Você poderia não tornar disso uma praxe?

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Nós morremos de overdose. Todos nós morremos de overdose, porque a vida é uma droga. E mesmo que haja pessoas que discordem, espero que elas ainda lembrem disso para que possam concordar algum dia. Porque eu sei que vão.

Não digo que a vida é uma droga no belíssimo sentido de "life sucks" — ou melhor, não só nesse. A vida é uma droga porque vicia e cria uma ilusão na nossa cabeça de que tudo está ótimo. E quem quiser livrar-se dessa droga é taxado de inúmeras coisas. Nada boas, por sinal.

Convenhamos, tudo começa num burburinho entre espermatozoides acerca de um lugarzinho mágico e incrível. E então você é influenciado e põe na cabeça de que quer conhecer esse novo mundo. Você corre o mais rápido que pode. Você consegue e fica feliz. Meses depois, você já não é tão pequeno, porém ainda ingênuo. De repente você está no mundo e não está entendendo nada, mas tem uma mulher sorrindo e chacoalhando uma merda chata enquanto canta, muito mal, uma canção para você. Mesmo assim você sorri, pois a droga já está em você.

Essa é minha filosofia.

Eu estou pensando nisso porque eu e Jk fingimos que nada daquelas coisas aconteceram no carro ou em qualquer lugar. Ele disse que tudo está ótimo e fez sinal de ok com os dedos. Queria poder dizer que esse gesto pode ser ambíguo, mas não quero foder mais as coisas.

Ademais, essa coisa tem estado na minha cabeça desde anos atrás e eu acredito nisso, de algum modo. Ultimamente essa droga está me fazendo querer viver e eu não gosto do rumo das coisas. Eu tinha dito que o fato de vir à França já é um sinal de que minha vida melhorou. Eu não estou achando isso. Às vezes conseguir as coisas de mão beijada é um ó.

— Ali, vamos sentar ali — Jk aponta à uma das inúmeras mesas desse restaurante sofisticado. Eu pensei que iríamos comer numa lanchonetezinha de bairro, caso contrário eu teria me vestido melhor e dado um jeito nessa cara de pão amassado.

Faço o que ele pede, como sempre. Ele traduz o menu para mim e fico feliz por ser tão legal assim.

Estávamos brigando há pouco tempo, então imaginei que ele fosse falar "se vire aí" ou algo do tipo. Eu faço meu pedido, mesmo estando bêbado de sono. Nem sei se vou estar acordado quando a comida chegar.

— Mal passada, no ponto ou bem passada? — Jk traduz o que o garçom acaba de me perguntar. Do que estamos falando mesmo? Ah, da carne.

Queimada — respondo em francês. Jk me chuta debaixo da mesa e o garçom tenta esconder o sorrisinho. Eu gosto da pronúncia dessa palavra, ele deveria respeitar meus gostos.

Bem passada, por favor — Jk corrige minha resposta. Sei disso porque eu gravei todas as palavras ditas por ele anteriormente. — Ficou idiota de repente?

— Desde quando eu deixei de ser? — dou língua para ele e peço água ao garçom.

— Vê se cresce, bobão — ele me dá outro chute, só que dessa vez é cem vezes mais fraco. — E seu francês está enferrujado demais.

— Vou nem falar do seu coreano quando nos conhecemos — vou logo largando na lata, não estou com paciência para as críticas dele. Nunca misturem fome com sono. E eu preferiria dormir a estar comendo aqui. Uma hora de sono foi-se pelos ares.

— Não vem ao caso — ele empina o nariz. Que cheio de si! Ele está me irritando agora. Quando é que ele não me irritou?

— Vamos acordar cedo amanhã? — indago. Desculpa se o que mais quero é dormir até o sol nascer quadrado.

— Sim, se quisermos comer no hotel — ele respira fundo. O garçom acaba de trazer água gelada. — Trate de acordar comigo.

Querido, eu estou é feliz em dormir contigo....

Café et Cigarettes • JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora