EDUARDA
Não sei por que pensei que seria diferente. Não queria uma relação mais próxima que o necessário, mas com certeza foi foda ouvir o monte de coisas que ele cuspiu na minha cara. Parecia que ele estava falando com uma puta qualquer.
Estou na merda! De corpo e alma. Não tenho emprego, não tenho a minha avó, não tenho nem uma casa e, ainda por cima, tenho um filho. Cacete...
A situação que já era ruim o suficiente se tornou ainda pior com essa conversa com Lucas. Mesmo que seja o dono do morro, por mais que fosse tão inesperado pra ele quanto pra mim, eu acredito que seja automático você depositar suas fichas de esperança em alguém que é tão responsável quanto você. Eu não fiz sozinha, mas pelo visto a consequência vai ser toda minha, e isso é algo que sempre me chateou. Olhando de fora a situação de várias mães, isso sempre me indignou. O direito que sempre foi dado aos homens de escolher o que fazer da vida quando se tem um filho, escolher sumir ou assumir, enquanto nós temos que bater no peito e assumir toda a responsabilidade.
Não quero me tornar alguém que só se lamenta e não tira a bunda do sofá para fazer das coisas algo diferente. Se vou seguir com isso, eu preciso correr atrás. Preciso me estabilizar, e vou fazer tudo o que precisar pra isso.
Seco as lágrimas de raiva que escapam dos meus olhos, mesmo que não quisesse estar chorando por isso, quando ouço os passos ecoando pela escada, e logo depois a porta batendo. Não olho para saber quem é, e nem preciso, porque sei que é o doador de esperma indo embora.
— Amiga... — Milena chega perto de mim. Quando permaneço em silêncio ela continua. — Tenta não ficar mal, ele deve mudar de ideia, e se não mudar, quem precisa de homem quando se tem uma amiga braba que nem eu? Quem precisa de homem em qualquer situação na verdade?
— Eu preciso dar um jeito na minha vida com urgência...
— Não diga que você está pensando em... — Ela supõe de maneira sugestiva.
— Não! — Interrompo antes que termine. — Não vou abortar, mas também não posso ficar parada esperando o milagre da mega sena cair no meu colo se eu quiser seguir com isso.
— Vai dar tudo certo! — Me abraça tentando passar alguma tranquilidade.
Quando deito minha cabeça no travesseiro, passa um filme na minha cabeça de tudo até aqui. De como tudo aconteceu, e como vai mudar. Amanhã eu vou atrás de um trabalho e depois vejo o que vou fazer.
✶✶✶
Acordo e faço minhas higienes com o enjoo que chegou sem pedir licença. Quando isso acaba meu Deus?
Após tomar café, pego minhas coisas e vou atrás do meu. Passo em algumas lojinhas do morro mesmo, tentando demonstrar o máximo de interesse, assim faço como as lojas no asfalto, ostentando meu currículo "ensino médio incompleto e sem experiência", além do meu atual estado.
É, não vai ser fácil mesmo...
À tarde já estou exausta de tantos nãos, ou "caso apareça uma vaga te ligo".
LUCAS NARRANDO
Não procurei saber, e nem falei nada para ninguém sobre esse lance da garota estar grávida. Eu nem sei o que vou fazer ainda. Se é que eu vou fazer alguma coisa.
Nada relacionada a futuro nunca esteve estabelecido na minha cabeça, nunca pensei muito à frente, e consequentemente, eu nunca quis ser pai. É no mínimo esquisito pra caralho alguém olhar na minha cara e dizer "LC, você tem um filho". Um filho que nunca quis ou planejei.
Minha única responsabilidade era cuidar da minha própria vida, e agora eu tenho o morro, que é uma puta responsabilidade e uma tensão constante, a ponto de eu esquecer que preciso cuidar de mim às vezes. Como que vou enfiar uma criança na minha lista de responsabilidades?
O que está me deixando pilhado é a conversa com Milena. Ela me conhece uma vida inteira, e sabe muito bem que me pegou em um lugar que pesa pra mim. Eu sei a falta de um pai decente, e deixando essa situação de lado eu estou fazendo isso com outra pessoa. Porém, não é a maior das minhas preocupações.
Minha cabeça agora está 100% ligada à invasão em busca dos meus bagulhos que o vagabundo do PL passou a mão. Ele vai ter o que merece. Será mesmo que ele achou que ficaria por isso mesmo? Haha! Está muito enganado.
GB me passou um radinho há uns 10 minutos falando que já estava tudo no esquema, que as armas e os caras estavam só esperando para brotarmos na Penha e trazer o que é meu de volta.
O caminho até o morro rival não teve muito problema, só os manos que estavam gritando que iriam trazer as cargas de volta e acabar com os caras. Eu fiquei quieto, estava cheio de raiva, não era preciso que dissesse nada, meu rosto transparecia tudo. Quando chegamos mais perto eu passei as orientações.
— Rapaziada, vamos levar o que é nosso de volta, todo mundo já tá ligado nos esquemas. Se tiver que meter bala, mete sem dó. Já que eles são os fodões, eles que aguentem a pressão. — Digo.
— Vamos, porra! — GB falou seguido pelo grito dos outros. É agora.
Pego meu fuzil e a touca que esconde meu rosto saio para fora atirando. Uma sequência de tiros vem logo atrás enquanto eu e a tropa subimos.
Geralmente essas invasões acontecem de madrugada. Eu pelo menos prefiro que seja assim. O que se espera é que os inocentes estejam dentro de casa e não precisem sofrer as consequências das merdas que PL faz.
Depois de 20 minutos de troca intensa de tiros e alguns aliados serem atingidos, assim como os inimigos, chegamos à boca. Entrei na salinha já com o rosto exposto, e DG já estava com a arma na cabeça do BN, o sub dono da Penha.
— Não estou aqui pra palhaçada. — Meu tom é ríspido ao ficar cara a cara com o comédia. — Cadê a porra do meu bagulho?
— Ei, ei, ei. Abaixa sua bolinha aí novato. — O cara pra querer gozar da minha cara com uma arma na cabeça tem que ser corajoso. — Chegou agora no movimento e tá achando que vai meter marra no morro dos outros?
— Eu vim buscar o que é meu e não vou sair daqui sem essa porra. — Me imponho. — Esses soldados de merda já estão deitados, quer perder mais o quê? Quer fazer companhia a eles? Você já está fodido aí, otário, é só apertar o gatilho que você vai pra vala.
— Então aperta, caralho, não vou te entregar nada de mão beijada, não. Morro, mas morro honrando essa porra.
Aceno com a cabeça e DG entende o recado.
Ele não vai falar nada, claro que não.
— Vamos achar essa merda, e o PL também que meu papo é com ele. — Falo para os meninos após ouvir o disparo.
Pouco tempo depois encontramos um galpão, e minhas cargas estavam lá, também o que não era, mas ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão.
O comédia do PL evaporou, mas a hora dele vai chegar.
Matemos pé de volta para a Rocinha, comemorei um tempo e fui embora dormir antes de resolver o problema dos que se foram.
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Não esqueçam do voto ☆
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Herdeiro Do Crime
RomanceEfeito borboleta - variações muito pequenas podem parecer insignificantes, mas gerarão enormes mudanças ao longo do tempo, provocando uma sensação de caos. Uma noite une o destino de Lucas e Eduarda pelo resto de suas vidas. Uma noite de baile. Cami...