Morte

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Dizem que a vida tem 3 fases: nascer, crescer e enfim morrer. Maria Alice tinha tanta curiosidade desde sempre sobre para onde iríamos depois que morremos.

— Achei que você era católica. —disse depois de escutar sobre sua teoria de destino após o fim.

— Eu diria que sou indefinida, é fácil explicar que sentamos ao lado do pai depois que encerramos esse ciclo, ou que esperamos na fila para voltarmos ao mundo.

— E você nunca gostou de coisas fáceis, estou certo?

— Sim, parece que é algo mais complexo que isso.

Todos temos medo de partir apesar de ser um destino inevitável, na realidade acho que as pessoas tem medo de como vão e de como os familiares e conhecidos irão se sentir.

Certa vez eu sofri um acidente, rodopiei pela rodovia após um carro atingir a minha moto. Por sorte eu estava sozinho, depois disso nunca mais consegui subir em uma moto. Talvez seja medo de falecer dolorosamente, a minha recuperação foi doloroso então a morte seria ainda pior.

— Abra a boca. —ordenou.

— Não estou com apetite agora.

— Você tem que comer, como vai se recuperar dessa maneira? —e lá se foi mais uma colherada de sopa forçadamente pela minha garganta.

Estava feliz por não tê-la deixado.

Minha Alice sempre foi protetora e cuidadosa, eu acho que já mencionei que sua linguagem de amor era atos de serviço, e sempre fiquei em dúvida se tinha uma pitada de demonstração por toque nela porque mesmo com uma costela e a perna esquerda quebrados ela insistia em deitar na mesma cama que eu e ficar alisando o meu dedo mindinho, nossas tardes eram sempre assim e eu amava mesmo estando dolorido.

— Não é por que você está machucado que eu não possa te machucar mais. —sempre agia tão docemente.

— Eu já disse que não.

— Para de ser infantil é só um banho, você não vai conseguir se sustentar somente com uma perna me deixe te ajudar.

— Diga a verdade, isso é só uma desculpa para me ver pelado. —a vergonha lhe consumiu e eu não pude segurar a risada.

Naquela noite eu fiquei sem banho.

O medo da morte é fundamental para a sobrevivência, não somente do ser humano mais todo o reino animal teme o fim e foge a todo custo disso. Diferente dos seres irracionais temos a curiosidade, nós humanos buscamos o inexplicável, o desconhecido a todo momento, claro, não pensamos na morte a todo instante. Me intriga o fato de que o óbito é a única certeza incerta do mundo, você sabe que algum dia vai ir embora entretanto a incerteza de que de há realmente algum lugar para ir nos assombra.

— Se existir inferno, você acha que eu iria para lá? —Maria, bençãos não vão ao inferno.

— Acho que não, dependendo de quem será o juiz para suas ações do final.

— Quero ser uma pessoa boa.

— Alice, você é uma boa pessoa.

— Você tem medo do que te espera? —as questões por mais que simples me faziam refletir.

— Não, não vivo de arrependimentos, o que me espera é o merecido.

— Certo.

Não precisei perguntar, era certo que por mais que negasse, Alice tinha medo de morrer e de certa forma isso me aliviava.

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