Rhaenyra tinha que admitir que não tinha exatamente um plano para quando desembarcasse com sua bagagem e Syrax, mas imaginou que com o dinheiro que tinha guardado por anos não seria difícil conseguir um quarto em uma pensão ou comprar uma casa.
Mas arranjar comida para Syrax seria um problema...
Ela foi até a pensão e o homem que cuidava da recepção a olhou de soslaio.
–Você é bonita, vai arranjar muitos clientes aqui.
–Clientes? Por que? Eu vim apenas dormir por que está tarde!
–Senhorita, isso aqui é um bordel.
Rhaenyra fica vermelha de vergonha.
–Me indicaram o lugar errado. Desculpe.
–Oh, não se preocupe, a minha mãe também tem algumas pensões. Ela deve indicar alguma.
Ele chamou um dos rapazes.
–Chame a patroa, sim. Alguém anda passando informação errada na cidade.
Quando o rapaz sai, Rhaenyra agradece.
–Obrigada pela sua ajuda, Sir.
O homem a estranha.
–Sir? Você é de Westeros?
–Sou.
Ele a olha de alto a baixo.
–Você não seria uma Targaryen, seria?
Rhaenyra estranhou a pergunta, afinal era óbvio.
–Sim. Sou Rhaenyra Targaryen.
O queixo do homem cai.
–Prima?
Rhaenyra fica espantada, afinal, como assim o homem era seu primo?
Uma mulher desce a escadaria neste instante.
Ela tinha a aparência Targaryen e era bem bonita, parecendo estar com quase 40 anos ao invés dos seus quase 50.
–Vaenor, filho. Você me chamou?
–Mãe. Essa é Rhaenyra Targaryen.
A mulher a olha, boquiaberta.
–Sobrinha?
Rhaenyra tenta se lembrar de como essa mulher poderia ser sua tia, até sua memória se ativar ao lembrar da famigerada Princesa Devassa, aquela que desafiou Jaehaerys e fugiu para virar prostituta em Essos, a irmã de seu avô e avó paternos e também irmã de sua avó materna. (Sim, incesto é confuso)
–Você é... Tia Saera Targaryen!
A mulher correu até ela e a abraçou.
–Oh menina, eu fiquei tão assustada quando soube que você foi embora! Eu temi que você acabasse em um lugar perigoso! E eu até pedi que se vissem uma mulher com um dragão, a enviassem para mim ou te mantivessem por perto até eu poder chegar a você!
Rhaenyra ficou abismada com a declaração da mulher mais velha, mas ficou feliz no fundo com a cuidado que uma parente que nem a conhecia tinha com ela.
–Venha meu bem, você vai ficar comigo e minha família até querer ir embora. Tudo bem?
Rhaenyra concordou e ficou muito aliviada por encontrar uma família e um abrigo em um momento em que ela sentia que perdeu seu lar e não tinha para onde ir.
Logo conheceu os filhos e netos de Saera, a começar com Vaenor, aquele que foi um dos que visitou Westeros anos atrás.
Saera pediu que ela contasse porque foi embora e Rhaenyra explicou.
Nos seus olhos, Rhaenyra viu uma empatia por sua situação que raramente via. Até mesmo um pouco de orgulho quando ela descreveu como foi embora.
–Não foi fácil. Não está sendo fácil. -ela confessa para sua tia-avó.
–Eu imagino que não. Rhaenyra. Por que eu também deixei para trás tudo e todos que eu amava quando vim para cá. Eu... Eu sinto saudades da minha mãe, Rainha Alyssane, até hoje. Eu senti saudades até do meu pai, Rei Jaehaerys, apesar de tudo. Eu sofri por cada irmão meu que morreu.
Rhaenyra, quanto mais conhecia Saera, menos ela parecia a tal "Princesa Devassa", como era descrita.
E comentou isso em voz alta.
Saera deu um sorriso triste.
–Imagino as coisas horríveis que falam de mim até hoje.
A maus jovem fica em silêncio, pois realmente só se lembravam das suas pegadinhas e seus amantes.
Mas se sua avó Alyssane a amava tanto, Saera não teria algumas qualidades?
–Tia Saera... O que é verdade, e o que é mentira?
–Bem... Eu fiz sim aquelas pegadinhas. Mas não foi por maldade. E eu fiz sim alguns homens fazerem coisas tolas e se arriscarem. Mas foi porque eles estavam me irritando com sua mania de me tratar como uma princesa tola que só é bonita e sem cérebro. Eu nunca fui burra! Eu era tão inteligente quanto meu irmão Vaegon e ele era quatro anos mais velho do que eu!
Rhaenyra entende. E faz a pergunta que mais cedo deixou curiosa.
–E... E os três homens?
–Oh. É verdade também. Mas não como você pensa. Ou como Westeros pensa. Foi um ritual.
–Ritual?
Ela mostra um símbolo, tatuado em sua mão.
Estava escrito "As Quatorze Chamas Sagradas".
–Espera... Esse era um ritual para você virar sacerdotisa das Quatorze Chamas?
–Sim. E eu devia me casar com os meus três iniciantes, como manda a tradição valiriana. Mas infelizmente nunca terminei o processo. Sou uma sacerdotisa, mas nunca poderei virar a Alta Sacerdotisa. Pois como manda a tradição, o Alto Sacerdote ou Alta Sacerdotisa precisa se casar com quem a iniciou.
Rhaenyra sentiu sua mente explodir.
Saera não era uma devassa.
Ironicamente, ela era tão religiosa e apegada a tradição quanto Alicent, só que em uma religião diferente.
–Tudo o que aprendemos de você em Westeros está errado!
–Você quer dizer... Na visão dos homens tolos de Westeros, não é?
Rhaenyra faz um sinal afirmativo com a cabeça.
–Querida, a história é escrita por homens. Uma mulher nunca poderá triunfar nas mãos deles. Ou ela é Mãe, ou Virgem, ou Prostituta. Para eles nunca saímos desses arquétipos. Eles não podem olhar para nós e ver pessoas complexas, com nossas dores, nossos dilemas, nossos sonhos e nossos desejos.
Rhaenyra sentia a obrigação de concordar com as palavras de Saera.
–Imagino o que falarão de mim por ter ido embora ao invés de me submeter a um casamento com um vassalo para a aliança que beneficiasse meu pai, e por consequência meu irmão.
Saera fez um barulho de desprezo.
–Deixe os tolos com sua tolice. Fique você com seu livre arbítrio.
Saera põe as mãos em seu rosto.
–Você, minha querida, tem a força de sua avó Alyssa, de sua bisavó Alyssane, de sua tataravó Alyssa Velaryon e de Rhaenys Targaryen. Cada uma delas subestimada. Cada uma delas lutadoras. Não se aflija por abandonar uma situação abusiva. Um pai tóxico e uma madrasta tóxica não vão deixar de fazer mal só por que você é família. Eu aprendi do pior jeito com meu pai Jaehaerys que seu pai pode amar você, pode querer o seu bem, pode se importar, mas isso não impede que ele seja aquele que quer cortar suas asas e te te prender em uma gaiola de ouro e chamar isso de proteção.
Rhaenyra baixa os olhos de tristeza.
Ela amava o pai. Muito. Mas precisava ficar longe dele ou iria enlouquecer.
–Mas não é, Rhaenyra. Não é proteção, embora eles pensem que é. Uma gaiola de ouro não deixa de ser uma prisão só por que ela é dourada. E nem todas as joias e vestidos bonitos vão compensar o buraco que você sentiria por dentro, se esvaziando da sua personalidade para atender a quem só quer usar você.
Saera carinhosamente puxa um cobertor para ela.
–Durma bem. Você está livre agora. Você foi corajosa e rompeu as correntes. Pense no que você quer, agora que ninguém pode te parar.
Quando ela sai, suas palavras giram e sua mente.
–O que eu quero? -ela se pergunta em voz baixa.
Ela não era mais a princesa herdeira.
Não era mais sequer uma princesa.
Não era alguém que pertencia a Westeros.
Deu as costas ao passado.
–O que eu quero? -ela repete.
O que ela fará de sua vida?
Qual será o seu propósito?
Ela pisca, olhando fixamente para o céu estrelado. Rhaenyra sabe exatamente o quer.
–Eu quero tudo!
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A Imperatriz Ametista
FanfictionRhaenyra perde o posto de herdeira para seu irmão mais novo. O reino fica feliz pela tradição estar restabelecida e ter um herdeiro masculino. Eles só não contavam que Rhaenyra iria lhes dar as costas e ir embora de Westeros. Em outro continente e l...