Não bata portas

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-SARA! SARA! ME AJUDA!

Me assustei com os gritos da Thais, mas ver a Luiza entrando pela porta carregada por alguém que eu nunca tinha visto na minha vida foi pior. Ela não tinha sangue, mas ao mesmo tempo dava pra ver que não foi uma simples queda.

-Luiza, você precisa abrir a porta.

-amor, por favor, eu juro que não vou brigar. Eu prometo. [T]

-Luiza pelo amor de Deus!

Eu não conseguia me acalmar, e eu sei que não deveria gritar, mas eu precisava entender o que tinha acontecido.

-Sara, por favor sai de casa. Vai pensar, fumar seu cigarro. Qualquer coisa. Só some daqui

- Isso é serio?

-Claro que é, Sara! Você tá gritando com a Luiza pela porta do banheiro, o que deu em você cara? Desde quando a gente grita uma com a outra nessa casa? Já não basta essa droga toda que está acontecendo? O que mais você quer?

-a Luiza precisa parar de bater portas e achar que isso resolve alguma coisa Thais!

-Gritar com ela resolve menos ainda! Sai daqui, eu estou te pedindo!

- você que sabe, Thais!

-Nem pensa em usar o carro!

- Inferno!


[Thais]

-Lu, amor. Vem, abre.

A Luiza não saiu, mas me deixou entrar.

-A Sara está preocupada, eu também.
-Não aconteceu nada, eu só cai.
- Você tem certeza?
-Tá, eu acabei batendo em um carro.
-Amor, você tem que respeitar a ordem das coisas. Carros batem em ciclistas, não ciclistas em carros.
- você está mesmo tirando onda?
- Imagina, eu respeito sua autoestima em achar que você é grandona ao ponto de sair atropelando carros.
-Para de rir, tá doendo.
-Vem aqui vai! Meu pequeno carro bravo!


Eu não precisava perguntar como tinha acontecido, porque eu sabia. Sabia que a chegada do sétimo mês estava deixando todas nós fora do eixo, mas sabia principalmente que a Luiza estava cada dia mais distraída, que ela não conseguia trabalhar há semanas, e que estava esbravejando toda sua raiva nessas saídas noturnas pra pedalar.


-Lu, a gente precisa conversar.

- não faz isso...

- Amor, por favor. Sou eu, a sua esposa. A que você conquistou com uma única palavra, quem prova todas as suas receitas favoritas, separa as balas rosas das verdes porque são as suas favoritas...

- tá, a gente pode.

- me dá um cheirinho primeiro, quero sentir o cheiro bom desse cabelo.

- o cabelo é da Sara, vou contar pra ela

-ela vai deixar, eu compro ela com torta de limão

-e eu?

- e você também amor, a gente faz tortas e pudim

- amanha?

-amanha, amor. Vem aqui.


Acolhi minha Luiza bem pertinho do meu peito, ficamos deitadas em silencio enquanto eu fazia carinho no cabelo mais lindo daquela casa. Luiza sempre carregou o mundo nas costas, mas eu sempre soube a hora de pedir que ela baixasse a guarda, porque ela também precisa ser cuidada as vezes. E apesar dessa agilidade toda em resolver tudo de todos a todo tempo, também existe uma Luiza que é só uma garotinha apaixonada por pudim e carinhos no cabelo.


- a Sara ta brava comigo?

- não amor, ela só ficou preocupada. E um pouco chateada

- porque eu bati a porta, né?

-sim, você sabe que ela não gosta.

- desculpa, eu não controlo isso.

- a gente sabe, mas isso não faz ser menos, ela ainda sente. Ela acha que você não confia que a gente vai te entender quando você se tranca assim.

- mas não é isso. Eu só não quero descontar logo em vocês.

- mas a gente é casada com você, isso não é sobre descontar. Mas sobre deixar a gente carregar um pouco do peso junto com você.

- a gente pode ligar pra ela, ver onde ela tá?

- pode, mas não pede pra ela voltar. Deixa ela decidir isso no tempo dela.

- não pode nem falar que vamos fazer tortas?

- Luiza...

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