Nos Troncos Gêmeos

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Nos troncos gêmeos, a luz do isqueiro era muito pouca e, o monótono cheiro úmido, de mofo e madeira antiga, sempre deixava escapar uma brisa de ar puro — oque fazia parecer que os viajantes chegavam à saída muito mais depressa do que como vinham caminhando. Contudo, isso era apenas uma ilusão e nada mais. Os túneis eram longos, escuros, escorregadios e antecipavam uma escuridão sinistra; uma que Martin não conseguia suportar.

Ele estava com medo, é claro. Tinha um fraco pelo escuro, ainda mais se estava confinado num tronco mofado de árvore. Ao que parece, ele havia se esquecido do medo enquanto discutia com Hermes, e agora estava um pouco aliviado de não ter ido com ele. Seria um problema se o mago soubesse que ele ainda tinha medos de criança do primário. Em caminhada, o eco medonho dos passos era, predominantemente, oque preenchia o ambiente para Martin. Mas isso não estava certo. Havia muito mais sons percorrendo por dentro do tronco, e a maioria deles ganhava vida justamente através dos seus companheiros: Tim e Clara — que conversavam alto, a respeito do preço de sapatilhas em seus respectivos continentes. Clara não podia acreditar no preço médio de um calçado em Vastemagie, e logo pôde entender porque Tim só andava de sandálias.

Martin suava frio, cronometrando os minutos em silêncio, quando um estalo assustador da madeira o fez querer dizer alguma coisa, só para não se sentir sozinho. "Não está ficando escuro demais aqui dentro...?" — ele anunciou redundantemente. A coisa toda sempre esteve escura.

— Claro. — falou Clara. — A gente tá num túnel, não se lembra?

— É. Está bem escuro, mesmo com o isqueiro. — Tim replicava — Eu não me importo tanto, mas posso acender uma tocha com alguma coisa, se vocês quiserem uma luz mais forte.

— A mim não incomoda. — disse a menina. Notavelmente, Clara tinha medo de muitas coisas, mas só do que era (ou considerava) uma ameaça real. Como ninguém nunca foi atacado pelo escuro em pessoa, ela se sentia bem segura.

— Um pouco mais de luz não faria mal. — colocou Martin.

— Hã. Não sei se é uma boa ideia. E se a gente sufocar aqui dentro? — Clara indagou. — Já não está sendo fácil respirar aqui dentro, sabe...

Mas Martin não quis ouvir. — Pode acender, Tim. — então disse.

— Ei! — rebateu Clara — Não acende não, Tim!

— Acende.

— Não acende!

Tim fabricava um show de luzes epiléticas ao apagar e acender a chama do isqueiro, próxima a um ramo de palha. — Querem se decidir, por favor...? — ele os pediu com um sorriso cansado. A dupla se entreolhou.

— Deixa ele acender. — falou Martin.

— Não! Vai ficar o maior cheiro de fumaça! — Clara explicava — Qual o problema de um pouco de escuro, afinal? Não me diga que está com medo!

O rapaz se engasgou por acidente. — Heh. Bobagem! Medo de escuro... Por que alguém teria medo de escuro, não é? — Martin fez tanta questão em dizer isso de forma confiante, que esqueceu de ser convincente.

— Ah não... — então começou Clara, num tom meio chistoso — É isso, né? Tu tem medo de escuro! — Martin soprou os olhos dela, emburrado.

Clara agachou-se rapidamente, e apanhou a canela dele.

Ela pôde senti-lo tremer da cabeça aos pés, num susto terrível.

— Sabia! Tá morrendo de medo! — exclamou ela.

Martin soltou os pés e voltou a andar, a ignorando. Daí em diante, Clara passou a cutuca-lo nos cantos e em intervalos totalmente aleatórios. Ele se assustou todas às vezes, mas a gota d'água foi quando ela gritou "tome" bem no seu ouvido, susto que deve tê-lo tirado uns dois anos de vida.

Momento Mellowick - A Grande Expedição para a Ilha de Goa.Onde histórias criam vida. Descubra agora