Acampamento de César. Sentinelas a postos.
PRIMEIRO SOLDADO — Dentro de uma hora, se não nos renderem, será preciso que nos recolhamos para o corpo da guarda. Há claridade; às duas horas da manhã, disseram, será iniciada a pugna.
SEGUNDO SOLDADO — O dia de ontem foi para nós terrível.
(Entra Enobarbo.)
ENOBARBO — Noite, serve-me de testemunha!
TERCEIRO SOLDADO — Quem será esse homem?
SEGUNDO SOLDADO — Ficai perto e escutai.
ENOBARBO — Ó lua santa, quando em futuro forem relembrados com memória odiosa os desertores, testemunha me sejas de que em tua face o pobre Enobarbo se arrepende.
PRIMEIRO SOLDADO — Enobarbo!
TERCEIRO SOLDADO — Silêncio! Ouçamos mais.
ENOBARBO — Ó grande soberana das tristezas verdadeiras, em mim despeja todos os vapores pestíferos da noite, porque a vida, já agora divorciada de meu querer, em mim não mais se prenda. Joga meu coração de encontro à rocha e à dureza de minha grande falta, que, ressecado estando de tristeza, vai transformar-se em pó, dando remate, desta arte, aos pensamentos vergonhosos. Ó Antônio — mais nobre és do que vilíssima foi minha deserção — possas em tua alma perdoar o que te fiz e, após, que o mundo me inscreva em seu registo como trânsfuga e ingrato ao próprio dono. Oh Antônio, Antônio! (Morre.)
SEGUNDO SOLDADO — Vamos falar-lhe.
PRIMEIRO SOLDADO — Não; fiquemos quietos. A César pode interessar tudo isso.
TERCEIRO SOLDADO — Bem; que seja. Parece estar dormindo.
PRIMEIRO SOLDADO — Ou melhor, desmaiou, pois ninguém reza dessa maneira, quando vai deitar-se.
SEGUNDO SOLDADO — Vamos chamá-lo.
TERCEIRO SOLDADO — Olá, senhor, falai-nos! Meu senhor, acordai!
SEGUNDO SOLDADO — Estais ouvindo?
PRIMEIRO SOLDADO — A mão da morte já baixou sobre ele. (Tambor ao longe.) Ouvi! O rufo dos tambores deixa despertos os que dormem. Tranportemo-lo para o corpo da guarda. É gente fina. Já passou nosso quarto.
TERCEIRO SOLDADO — Vamos, ainda pode voltar a si.
(Saem carregando o corpo.)