Alzheimer, é uma doença degenerativa que não tem uma causa evidente, o mais aceitável é a genética. Se caracteriza pela perda da memória e de funções cognitivas, ocasionada pela má formação da certas proteínas, esses fragmentos protéicos não supre a necessidade da bainha de mielina e muito menos do neurônio. É uma doença triste.
— Vamos ela vai gostar de te ver. —minha sogra tentava convencer Alice a ir visitar a avó.
— Ela nem se lembra de mim, mãe.
— Não é sobre as lembranças que ela terá de você e sim as lembranças que você terá dela.
— Se eu tivesse essa doença eu odiaria que lembrassem de mim doente, gostaria de ser uma lembrança que faça os outros sorrirem.
O silêncio reinou, Maria Alice sempre deixou sua visão de como as memórias eram importantes para si. Desde o primeiro buquê que a entreguei até o último com o pedido de casamento, Maria guardou as pétalas das flores para jogar no dia da cerimônia, logo eu que achava uma perda de dinheiro casamentos.
— Não vai jogar isso fora? —perguntei analisando as cartas antigas escritas a mão de diversos anos atrás.
— Não vou, são lembranças.
— Isso é transtorno acumulativo. —brinquei e logo de resposta recebi um soco fraco no braço. — É brincadeira.
— Eu sei, não sou acumulativa.
— Isso é o que um acumulador diria.
Eu sabia muito bem que Alice não era acumuladora, ela gostava de acumular suas memórias além da sua massa cinzenta. Ela odiava esquecer as datas por mais bobas que sejam, desde o nosso aniversário de casamento até a primeira noite que nos beijamos. Ela amava lembrar as músicas que tocavam em momentos que estávamos juntos. Ela amava memorizar as senhas dos cartões e números de telefones, inclusive não tinha nenhum contato salvo além de seus pais e o meu em seu celular, Alice sabia quem ligava pela terminação do número. Eu nunca fui bom de memória, mas quando eu estava com ela minha mente simplesmente focava involuntariamente em suas palavras e sua imagem, Maria estava em minha cabeça impregnada assim como os dez mandamentos na pedra. Ela amava criar memórias incríveis e amava lembrar.
— Oi vó, a senhora se lembra de mim? —perguntava segurando a mão da idosa com todo cuidado como se o corpo dela pudesse se quebrar.
— Milena você já chegou da escola.
— Não vó, Milena é a minha mãe. Eu sou Maria Alice sua neta.
— Milena já tem filha? Como pode? Ela só tem dezessete. —a idosa dizia convicta. —Toma benção da sua avó. —assim como ordenado Maria Alice fez.
Era triste ver aquela mulher perdendo com o tempo seu bem mais precioso. Alguns dão a sorte de somente ter que engolir vários comprimidos diariamente para hipertensão, diabetes ou para repor vitaminas, aquela idosa não tinha mais o que fazer, não existe um remédio que possa voltar com suas lembranças, apenas alguns que a permitem ainda conseguir segurar uma xícara de café. Além da perda de memória o alzheimer trás consigo perda da função cognitiva.
É uma doença que leva o ser humano aos poucos.
— Me promete que nunca vai esquecer. —ela disse quando entramos pela porta do nosso apartamento.
— Esquecer?
— Me esquecer, esquecer da gente, das nossas datas, das nossas músicas e principalmente das nossas promessas.
— Eu prometo. Maria, você também nunca poderá me esquecer.
— Você está marcado em minha memória como risco em pedra. —brincou e me envolveu em um abraço caloroso.
Maria Alice não cumpriu a promessa e com o tempo o risco na pedra foi se desgastando e enfim, ela não se lembrou de mim.
— Você não quer beber a água? —perguntei lhe servindo um copo.
— Obrigada pai, mas não quero.
— Amor, eu não sou seu pai.
— Não? Quem é você então?
— Sou seu marido.
— Eu estou muito nova para casar.
— Você está tão velha quanto eu, estamos casados a 52 anos já.
— Tivemos cerimônia?
— Sim, você foi a noiva mais linda que eu já vi em toda a minha vida. —vi seus olhos brilharem do mesmo jeito que brilharam quando subiu no altar.
— Como eu pude me esquecer disso?! —perguntou incrédula.
— Não se preocupe meu amor, eu lembrarei por nós dois.