"Quem é guerra quer paz
Vocês querem músicas sobre armas
Escrevo sobre traumas
Pra ouvidos que têm almas"(Lord)
LUCAS NARRANDO
As semanas seguintes se passaram em uma pilha sinistra.
Algo que sempre fui desde que entrei para essa vida é tranquilo. Não tenho porquê comprar briga com ninguém, e se depender de eu mexer com algo de não é meu, ou provocar um confronto desnecessário, eu nunca vou entrar em conflito com ninguém. Só que quando mexem com o que é meu, a coisa muda completamente de figura.
O sumiço das cargas permaneceu na minha cabeça por todos esses dias, mas a diferença é que agora eu sei quem foi o comédia que armou essa kaôzada toda. Já desconfiava desde o início que era PL, o famoso chefe da Penha. Esse cara foi o único que ficou de onda comigo quando assumi o morro assim que Lobão foi preso. Já sabia que o cara era chato há anos, e Lobão fez questão de ressaltar isso mais algumas dezenas de vezes.Minha relação com Lobão é o que tem mais me assombrado ao longo da semana. Assim como tudo o que acontece lá dentro, bateram pra mim que ele está com tuberculose e está mal pra caralho. Não é dúvida para ninguém que não tem o menor interesse da parte dos policiais, ou os dirigentes do presídio em fornecer um atendimento descente para um cara como ele. Lobão era um dos traficantes mais procurados do país, e agora que colocaram as mãos nele, querem mais é que morra lá dentro.
Assim que ponho os pés para fora do meu barraco, o Sol bate no meu rosto. Depois de quase 24 anos, não sei como me surpreendo com a capacidade dessa cidade fazer calor às 8 da manhã.
Quando chego na boca sento a mesa e começo a organizar os bagulhos da invasão que deve acontecer essa semana. Não tenho como engolir o mão leve do PL. Se eu deixar passar batido vai virar bagunça, e está na hora de ele saber que ele pode ser peixe criado, mas eu estou me criando e não vou abaixar a cabeça para nenhum filho da puta.
Não demora muito e GB entra na sala se jogando no sofá.
— Qual foi?! — Ele fala assim que senta.
— Fala tú, meu parceiro. — Cumprimento.
— E Lobão? Tá sabendo mais alguma coisa? — GB indaga.
— Nada! — Respondo preocupado, porque embora o cara não tenha seguido o trilho certo, eu tive convivência com a pessoa, e ele me ajudou pra caralho.
— Aqui, mano, vim falar que Milena me mandou mensagem agora pedindo pra te mandar recado. Ela quer falar com você, e está perguntando quando você pode, porque o assunto é sério.
— Que assunto sério? — Por mais atolado que eu esteja, ainda sou um cara curioso.
— Só falou que é sério.
— Sei lá, tem que ver. Estou com coisa até a cabeça com essa missão.
— Já é, vou avisar aqui. — Digita no celular e permanece ali calado.
Pouco tempo depois ele se dirige a mim de novo.
— Ela falou que é muito sério e não pode esperar. Que ela vem aqui se você quiser. — Leu as mensagens me fazendo coçar a nuca.
Eu, GB, Milena, Maurício passamos a infância juntos. A gente brincava na rua, estávamos sempre juntos, mas desde que entrei na boca nos afastamos, ainda mais quando Maurício meteu o pé.
— Vai vir aqui porra nenhuma. Ela sabe que isso aqui não é lugar pra ela e tia Maria vai pistolar comigo quando souber. Fala que passo lá à noite. — Quero saber é o que Milena tem de tão sério para falar à ponto de querer vir aqui...
Passo o resto do dia resolvendo os pepinos. Está decidido! Quinta, também conhecida como depois de amanhã, a bala vai comer na Penha. Uma coisa é certa: não saio de lá sem o que é meu.
Fiquei surpreso quando descobri que Paulinho era o X9. Moleque era bom, chegou aqui pedindo umas cargas pra vender para ajudar a mãe em casa, fiquei com pena, dei a oportunidade, ficou um tempo nessa e traiu minha confiança. Sinto pela família, mas a lei do morro é a lei do morro.
Já são quase oito da noite quando meto o pé, confiro se os soldados estão na atividade, já que não estão ganhando pra ficarem parados.
— Quero ver essa porra faturando hein... Atividade. — Falo antes de ir pra minha moto.
Quando me aproximo ainda mais o radinho toca: "LC, BN aqui. Estamos com Paulinho no Galpão."
"Marca 10 que chego aí." — Respondo.Subo na moto e vou. Chegando lá o traidor está amarrado e sabe que está fodido. Pelo jeito, já deram uma coça nele, assim como eu mandei.
— Deu mole, Paulinho... — Digo assim que entro. — Foi na boca, pediu a carga, te dei pra ajudar, aí você dá um vacilo desses mermão?!
— Porra, LC. Foi mal, cara! Não me mata, pela minha mãe. Faço o que você quiser.
— Não tem essa, Paulinho, tu que escolheu. Vacilão não tem perdão e você sabe disso. Pensasse antes... TH, larga o dedo. — Ordeno.
Toda vez que algo do tipo acontece eu fico bolado. Não gosto disso.
Eu entrei nessa como um cara sozinho, sei que não tenho ninguém para chorar a minha morte por consequência das minhas escolhas, por isso não tenho medo de bater de frente com nada. O moleque era novo, a mãe vai chorar a perda, mas ele entrou sabendo onde estava se metendo. Não tem essa de passar pano.
Vou logo para a casa da Milena ver que porra de assunto sério é esse. Quando chego bato na porta e tia Maria atende.
— Oi, meu filho, como você está?
— Estou de boa, só meio pilhado com uns assuntos aí. E a senhora?
— Meio preocupada, mas nada demais.
— O que está rolando? Primeiro Milena com essa de assunto sério e agora a senhora preocupada? Sabe que se tiver precisando de qualquer coisa é só falar, né?
— Sei! A Milena e a amiga estão lá encima te esperando. — Amiga? Que porra de amiga?
— Já é. Vou lá.
Subo as escadas, e vou até o quanto de Milena, encontrando a porta aberta. Lá dentro dou de cara com a Milena e... a loirinha que levei lá para casa. Milena tem o semblante sério e a loirinha está ainda mais branca do que me lembrava.
— Qual foi? — Digo quando entro no cômodo. — O que está pegando?
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Não esqueçam do voto ☆
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Herdeiro Do Crime
RomanceEfeito borboleta - variações muito pequenas podem parecer insignificantes, mas gerarão enormes mudanças ao longo do tempo, provocando uma sensação de caos. Uma noite une o destino de Lucas e Eduarda pelo resto de suas vidas. Uma noite de baile. Cami...