Capitulo 4

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Max ergueu as sobrancelhas.

— Como assim, ela falou com você? — interrogou ele, com uma cara impagável de descrença.

Não era exagero dizer que Max era a pessoa mais expressiva que Miguel conhecia, exagero mesmo eram as caretas que ele fazia por motivos instáveis. Seu nariz era redondo como uma bolha de chiclete, que parecia prestes a estourar quando franzia o rosto inteiro daquele jeito. Max tinha lábios rechonchudos e pálidos, em contraste com o sorriso amarelo por conta do vício em café. Em sua larga cabeça, tão redonda quanto a ponta do nariz, Max comportava um volumoso cabelo ondulado, castanho-claro, assim como a fina pelagem que crescia entre o nariz e a boca.

Miguel interrompeu as marteladas e se virou para Max, que tinha um bigode de achocolatado.

— Como eu te disse, cara, eu caí e ela me ajudou.

Miguel tinha a impressão de que sua voz ficava mais grave dentro da garagem na casa de Max. Talvez por conta das paredes altas em um curto espaço, criando algum tipo de ilusão do que seria sua voz dali a alguns anos.

Max o encarava do outro lado da mesa de madeira, onde descansava o pneu torto da bicicleta. O aro tinha uma onda que desalinhava os raios do disco de freio. Eles tentavam salvar o pneu, mas Miguel sabia bem como aquilo  iria acabar.

— Você é um péssimo contador de histórias. – disse Max. – Não vem me dizer que conseguiu dobrar esse pneu com uma simples queda.

Miguel revirou os olhos. Sabia bem o que Max queria que ele contasse: Os mínimos detalhes.

— Eu bati na lixeira em frente a casa dela, rolei pela grama e ela se ajoelhou ao meu lado para perguntar se eu estava bem. — disse Miguel, pelo que acreditava ser a milésima vez.

— E depois?

— Depois eu disse que sim, estava bem. — explicou Miguel — Levantei a bicicleta, agradeci pela preocupação e vim caminhando até aqui.

E também não olhei para trás, ele pensou, porque podia sentir o peso do olhar de Z em minhas costas. Se olhasse para trás, estava certo de que encontraria Z e o loiro engomadinho, rindo dele como se Miguel fosse uma piada ruim.

Mantenha os olhos na estrada. Disse a si mesmo.

— E onde estava o pai dela? — Perguntou Max, puxando Miguel de um devaneio.

— Você escutou o que eu disse? Ele não é importante nessa história, cara!

— Você quem não está escutando. — retrucou Max — Onde estava o pai de Z quando ela falou com você?

— Não sei, Max! — Miguel deu de ombros. — Acho que não estava em casa. Ele teria escutado o barulho das latas de lixo e sairia pra me chamar de idiota.

— E então? — sugeriu Max, mas ao notar que a fala foi  vaga demais, completou: — Por que não a beijou?

Miguel fez uma cara que dizia "não é óbvio?".

— Além do fato de eu estar coberto de lixo? — disse Miguel, notando que Max não aceitou aquilo como resposta. Miguel suspirou. — Ela estava com um cara.

— O quê? — Max parecia tão indignado quanto se Miguel tivesse lhe contado o desfecho de Game of thrones. — Que cara?

— Eu não sei — disse Miguel, deixando o martelo escorregar para cima da mesa. — Ele deve ser novo por aqui. Acho que seu nome era algo como Sam ou Samir...

— Gente nova na vizinhança? — balbuciou Max. Depois acrescentou, como se uma lâmpada surgisse em cima de sua cabeça: — Oh, não. Os moradores do 218.

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