Antes do Fim

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Minhas costas doem, como se estivesse desacostumado ao conforto de uma cama. Faz todo sentido, considerando como dormi ao relento nas últimas semanas. Entretanto, havia algo mais... Uma dor diferente, como se minha pele ardesse em chamas.

Por fim, alguns flashes da noite passada me voltaram a mente.

Sons de estalos e gemidos. Aquilo era uma corda ou um chicote? Como uma memória física, podia imaginar exatamente onde estaria marcado de vermelho... Reviver essas sensações era delicioso!

Ainda de olhos fechados, senti algo macio roçando próximo aos ombros, uma sensação entorpecente capaz de me fazer relaxar completamente. Pensei em me mover e percebi o peso leve de uma coxa que me envolvia, aparentemente eu estava na parte de dentro de uma conchinha. E então tudo fez sentido, os seios macios que me massageiam eram frios como a morte: Wednesday.

Suas mãos me seguravam como se pedissem para eu ficar e, por mais que eu odiasse a ideia de sair de perto dela, precisava me levantar. Respirei fundo e me movi da forma mais cuidadosa possível para não acordá-la. Logo me coloquei de frente a garota, desvencilhando de seu corpo. A pouca iluminação passando pela fresta de uma pesada cortina escura revelava o vislumbre de minha mestra... Seu rosto parecia frio como sempre, mas um leve sorriso escapulia pelos cantos e me deixava completamente encantado. Poderia apreciar seu rosto pelo resto da minha vida, mas precisava agir. Precisava de respostas.

* * *

Perdi a noção do tempo enquanto observava a longa ramificação da árvore dos Frump na parede do corredor. Mortícia tinha razão, havia galhos que levavam ao meu avô. Eu nunca o conheci, mas reconhecia o nome dos cartões de natal. Leopold Frump.

—Bom dia, querido — a matriarca falava do fim do corredor —Imagino que esteja curioso para saber mais de sua família e tenho certeza que achará muito mais em nossa biblioteca, mas antes de suas peripécias, devia aproveitar para tomar café da manhã.

Sorri, eu jamais poderia recusar um bom café.

Seguimos para a cozinha e toda a família parecia reunida. Pugsley não parecia gostar muito de mim, vide os olhares mortais que me lançou na noite passada quando entrei no quarto com sua irmã, mas aquele não era meu primeiro namoro em que eu precisava conquistar o cão de guarda da garota... O problema, talvez, era conquistar a confiança de alguém que tinha uma coleção de minas terrestres da primeira guerra mundial.

Gomez limpava a garganta como se planejasse puxar assunto, e foi o que fez.

—Então... Fester disse que você trabalhou numa cafeteria antes de ser foragido da polícia. Era algum tipo de serviço... Arriscado?

—Não, senhor. Embora nossa máquina de expressos costumasse dar problemas e parecer que ia explodir. Sorte a minha que em uma dessas, Wednesday estava por perto e me ajudou. Ela tinha experiência graças a uma... Guilhotina automática, acho.

—Claro! Tícia, lembra-se da primeira guilhotina do nosso bebê?! Ela ficou tão empolgada que queria testar com o braço do Pugsley. Não deixamos, é claro. Aquele modelo não era rígido o suficiente para ossos humanos — a mulher sorriu em concordância, parecia olhá-lo como se o enviasse um recado telepático — Bem, eu... Nós... Os Addams, costumamos receber amigos e familiares. Eu gostaria de reforçar o convite feito pela Tícia para que fique conosco o tempo que desejar. Seu pai e eu fomos bons amigos no passado, posso ligar para ele e explicar sua fuga da prisão se assim desejar. Tenho certeza que ele enten— Não!

Cortei-o apressado. Rapidamente voltei a minha postura tradicional desinibida.

—Não há necessidade de avisá-lo. Eu mesmo entrarei em contato para informar sobre minha estadia e agradeço pela recepção... —tomei um gole do café fumegante com leite de cabra — Seria um prazer fazer uso de sua biblioteca.

Wicked game - WeylerOnde histórias criam vida. Descubra agora