— O curso que você faz é pedagogia? Porque tenho uma pequena leve impressão de que é psicologia — brincou e ela riu.
— Pedagogia é, na verdade, muito similar à psicologia — Ela sentou no sofá ao meu lado. — Vou te mostrar uma série... — Mudou de assunto.
Quando ela pegou no controle, ele viu algo preto na palma da mão dela.
— O que é isso na sua mão? — Ele puxou o braço dela intuitivamente, com delicadeza e, mesmo assim, ela jogou-lhe um olhar abrupto e assustado, mas não desvencilhou a mão.
A mão dele tocou braço dela até ficar posicionada em cima da mão dela. Eles se entreolharam mais profundamente, ele via como o ponto lacrimal dela era bem avermelhado e como a pupila estava consideravelmente dilatada, assim como a dele. Logo ele desviou o olhar, não tinha coragem de olhá-la nos olhos por muito tempo. O olhar dela era doce, mas ele sabia ser amargo demais.
Lana olhou para as nossas mãos entrepostas e ele retirou a mão dele, de forma que a dela ficasse exposta. Estava escrito "Deus" escrito na palma da mão dela. O olhar de estranheza do jovem, fez com que ela dissesse:
— É isso que você está vendo...
— Você é tão extremista a esse ponto? — alarmou e ela riu.
A risada dela foi descontraída, de forma que ele ficou aliviado por passar o clima estranho do toque das nossas mãos.
— Não! Isso foi de quando eu comecei a voltar para Deus. Eu estava meio em cima do muro ainda, hora na igreja, hora nas festas do mundo... enfim. Comecei a me aprofundar, estudar, conhecer o amor de Deus e, no mesmo dia que eu estudei a apalavra de Isaías capítulo quarenta e nove versículo dezesseis, que diz: "Eis que está gravada na palma de minhas mãos.", minhas amigas me arrastaram para uma festa à noite, bebemos muito. Sério. Ficamos muito bêbadas. Uma delas teve insistiu que queria fazer tatuagem e, com isso, fomos parar no tatuador. Um deles começou a tatuar uma borboleta no antebraço da minha amiga...
Minha amiga estava morrendo de dor tatuando a tal da borboleta no antebraço e eu estava tonta na outra cadeira. Abri e fiquei encarando a palma da minha própria mão e lembrando do versículo.
— Tatua a palavra 'Deus' na palma da minha mão. — Dei minha mão aberta pro tatuador.
— O quê? — Riu o tatuador. — Tem certeza?
— Mas por que, amiga? — perguntou uma das meninas, chamada Karol.
— Tenho, faz logo! — gritei. — Deus tem meu nome na palma da mão dele, fiquei sabendo disso hoje e meu amor por ele é recíproco. Além do mais, quero direitos iguais — insisti e olhei para cima, para a cara daquele tatuador de dois metros de altura, com os meus olhos de pedinte.
— Caralho, que história louca, vei — Bruno passou a rir dela.
— Pois é. O mais engraçado foi no outro dia que eu já acordei olhando para a palma da minha mão e eu não lembrava o que tinha acontecido. Eu fiquei meia hora tentando lavar e não saia porque eu pensei que eu tivesse escrito de caneta preta — ela começou a rir. — Hoje já saiu bastante, porque tatuagem na mão não dura muito. O moço nem cobrou.
— Você é mais doida do que eu imaginava — constatou.
— Talvez — ela jogou e ligou a TV.
Os dois assistiam Friends e a chuva engrossava. Pouco tempo depois, ela deitou no colo de Bruno, surpreendendo-lhe, e ele percebeu que, na verdade, ela caiu em cima dele porque agarrou no sono. Ele, esperto como se descrevia, viu a oportunidade de fugir.
Gentilmente, ele trocou seu colo por uma almofada e encostou a cabeça de Lana. Se ela acordasse, ele daria a desculpa de que queria ir ao banheiro. Para a sorte dele, ela não acordou. Ele continuou dando passos lentos e grandes, afastou-se do sofá, mas, ainda próximo, não conseguiu segurar três tosses seguidas. Colocou a mão na boca o mais rápido possível para abafar o barulho. Agradeceu aos céus por ela não acordar. Olhou para o episódio da série, cujo volume estava irritantemente alto, em que os personagens Rachel e Ross estavam brigando, e o fato funcionou para camuflar o barulho. Ele correu para a sala de entrada, deixou Lana lá no "cantinho" como dizia ela. A bota dele ainda estava úmida, mas ele calçou mesmo assim, não queria Pedro se preocupando à toa.
Ao abrir a porta, o vento frio penetrou cada centímetro dos braços de Bruno, fez com que a blusa larga de Lana balançasse as mangas. Só aí ele percebeu o quão quentinho e aconchegante estava lá dentro. O cheiro de terra molhada do lado de fora era contraste para o cheiro de lavanda que eles usaram para limpar o chão, mas ele achava o cheiro da da terra mais agradável. Nisso, ele olhou para trás, morrendo de medo de ela acordar e ver sua fuga. Com sucesso, Bruno saiu no meio da chuva, abrigou-se no barzinho mais perto, ligou para Pedro e passou a localização para ele.
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Menino do Céu!
RomanceBruno tem vinte anos de idade e se depara com as aflições da vida adulta em meio às suas irresponsabilidades. Sua mãe, Margarida Campelo, sempre fora muito batalhadora e lutou por aquilo que precisava. Esse dom não recaiu no garoto, que puxou o lado...