Capítulo 4: O paradeiro do garoto-pássaro

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Kilowatt geralmente não chamava atenção, pelo menos não pelos seus poderes.

Chase era mais conhecido como o garoto faz tudo que trabalhava em sua própria oficina no Distrito D, bem no meio da Periferia, no que à primeira vista era uma oficina de reparos de videogames e computadores feitos basicamente de sucata, mas bastava um olhar mais atento para perceber que aquela era apenas uma fachada para o negócio real: a oficina era onde funcionava os servidores por onde Nines trabalhava como hacker e mercenário. Quando o portão articulado de aço estava fechado, eles não eram mais Chase Wheeler, o mecatrônico extrovertido demais, e Neil Reed, o segurança silencioso e assustador, eles eram Kilowatt e Nines: os mercenários Exe que trabalhavam para qualquer um com uma causa justa e um pagamento decente.

Naquele momento, Kilowatt estava fechando a oficina, olhos e ouvidos atentos a qualquer coisa que parecesse vagamente suspeita, isso até um ruído característico de sacos de lixo sendo rasgados e revirados chamasse sua atenção, o que fez o loiro parar em frente a porta de metal. No primeiro instante, Kilowatt pensou que se tratava de um animal faminto e então, lenta e cuidadosamente se esgueirou até o beco na parte de trás da oficina para enxergar do que se tratava, observando um pequeno tufo cor de rosa surgindo por cima do contêiner de lixo.

— Ei — chamou gentilmente o jovem, o barulho parou abruptamente — Ei, amiguinho, tudo bem aí? Precisa de alguma coisa? — questionou o Exe curioso, o barulho da tampa do contêiner de metal o assustou a princípio.

Sujo e desgrenhado, uma criança que não parecia ter mais do que doze anos surgiu atrás da lata suja com olhos azuis arregalados de pânico.

— Ei, anjo, tudo bem — disse Kilowatt se aproximando pé por pé.

A criança era pequena e magricela, cheia de feridas — antigas e novas, principalmente nos joelhos e rosto — parecia um animal assustado. Quanto mais Kilowatt se aproximava, mais o garoto se afastava, estava sujo como um cachorro abandonado e tinha dificuldades de se afastar, arrastando a perna atrás de si quando o fazia. A criança usava um enorme casaco marrom manchado e uma camiseta que um dia foi branca, jeans puídos e rasgos nos joelhos mostrando as feridas em carne viva, nos pés estavam um par de tênis vermelhos, uma das meias tinha uma mancha marrom escura do que parecia ser sangue.

Era uma visão pesarosa, para dizer o mínimo.

— Tá tudo bem, você está perdido? Precisa de ajuda? — perguntou o loiro se aproximando — Pode me dizer seu nome, anjo? Eu não vou te machucar, quero te ajudar, não precisa ter medo de mim.

Foi quando a criança deu seu último passo para estar totalmente com as costas na parede que Chase percebeu, tarde demais, que tinha cometido um erro: ele tinha acabado de encurralar uma criança assustada em um beco sendo pelo menos uma cabeça — ou mais — mais alto que a dita criança. Wheeler só não esperava que, quando se aproximou a distância de um braço do pequeno garotinho assustado, ele se defendesse de sua ameaça com um chute certeiro entre suas pernas e o ar escapasse de seus pulmões.

Kilowatt mal teve fôlego para gritar antes que o garotinho corresse por cima de seu corpo indefeso no chão.

Ele sentiu o momento exato quando o garoto roubou uma placa de mil créditos de seu bolso de trás, mãos leves praticamente deslizando por ele antes de sair correndo.

— Ei! — gritou Kilowatt assim que recuperou o fôlego para correr atrás da criança — Volta aqui, seu filha da putinha! Me devolva o que é meu! Não pode sair por aí chutando um cara nas bolas e roubando as coisas dele, seu pivetinho de merda!

Assim que ele saiu do beco, ele conseguiu ver o garoto correndo para a rua principal lotada de pessoas e seguiu em seu encalço.

O garoto era rápido demais, correndo muito a sua frente mesmo mancando um pouco e usando da multidão para se esconder dele, ele desviava e corria por entre as pessoas como se não fosse nada demais ou que não pesasse nada — o que podia muito bem ser o caso, já que ele parecia além de subnutrido — mas Kilowatt tinha um truque na manga. Ele estava esbarrando em muitas pessoas, precisava de visão limpa de para onde o garoto estava correndo para tentar alguma coisa, mas ele parecia estar tentando fugir para as ruas e vielas laterais assim que conseguisse despistar Kilowatt, se esquivando por entre as pessoas.

O Experimento Número NoveOnde histórias criam vida. Descubra agora