela dizia. Mas a problemática não estava necessariamente dentro de casa, e sim, dentro dela própria e Anahí sabia muito bem disso. Apesar de cada pedacinho daquele lugar lembrá-la dos momentos que ela viveu com seu ex marido, e o quanto lembrar daquilo doía.

O fato era que Anahí sabia o que era trabalhar em casa, como escritora, desde o início sua rotina não fora muito alterada, embora precisasse se adequar, o que significava que ficava o dia todo de pijama, em frente a um computador. Aquilo não mudava. Isso quando não estava amamentando, trocando fralda, ninando ou interagindo de algum outro modo com o ser humano adorável e bastante exigente como aconteceu onze anos atrás quando sua filha nasceu. Brianna fora uma recém nascida que chorava quando não atendida, mas Anahí soube conciliar, aproveitando as noites que ambas passavam em claro para escrever, para criar e desenvolver enredos. Funcionavam bem assim, nas madrugadas, entre trocas de fraldas e rodadas de amamentação.

A lembrança veio para Anahí com uma pitada de nostalgia. Sentia falta de embalar a filha no colo, de amamentar e ter momentos únicos como os que tivera. Não haviam dificuldades que pudessem fazê-la duvidar ou negar, porque Brianna era sua vida inteira, e ela não saberia dizer como era quando sua garotinha ainda não existia, porque certamente não tinha sentido algum. Ela e Michael não haviam planejado engravidar mas quando o positivo veio, em meio a um período crucial da vida de ambos, eles souberam que ter aquele bebê era tudo o que mais queriam. Aos 27 anos, Anahí era uma mulher recém casada, conciliando sua carreira e vida pessoal ainda entrando nos trilhos quando a descoberta veio. Não foi necessariamente um susto, mas aconteceu. Onze anos depois, agora, no presente do que anteriormente era o futuro, Anahí observava a filha de onze anos crescendo e se desenvolvendo. E passando pelo mesmo processo que era o recente divórcio dos pais.

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