Refúgio

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Luka entrou com as últimas caixas, deixando-as no espaço em frente ao sofá. Apesar do calor, mal tinha começado a suar, mesmo depois de subir e descer vários lances de escada, apenas pelo exercício, atrapalhando a rapidez da mudança. Enquanto ele trazia as caixas eu as abria e guardava as coisas no lugar, ou ao menos colocava a caixa próxima de onde ficaria.
Eu mesma não tinha muita coisa, apenas objetos pessoais, roupas e roupas de cama além do computador e os materiais de costura, mas, Adrien tinha comprado tantas coisas que durante todo o dia estávamos recebendo as entregas. Louças, roupas de cama e banho, eletrodomésticos. Tinha comprado tanta coisa desnecessária que me arrependi de tê-lo deixado escolher o que quisesse, mesmo que tenha usado o próprio dinheiro para isso.

O apartamento em si era grande, mas não teríamos muito espaço se Adrien entrasse em mais alguma loja. Tínhamos conseguido alugar um apartamento mobiliado, apenas a cama tivemos que trocar, já que precisávamos de uma maior do que o normal, mas até mesmo isso Adrien tinha comprado, sem falar na TV gigante da sala.
Meu plano inicial era dividir um apartamento com a Alya, já que estávamos no mesmo campus. Ela conhecia meus segredos, tanto minha identidade de guardiã e heroína, quanto meu duplo namoro, o que tornaria mais fácil minhas escapadas. Meus planos foram frustrados pela insistência de Adrien para que não dividisse o apartamento, para que tivéssemos o local todo nosso. Era um arranjo bom para nosso namoro, mas péssimo para minha vida de guardiã, aquilo com certeza complicaria tudo, mas como dizer não para aquela carinha linda? Ainda mais quando não tinha nenhuma desculpa melhor do que “prometi a Alya” (Nino queria dividir o apartamento com a namorada), ou, “não tenho como bancar o aluguel sozinha” (ele mesmo se propôs a pagar a diferença do aluguel, depois que eu neguei que pagasse inteiro), não podia simplesmente dizer que precisava de privacidade para manter minha outra vida em segredo.
Pela minha falta de eficácia em dizer  “Não”, estávamos agora arrumando aquele apartamento enorme, apenas eu e Luka, enquanto Adrien estava em uma campanha em Londres, duas semanas fora de Paris, e tendo que ficar na casa da tia e do embuste, vulgo Felix.
Me preocupava deixá-lo junto do primo, apesar de todas as coisas ruins, Adrien ainda parece confiar na capacidade de Félix de ser uma pessoa boa. Meu medo era que Adrien falasse mais do que deveria, ou que o primo mexesse nas coisas de Adrien e descobrisse sobre nós três e usasse isso de alguma forma, toda informação é uma arma nas mãos de Félix Graham de Vanily. Felizmente tínhamos tido pouco contato com Félix nos meses em que estávamos namorando, mas sempre que o encontrava não conseguia não notar a semelhança dele com o tio, Gabriel Agreste, os dois eram soturnos e manipuladores, só se importavam com eles mesmo, beirando a sociopatia. Já Adrien, era sempre agradável com todos, confiável e alegre, lembrava muito mais Amélie. As vezes me perguntava se eles não teriam sido trocados quando bebês, era apenas besteira da minha cabeça, Félix é mais velho do que Adrien, mas faria mais sentido que ele fosse filho de Gabriel, ou que os dois fossem de fato irmãos, seria aquele clichê de gêmeo bom e gêmeo mau.

_ porque você está em cima dessa cadeira? _  Luka me deu um susto ao entrar na cozinha, me tirando daqueles pensamentos. Coloquei os pratos de porcelana na prateleira alta sobre a pia,  ao lado dos Bowls.
_ porque eu queria guardar isso logo._ as mãos de Luka me levantaram pela cintura e me colocaram no chão, afastando a cadeira.
_ eu guardo as coisas altas, você pode guardar as coisas de baixo, ou começar a arrumar o closet. _ Em vez de sair continuei a secar as louças, deixando para Luka apenas a tarefa de guardá-las, observando a facilidade com que levava as louças até a armário alto.
Adrien tinha escolhido um conjunto completo de jantar chines, desnecessariamente caro, do tipo que normalmente se compra para casamentos, não para universitários morando fora de casa pela primeira vez. Era maravilhoso, branco, trabalhado em dourado e preto, com carpas vermelhas.
Comprou também um conjunto de taças e copos de cristal e um jogo de chá finíssimo, que parecia que se quebraria ao mínimo toque, estes eu nem mesmo tinha tirado das caixas, não iria usá-los, então pediria que devolvesse, mas, aquele conjunto de jantar era simplesmente lindo de mais para não ficar com ele. As outras louças já estavam lavadas e quase todas as peças guardadas no armário com portas de vidro.
Compraria canecas de café, copos simples e pratos para o uso diário. Provavelmente Adrien protestaria, mas apesar de ser acostumado com aqueles luxos na própria casa, não tinha essas coisas nas nossas, então ele sobreviveria sem elas.
Nossa cozinha estava abarrotada de utensílios desnecessários, tínhamos batedeira, liquidificador, torradeira, grill, sanduicheira, cafeteira, esses eram os úteis, panquequeira, crepeira, e outras variedades que eu nem tinha entendido para o que serviam, além de espremedor, cortadores, mixer, processador de alimentos, iogurteira, torradeira, até uma picadora de gelo para raspadinha, e sabe-se lá o que ainda tinha nas caixas.
Fui separando cada coisa que achava desnecessária para que ele devolvesse. Já ficava desconfortável com ele pagando parte do aluguel, a quantidade de coisas que ele tinha comprado era absurda, e deixava pouco espaço para que eu tornasse aquele lugar a minha cara. Ainda era o Meu apartamento, afinal.

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