Segundas Intenções

564 96 30
                                    

-Pai, esse é o meu amigo que eu te falei antes. - O puxei para o meu lado. - O Ajax.

- Prazer em conhecê-lo, Ajax.

- O prazer é todo meu, senhor. - Trocaram um breve aperto de mãos. - E seja bem vindo a nossa casa. Fiquei muito feliz quando a minha filha me disse que traria um amigo aqui. O que vocês irão fazer?

- Ele está com certas dificuldades em matemática e como eu sou muito boa, eu me ofereci para ajudá-lo aqui em casa pai. - Expliquei-me.

- Ata, tudo bem. Fiquem a vontade. - Vestiu o jaleco e pegou a maleta encima da mesa. - Tem comida na geladeira, então nada de ficarem com fome. A sua mãe vai sair um pouco mais tarde do Colégio hoje, então depois que eu terminar de atender a minha última paciente, eu irei até lá buscá-la. - Pegou a chave do carro. - Quando eu voltar, eu deixo o seu amigo em casa.

- Ah, não precisa. Os meus pais devem vir me buscar, mas muito obrigado pela a gentileza. - Sorriu brevemente. - O senhor é muito gentil.

- De nada. Até mais filha. - Beijou minha bochecha e deixou a casa, indo em direção ao carro.

O puxei para o segundo andar da casa e ele riu após entrar no meu quarto. Acho que ele estava a espera de um quarto mais normal, ao invés de coisas fofas por onde quer que ele olhasse. As paredes eram azuis e há uma parede rosa. Há uma cama de casal repleta de ursinhos de pelúcia e alguns brinquedos pendurados na estante, bem ao lado dos meus livros. Retirei meus materias da mochila, enquanto o observava pegar um dos meus bens mais preciosos.

- Conto de Fadas? - Levantou o livro para mim. - Isso é sério mesmo?

- Sim, o que você tem contra isso?

- Nada. - Riu novamente e pegou outro. - Mas livros assim são lidos por crianças no ensino fundamental e você já é uma adolescente, Enid.

- Mas eu gosto de contos. Então eu preciso parar de fazer o que eu gosto só porque eu já sou uma adolescente? - Juntei as sobrancelhas, confusa quando ele assentiu. - Então, o que eu deveria fazer? Deveria beber, me meter em confusões e ir em baladas como a maioria deles?

- Bem, sim, pera você sabe o que é uma balada? - Guardou o livro de volta na prateleira e se virou para mim.

- Sim, quer dizer, eu nunca fui em uma, mas eu já li sobre elas em alguns livros de romance. A personagem principal ama ir nesses lugares quando está triste e às vezes eu me pergunto o porquê.

- Porque a gente acha que beber irá resolver todos os nossos problemas, mas não se engane, isso só piora a nossa situação. O álcool te deixa muito sensível. - Pegou um barquinho de brinquedo. - Pra quê você tem isso? Você ainda brinca?

- Não. São só recordações de quando eu era pequena. A minha mãe quis jogar todos esses brinquedos fora, mas eu ainda sou muito apegada a eles, então eu decidi guarda-los. - Coloquei meus materiais encima da escrivaninha, perto do meu computador, minha grande fonte de pesquisa. - Você acha isso estranho?

- Estranho não, diria diferente. - Passou as mãos pelos os outros brinquedos. - Nunca conheci ninguém assim.

Expliquei sobre a origem de cada um deles, quais eram seus nomes e como eles eram especiais para mim. Ajax ouvia tudo atentamente e também me contou um pouco sobre a sua infância. Ele disse que amava jogar futebol, assistir desenhos e se meter em encrenca com os vizinhos. Ambos riámos de nossas histórias, tanto que nem víamos o tempo passar. Iniciámos os estudos somente um tempo depois. Ele disse que se concentrava melhor ouvindo música, então deixei que ele colocasse alguma no computador enquanto eu o ensinava.

Ele era muito inteligente, mas se confundia muito fácil com os sinais de cada conta. Passei várias atividades para ele. Fui até a cozinha preparar um lanche enquanto ele fazia e acabei sorrindo. Nunca pensei que um dia eu traria alguém aqui. Nunca pensei que um dia eu faria algum amigo.

