CAPÍTULO 22 - BOLA

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A tarde passou depressa, Bruno não sabia mais distinguir o cheiro de lavanda do cheiro do sabão em pó, tampouco do cheiro de alvejante. Faltava apenas uma salinha, a qual ficava escondida no mesmo corredor da mesa dos santos. Ao lado do painel que continha uma tv com mais polegadas do que ele poderia contar, havia um armário o qual Lana parecia se referir sobre onde os produtos de limpeza eram guardados.

— Esse? — Bruno perguntou ao abrir a porta branca de madeira ao mesmo tempo.

— Não, Bruno! O outro, do outro lado da televisão — ela gritou, mas isso não impediu que diversas bolas quicassem para fora do armário.

— Por que você tem trezentas bolas de futebol dentro do seu armário?

— Não são trezentas, são quatro. — Lana catou as bolas de futebol uma a uma, algumas mais degastadas do que outras e Bruno percebeu que haviam algumas de marcas oficiais.

— Mesmo assim, por quê? — Bruno continuou parado perto do armário esperando uma resposta, mas Lana apenas olhou para ele de soslaio, comprimiu os lábios e franziu a sobrancelha, ignorando a pergunta.

Após guardarem os materiais de limpeza, Lana levou Bruno para lanchar, havia bolo de cenoura com cobertura de chocolate, pão de queijo, café, leite, sanduíches, parecia casa de mãe.

— Obrigada pelo seu esforço, a casa ficou um brinco. Considere-se perdoado pela dívida. Mas eu estou de olho em você.

Bruno apenas sorriu, com a bocha cheia. Nesse momento, ele reparou minuciosamente na linha dos olhos de Lana, denotou que ela não era risonha, não sorria com o olhar. Pelo contrário, a curvatura do olhar dela parecia triste.

— Lana, eu vejo seus olhos tão tristes — comentou ele, com a entonação mais suave que ele já teve.

— Ah... — Ela resmungou de boca cheia enquanto mastigava o pão de queijo, deu um gole do café, engoliu o alimento e continuou: — Você vê muita coisa, você toma LSD.

— Eu nunca te disse isso — ele se defendeu.

— E precisa? — ela rebateu.

Naquele momento, leves pancadas de chuva ecoaram no telhado da casa de Lana, mal dava para ouvir, porque a laje protegia dos fortes estalos. Contudo, em questão de segundos a chuva engrossou, Lana embrulhou Bryan com um monte de manta, e a chuva só engrossava e engrossava, não teria como Bruno ir embora.

— Caralho, guerreiro.... que temporal — comentou ele. — Falando nisso, minha bota imobilizadora molhou toda por conta da faxina, vou ter que tirar agora — constatou.

— Não queria falar não, mas era pra você ter feito isso antes da faxina.

— E por que você não me avisou?

— Bruno, eu nem pensei nisso. Você está com o troço na perna e eu que tenho que sentir? — provocou ela. A forma delicada que ela se irava, fazia o garoto rir. — Vou preparar uma água quentinha para dar banho no Bryan. — Ela ligou o interruptor da sala, parecia noite de tão escuro que o tempo estava, mas ainda não era nem três horas da tarde.

Bruno sentou no sofá e esticou a perna para facilitar a retirada da bota. Puxou o celular do bolso e deixou ele em cima da mesinha, que ficava perto do sofá. Ele achava que a bota não fazia diferença, mas quando colocou o pé no chão sentiu, sentiu um choque, o qual subiu das minhas pernas até o coração. Resmungou e tentou apoiar menos o pé dolorido no chão enquanto subiu as escadas, em um pé ele era o Bruno e no outro uma bailarina de ponta. E ainda doía um pouquinho. Enquanto isso a chuva castigava o asfalto lá fora com chicotadas d'água.

Chegou ao quarto do fraldário e viu Lana já enxugando Bryan e fazendo barulho com os lábios para ele rir. Quando ele viu o irmão mais velho, começou a chorar para ir para o colo dele.

— Vem, veste ele, porque assim ele para de chorar — pediu Lana, mostrando uma roupinha ao lado.

Era uma roupinha bem fofa tipo um body de meia calça e manga longa, com capuz no tecido de algodão com moletom, parecia bem quentinho. Era listrado preto e branco. Nem era do Bryan.

— De quem é essa roupinha? — perguntei.

— Ah, na cômoda tem várias. Eu amo bebês, sonho muito em ser mãe um dia. Geralmente os pais sempre trazem roupa, mas uso muito as que eu compro porque encontro cada uma mais fofa que a outra nas lojas. — Os olhos dela, embora ainda estarrecidos, reluziram enquanto ela mexia nos dedos ao falar. — Eu sei que vai demorar para eu ser mãe então às vezes brinco de boneca com os bebês de verdade — revelou.

— Nossa, isso é bem adulto — zombou Bruno ao terminar de vestir Bryan.

— Vem aqui — chamou Lana.

Ela guiou ele até o quarto dela e acendeu a luz. O silêncio ressaltou o barulho da chuva enquanto ela abriu a porta do guarda-roupas, que era aquelas de correr, abriu uma das gavetas e puxou uma blusa folgada e uma calça de saquitel cinza com preto. A blusa folgada era cinza com o desenho da mulher maravilha em um quadrinho, que só a boca dela estava vermelha.

— Nossa, essas roupas são suas? — Bruno se admirou, perguntando-se desde quando Lana vestia roupas tão masculinas e despojadas?

— Eu te falei que você não sabe nada sobre mim. Além do mais, eu ainda gosto dessa roupas, de vez em quando ainda visto. São as mais unissex que eu tenho, pode vestir.

— Por quê?

— Você se molhou todo me ajudando a dar uma geral na casa.

— Obrigado.

— Eu só não tenho cueca, mas fazer você se livrar dessa bermuda molhada já vai melhorar. — deixou as roupas na mão livre de Bruno, enquanto a outra segurava Bryan. — Fica lá brincando com o Bryan enquanto eu tomo um banho? Pode trocar de roupa aqui no meu quarto mesmo. Não vai no dos bebês, porque lá tem câmeras. — Bruno arregalou os olhos. — Relaxa, elas ligo elas apenas em horário de serviço, mas não deixaria você correr o risco de eu esquecer — adicionou.

— Sim, senhora — falou, fazendo-a soltar um sorrisinho.

E foi aí que Bruno percebeu que, fora a hora que ela estava falando que sonha em ser mãe um dia, ela não sorriu mais. Voltou a ficar séria. Cara, que lombra é essa? Bruno não estava entendendo, e queria entender. Ela parecia ser tão despojada em algum tempo atrás, então por que ela é tão quietinha atualmente?

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