Thirty-six ♡

348 41 12
                                    

~Maraisa~

Abro meus olhos e me deparo com a imagem habitual de toda manhã. Os mesmos móveis, a mesma escrivaninha, o mesmo porta-retratos. Tudo igual como em quase todas as manhãs, porém, sinto algo diferente, um gosto amargo na língua, um pequeno mal-estar na boca do estômago.

Sexta-feira... finalmente o final de semana "aponta no horizonte", mas... a animação que me seria característica não está presente nesta manhã.

Sento-me na cama e permito que meus pés toquem o chão frio, me causando um pouco de arrepio, e fico pensando em como estava bom ficar deitada. Olho para trás e lá está... aquele espaço vazio, frio e sem ninguém.

Suspiro fundo, passando as mãos pelos cabelos e me ergo, dando início ao meu dia.Tomo banho, escolho minha roupa, bebo meu café com pouco açúcar e saio de casa com minhas coisas.

No metrô o vai e vem de pessoas apressadas pelas plataformas, se amontoando em um vagão abarrotado de passageiros que, mal começaram seus dias, já aparentam feições cansadas. "Com certeza estou igual a um deles, posso apostar" penso entrando no que me levará ao meu destino.

Na faculdade, encontro meus amigos de turma, rimos, conversamos milhares de coisas, assisto as aulas, mas tudo se passa em um ato automático tão previsível que chego a me assustar quando me percebo indo para minha segunda jornada do dia.

"Será que todos somos assim? Conseguimos disfarçar nossos pensamentos e verdadeiros espíritos atrás de ações automatizadas? Quantas vezes o fiz naturalmente?"

Tantas perguntas bobas... acho que estou começando a analisar os sentidos que a vida tem, do nada.

Chego no escritório e tudo parece "normal". As pessoas andam de um lado para o outro, telefones tocando, barulhos de teclados sendo usados, vozes ecoando, etc, etc, etc. Tudo rotineiramente normal, mas meus olhos, ao se depararem com a porta do seu escritório, revivem todas as imagens que tivemos na noite anterior.

Após permitir que Luísa chorasse em meus braços, desabando em todos os seus sentimentos feridos, notei que ela foi, aos poucos, se acalmando.

Era tão estranho vê-la desta forma: frágil.

Sentia meu ombro já molhado devido a suas lágrimas e seus suspiros baixinhos ecoarem por meus ouvidos.

Eu? Só afagava suas costas, acariciava seus cabelos e lhe permitia ser débil em um momento que ela precisava disso. Quanto tempo ficamos ali, abraçadas? Não sei dizer. Creio que o tempo rodou de forma diferente para ambas. Para mim foi algo efêmero, mas, creio eu, para ela, foi algo que durou uma eternidade. Enfim.

Quando a percebi mais calma, permiti me afastar um pouco para vê-la, observá-la. Com cautela, vi como ela se afastou e abaixou a cabeça embaraçada, levando as mãos ao rosto para secá-lo.

- Devo estar um desastre. - Falou sem me olhar, passando ambas as mãos em sua face, enquanto meus olhos a vasculhavam, a observavam com veneração.

"Ela é tão humana, delicada, frágil como tantos de nós" pensei vendo sua maquiagem um verdadeiro desastre, seus olhos ainda avermelhados e um pouco inchados. O constrangimento em suas atitudes era palpável.

- Não queria que ninguém me visse assim. - Sorriu um sorriso forçado, triste. - Acabei desabafando com minha estagiária... e ainda chorei em seu ombro... - Fungou de forma "derrotada". - Que catástrofe! - Exclamou passando as mãos pelos cabelos e mordendo o lábio inferior numa forma de segurar o choro, enquanto eu a olhava mais fascinada ainda.

"Mesmo sendo tão importante, tão poderosa, ela é capaz de sentir, de se permitir".

- Você não é um desastre. - Falei no automático, enquanto ainda a olhava detalhadamente. - Você é humana... sente... e é linda. - Finalizei, externalizando, sem perceber, meus pensamentos.

~Desire~Onde histórias criam vida. Descubra agora