Capítulo 25

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O fim de tarde deitou sobre o bosque apenas quando terminaram de discutir o plano. Os últimos raios de sol transformaram o azul do céu em laranja e as sombras das árvores se alongaram sobre a clareira.

Z ficou em silêncio nos últimos minutos da discussão sobre o plano que entraria em execução no dia seguinte; quando Max e Miguel não tinham mais detalhes a discutir, ela se levantou e caminhou até a beirada da clareira, onde podia ver a queda d'água do Rio Taciturno.

Eu gosto de altura, Miguel lembrou de escutá-la dizer quando estavam no topo das arquibancadas. Agora Z sentava próximo a pedra pontiaguda de onde Max afirmou que Samantha Valle pulou e só Deus sabia de onde ele tinha arrancado aquela informação.

Max se aproximou arrastando os pés.

— Não acha que ela vai pular dali, acha? — disse ele.
Miguel ficou ligeiramente perturbado com a ideia de tirar os olhos de Z por um momento e ao olhar outra vez não haveria mais ninguém. Uma brisa fria subia do Taciturno, levantando as mechas ruivas do cabelo dela; erguia também a fumaça que subia de seus lábios e se desfazia contra o céu crepuscular.

— Não, Max, ela não vai. — disse Miguel, um tanto inseguro. Depois acrescentou com a voz falha: — Eu espero que não.

— Melhor ir lá ver o que se passa, dizer para ela sair da beirada.

— Ela parece estar bem. — disse Miguel, mais para convencer a si mesmo do que a Max.

— Ainda assim, deve ir lá e dizer qualquer coisa. — retrucou Max.

— Por quê?

— Você faz perguntas idiotas. Eu sei e você sabe que quer ter um momento a sós com ela, que não seja pra falar do Sant. Agora é a hora perfeita para isso.

— Talvez esteja certo, mas eu não sei bem o que dizer para ela. — disse Miguel, enfiando as mãos ociosas nos bolsos da calça. Estava tão entretido com a ideia de conversar com Z, que mal notou a dor nos dedos que roçavam contra o jeans. — E se eu não tiver nada de bom a dizer?

— Eu confio em você — disse Max, dando dois tapinhas no ombro de Miguel. — Vai lá cara, aproveita esse momento, ela está aqui, o céu está lindo.

— Você não se importa de ficar aí sozinho?

— Você tá brincando comigo? — disse Max em um gritinho furioso. — Vai logo lá, porra, eu estou bem. Não me faz mudar de ideia e dizer um "está tarde, vamos embora".

Miguel assentiu e foi até Z. À medida que se aproximava da beirada, o chão ficava cada vez mais pedregoso, o cheiro amadeirado das árvores antigas se entrelaçava ao cheiro do rio quando a brisa se erguia sobre a clareira.

Ao contrário de Z, Miguel não gostava de altura. Quando chegou na beirada, sentiu um formigamento na barriga. Ainda assim, ele engoliu todo aquele embrulho e sentou ao lado de Z, que não precisou olhar para o lado para ver quem estava lhe fazendo companhia.

Ela ergueu um sorriso de canto; deveria ter imaginado que Miguel sentaria ali, mais cedo ou mais tarde.

— Esse lugar é mágico — disse ela.

Ele olhou para baixo apesar do receio, encarando as águas, que refletiam luzes douradas do pôr do sol. O Rio Taciturno surgia deslizando por entre as pedras que formavam a barreira sobre a qual Z e Miguel estavam. Ele se perguntou outra vez de onde aquela água vinha, se o rio corria debaixo de onde estavam, se o rio corria debaixo da cidade inteira, mas aqueles pensamentos desapareceram quando Z voltou a falar.

— Como é mesmo o nome que você e Max deram? — perguntou ela.

— Zona M — disse ele, tirando os olhos da queda d'água. — Por conta das nossas iniciais.

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