Cena 8

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Junto aos muros de Alexandria. Fanfarra. Entra Antônio, em marcha militar, seguido de Escaro e de soldados.

ANTÔNIO — Forçamo-lo a acolher-se ao próprio campo. Vá alguém na frente para nossos feitos anunciar à rainha. Amanhã cedo, antes de o sol nos ver, derramaremos o sangue que deixou de correr hoje. A todos agradeço. Valorosos vos mostrardes, lutando não apenas como se a causa de outrem defendêsseis, mas cada um, tal como eu, a causa própria. Outros tantos Heitores parecíeis. Entrai um pouco na cidade, vossas esposas abraçai, vossos amigos. Contai-lhes vossos feitos. Ledas lágrimas vos limparão de coágulos as chagas, beijos farão sarar os nobres talhos. (A Escaro.) Dá-me a mão. (Entra Cleópatra, com séquito.) A esta fada extraordinária recomendo teus feitos. Recompensem-te seus agradecimentos. Luz do mundo, em teus braços aperta-me o pescoço. Salta-me ao coração com todos esses adornos, através desta couraça, e lá te embala no pular glorioso.

CLEÓPATRA — Rei dos reis, heroísmo sem limites, sorridente escapaste da cilada gigantesca do mundo?

ANTÔNIO — Meu querido rouxinol, para a cama os expulsamos. Então, menina, embora uns fios brancos já se mostrem no meio dos castanhos, cérebro temos que alimenta os nervos e com os moços disputa a primazia. Contempla este guerreiro; aos lábios dele concede tua mão. Beija-a, meu bravo. Hoje ele combateu como se um deus, por ódio à humanidade, lhe tivesse tomado a forma para dizimá-los.

CLEÓPATRA — Vou dar-te, amigo, uma armadura de ouro; pertenceu a um monarca.

ANTÔNIO — Ele a merece, embora de rubis fosse ela cheia, como o sagrado carro do alto Febo. Dá-le tua mão; faze uma bela marcha por toda Alexandria, carregando nossos escudos de tão grandes brechas, como seus próprios donos. Se pudesse nosso grande palácio abrigar todos os seus soldados, juntos cearíamos e brinde levantaríamos ao dia de amanhã, que perigo régio apresta. Trombeteiros, com vosso som metálico ensurdecei o ouvido da cidade, de mistura com o rufo dos tambores, para que o céu e a terra soem juntos e nossa marcha aplaudam.

(Saem.)

Antônio e Cleópatra (1607)Onde histórias criam vida. Descubra agora