VIII. Dezembros

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25 de Dezembro, 04h54min

Tirou o sobretudo pesado, o jaleco e as botas. O apartamento estava quente o suficiente para que ele não se agasalhasse tanto. A carteira e as chaves da porta foram depositadas sobre uma mesinha de canto que apoiava também o abajur. Como sempre, se sentou no sofá e pegou a varinha para trazer todas as coisas até ele com feitiços convocatórios.

Nevava lá fora e seu corpo estava entorpecido por causa do tanto de sexo que tinha feito anteriormente.

"Como um maníaco como você está fora da cadeia?"

"Pelo mesmo motivo que um maníaco como você não está dentro dela. Ainda visita Lovegood na ala dos lunáticos?"

Soltou um risinho pelo nariz. Reencontrar Malfoy tinha sido interessante. Sempre uma boa companhia. Fazia poucas perguntas, normalmente diretas, e não se utilizava de sofismo para conseguir o que queria de verdade. Quando queria, pedia, oferecendo algo à altura em troca. Um bom capitalista, assim como quase todos os comensais que não eram afetados mentalmente.

Mas Malfoy era uma faca de dois gumes, Cormac sabia bem. Se um dia precisasse dar alguma informação sobre o acordo que ambos tinham feito, para livrar a própria pele, o faria sem hesitar. Ele sabia demais sobre Luna, sobre tudo, o que poderia ser realmente prejudicial em situações extremas.

É claro que estavam no mesmo barco: afundariam juntos, caso um dos dois resolvesse pôr a boca no mundo. O diferencial seria, justamente, quem faria isso primeiro. A situação poderia se reverter completamente. Cormac apodreceria em Azkaban enquanto Malfoy teria sua pena reduzida por 'serviços prestados ao Ministério'.

Cormac respirou fundo. Estava na hora de acabar com aquelas provas. Não o fizera antes porque nunca achara que Marris colocaria Malfoy em um tratamento psiquiátrico. Marris sempre o surpreendia. E agora, que Hermione estava comandando o caso, provavelmente buscaria toda e qualquer evidência que legitimasse a prisão perpétua do assassino de Rony.

'Accio caixa!', ele disse, segurando a varinha. Alguns minutos depois, uma caixa de papelão, de tamanho médio, surgiu do quarto, vindo devagar até apoiar-se em suas pernas. Ali dentro estava a sua 'coleção de atrocidades', como costumava chamar, carinhosamente, o conteúdo.

Abriu a tampa. Luna Lovegood piscou devagar em diversas fotos, um olhar atordoado, sempre nua, com escoriações pela pele branca. Fotos paradas dos cadáveres femininos mais bonitos que analisara. Seios de aspecto arroxeado, regiões pélvicas num estado anterior ao de putrefação, unhas compridas, sujas de sangue, de terra. Uma imagem peculiar de alguns vermes atravessando a pele do belo rosto de uma moça que fora encontrada morta numa lata de lixo do Beco Diagonal.

Cormac não era um necrófilo. Nunca se sentira excitado com a visão de um cadáver ou ao tocar um. Nunca praticara nenhum ato sexual com uma pessoa morta. Mas, por outro lado, achava a morte algo bonito, fascinante, que devia ser cultivado. As pessoas costumavam tratá-la com nojo e desrespeito. Para ele, a morte era muito mais bela que a vida. Muito mais pura.

No fundo da caixa, duas pastas de papel, com aspecto de velhas. Os relatórios originais, os verdadeiros, da autópsia de Liam e Rony. Duas pastas que valeriam ouro, mas valeriam também sua liberdade e, embora menos importante, a liberdade de Malfoy.

Deixou a caixa no chão, apoiando as pastas nos joelhos. Abriu a que estava por cima, correndo os olhos pelas palavras que ele mesmo havia escrito, tanto tempo atrás.

—X—

Hospital de Bruxos da Escócia Saint Paul

Glasgow, 15 de Janeiro de 2003

RELATÓRIO DE AUTÓPSIA

HALLELUJAH | DramioneOnde histórias criam vida. Descubra agora