Depois de ter sido ignorada por Wednesday naquele dia, eu voltei muito triste para casa, decidida a falar com ela no dia seguinte. Mas ela não aparecia. Fiquei preocupada e acabei perguntando a Alicia o que estava acontecendo. Ela disse que a amiga ainda estava muito mal pelo o término com o Xavier e que talvez, ela voltaria as aulas só na semana que vem. Foi Ajax quem me consolou porque eu estava me sentindo muito culpada, afinal, querendo ou não, o motivo do término deles era eu. Wednesday só se aproximou de mim para me ajudar, mas Xavier não queria enxergar isso. Ainda mais depois que ele descobriu a existência daquele bilhetinho idiota, que eu havia mandado pra ela.

Eu não deveria ter feito aquilo.

E era para mim ter levado uma boa surra, mas graças ao Ajax, isso não aconteceu. Ele havia passado a me proteger e mesmo que eu me sentisse feliz com isso, às vezes eu também me sentia uma inútil. Quis contar a minha mãe sobre tudo o que aconteceu desde que eu pisei na escola, mas a coragem me faltava. Eu não queria preocupa-la.

- Precisa de ajuda ai? - Gritou da escada.

- Não precisa! - Gritei de volta. - Eu dou conta sozinha! Você gosta de doces né?

- Óbvio!

- Ok!

Enchi a bandeja de várias guloseimas, a maioria delas de chocolates e salgadinhos. Peguei alguns toddynhos na geladeira e voltei para o quarto. Demos uma pequena pausa no estudos enquanto comíamos e jogávamos no computador. Eu ria de praticamante tudo o que ele fazia, ainda mais quando ele ficou irritado por perder para mim no game de estratégia. Mesmo o conhecendo a pouquíssimo tempo, eu já o considerava muito. Espero que ele não se canse de mim e que sempre seja o meu amigo.

- Você acha que a Wednesday vai aparecer na aula amanhã? - Enfiei um tanto de salgadinhos na boca. - Não aguento mais esperar.

- Alicia disse que ela apareceria né? Não se preocupe, ela terá que ir de todo jeito se não quiser ser reprovada. Tenho certeza que ela vai aparecer.

- Espero que sim. Eu ainda preciso me desculpar com ela por causa daquele bilhete.

- Do pedido de namoro? - Assenti. - Não creio que isso seja necessário não. Você nem fez nada demais.

- Eu também leio livros românticos, então eu acho que sei mais ou menos o que é um namoro. Eu só não tenho nenhuma experiência nisso.

- Se sabe, então por que você aceitou mandar aquilo? - Questionou ele.

- Porque você disse que o namoro era meio diferente e também porque eu... - Mordi meus próprios lábios, tensa. - Queria saber qual seria a reação dela. Não que eu esteja apaixonada ou algo do tipo, mas é que...

Meu rosto já estava todo vermelho.

- Já saquei tudo! - Comentou de boca cheia, rindo como um idiota. - Você tá é afim dela!

- Afim? - Limpei os lábios. Minhas orelhas não paravam de balançar de um lado para o outro. - E o que isso quer dizer?

- Quer dizer que você se sente atraída por ela, a acha bonita e outras coisas a mais. Resumindo, isso significa que você quer beijá-la e eu te entendo.

- Entende é?

- Sim, porque eu também sou afim dela.

Quase engasguei quando ele disse isso.

- S-Sério? - Confirmou com a cabeça. - Ata...

- Calma, não precisa ficar assim não. Eu sou afim dela mas agora eu prefiro ficar com você, quer dizer, no início eu não tinha me aproximado com essa intenção. Na verdade, eu estava com inveja de você pela a atenção que ela estava te dando. Mas depois que eu te conheci melhor, vi que você era uma boa pessoa. Muito melhor do que aqueles idiotas que estudam lá!

Fiquei surpresa com isso.

Ele queria beijar a Wednesday, se aproximou de mim por inveja e agora está dizendo que gosta de mim? Isso era muito confuso. Tão confuso, que era melhor eu nem tentar entendê-lo. O que importa é que agora ele era o meu amigo e eu não queria perdê-lo. Híbridos conseguem se apegar as pessoas mais rápido do que os humanos. Mais um dos defeitos de ser eu.

- Ah, que bom então... - Abri outra barra de chocolate. - Obrigada por ser meu amigo.

- Se quiser, só se você quiser, - Aproximou ele, tocando minhas orelhas de forma inesperada, enquanto olhava nos meus olhos. - Eu posso ser muito mais do que um amigo.

HEY, I'M THE HYBRID! | 𝘞𝘌𝘕𝘊𝘓𝘈𝘐𝘙 🏳‍🌈Onde histórias criam vida. Descubra agora