Capítulo XI

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Athlone, Irlanda 1870

  Aconteceu! Meu primeiro beijo aconteceu com o homem cujo o qual eu não irei me casar e que eu conheço a alguns dias. Ah meu Deus! Nenhuma dama decente que se prese teria deixado aquilo acontecer. O que minha mãe diria? Minha conduta foi imperdoável. Com que cara eu olharia para Brendon agora? Brendon, e um sorriso surgiu assim que pensei nele, ele desperta sentimentos tão conflitantes em mim, não sei o que pensar quanto a ele ou quando estou com ele. Muita coisa mudou desde que sai de Galway, desde que conheci Brendon, desde que comecei a me conhecer. Eu estava descobrindo uma nova Annelise em mim, uma mulher que eu não sabia que existia está lutando por seus sonhos. Me olhei no espelho, eu estava sozinha no quarto pois Brendon tinha ido fazer alguma coisa no saguão, vi uma mulher com seus cabelos incontroláveis adornando o rosto. Como nunca tinha percebido como meus cabelos realçavam meus olhos? Estavam mais verdes, mais vibrantes.
  Brendon entrou no quarto segurando uma garrafa de vinho e duas taças, imediatamente perguntei o que ele pretendia com aquilo:
- Sabe o que fazemos em Dublin quando situações assim acontecem? Bebemos com a pessoa. -
- Verdade? - perguntei desconfiada
- Não, mas deveria ser, álcool muitas vezes é a solução para situações embaraçosas. - acredito que todo taverneiro pense da mesma forma.
- Tem certeza? Minha última experiência com álcool foi por si só embaraçosa. - só de lembrar minha cabeça dói
- Exato, o álcool anula todas as situações embaraçosas anteriores. - pelo que vi iríamos realmente beber.
- Acho que não tem como piorar. - e peguei uma das taças, Brendon a encheu, até demais.
- Vamos brindar a que? -
- As situações embaraçosas da vida. - e brindamos mais rindo do que bebendo.

  A noite foi muito diferente de como eu imaginei que seria, conversamos como se nada tivesse acontecido. Aquilo de certa forma foi um alívio e ao mesmo tempo uma sensação horrível, será que aquilo não tinha significado nada para ele? Será que eu era só a dama ingênua da história que acabou de dar seu primeiro beijo e está exultante com isso?
  Bebemos o vinho, jantamos e por fim ficamos sentados em frente a lareira, ali não dissemos uma sequer palavra. O fogo refletia no rosto de Brendon e seus olhos brilhavam com o reflexo das chamas. Será que ele estava arrependido? Muitas perguntas se passaram pela minha cabeça e não pude mais me conter, ainda fitando a lareira, perguntei:
- Você se arrependeu? - ele me olhou com espanto e praguejou baixinho.
- Acha que me arrependo? - e sorriu de forma depreciativa - O problema é exatamente o contrário, eu não me arrependo, posso ser considerado um canalha por isso e ainda assim não me importo. - algo dentro do meu peito deu um salto e começou a bater desesperadamente.
- Você está fazendo tudo o que pode para fingir que nada aconteceu, isso me fez pensar que estava arrependido do que fez, do que fizemos... - me encarou com um olhar desacreditado e por fim disse:
- Ann, depois que chegarmos em Dublin isso não vai continuar, não vale a pena começar algo que não terá futuro! -
- E por que não teria um futuro? -
- Porque isso Ann, é muito mais letal do que parece. -
- Isso o que?
- O amor, depois que se entrega a ele você fica terrivelmente propício a se machucar e muito.
- O que te deixou assim? - minhas palavras foram lentas e expressivas.
- Não vou conseguir "esconder" isso por muito tempo. Eu já amei alguém, me entreguei as graças do amor e me machuquei. - aquilo foi como um soco no estômago, ele ainda estava machucado, ferido e sofrendo.
- Brendon...o que houve? - ele recobrou sua postura e com certa relutância se pôs a contar a história, foi então que "conheci" Jasmine, a espanhola que conquistou o coração de Brendon e depois o esmagou. Após contar a história vi que não tiraria mais nada dele e dessa vez eu não tinha o direito de insistir.

  Acordamos no outro dia com o sol irlandês invadindo o quarto, nos levantamos e arrumamos tudo para seguir viagem. Nosso próximo destino era Moate a mais ou menos quatro horas de Athlone. Já estava me acostumando a longas caminhadas, andamos pelo que pareceu uma eternidade até chegarmos a Moate. Assim que chegamos paramos em uma espécie de mercearia para comermos e passamos umas duas horas lá. Conseguimos uma "carona" com um padre que passava por ali até Tullamore, duas horas depois e meu estômago já havia dado varias voltas por conta da carruagem, era uma carruagem simples de aluguel sem muito conforto, mas pelo menos chegamos lá com duas horas a menos do que se fôssemos a pé. Por que viagem a pé esse tempo todo se podia muito ter subornado um viajante na estrada e ter ido de carruagem? Pois era isso o que faria a partir de agora.
   Ao chegar em Tullamore tivemos a ideia de encontrar alguém que estivesse indo para Cappincur, andamos a cidade inteira e perguntamos para diversas pessoas, mas por fim tivemos que ir caminhando mesmo. Por sorte era somente uma hora até Cappincur, chegamos lá já no fim do dia. Tentamos a sorte perguntando ao dono de uma pousada se ele sabia de alguém que estava indo para Daingean, ele disse que por uma certa quantia poderíamos alugar um cabriolé e como ele tinha uma pousada em Daingean poderíamos deixar lá para que alguém a trouxesse de volta. O meu dinheiro já estava no fim e não seria aconselhável gastar de uma vez, porém fui surpreendida por Brendon que disse essa ele pagaria, já que não pagou nenhuma das pousadas até agora. Pegamos o cabriolé e Brendon foi conduzindo-o.

Uma Jornada em Busca da Liberdade por Milena Milão Onde histórias criam vida. Descubra agora