Capítulo X

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SHIN RYUJIN.

Quando eu me descobri trans, foi à seis anos atrás. Eu havia acabado de me tornar CEO da empresa da família, sucedendo o meu pai. Foi poucos dias depois do meu aniversário de vinte anos.

Desde criança, eu gostava de usar os vestidos da minha mãe escondido. De madrugada, eu entrava no quarto dos meus pais, tentando fazer o mínimo barulho possível para não os acordar, e eu invadia o closet dos dois para utilizar as roupas e a maquilhagem da mamãe. Eu me sentia confortável naquelas roupas.

Após a morte dela, eu consegui pegar todas as roupas dela e escondi-as, para que Kwanghee não as deitasse fora. Continuei a usá-las, até que um dia, Hyori me apanhou vestindo-as. Mas ao invés de me repreender, ela apenas sorriu e perguntou se eu não queria experimentar algumas roupas dela. Eu sempre senti que Hyori sabia sobre a minha transexualidade antes de eu mesma saber.

Enfim, voltando. Dias depois do meu aniversário, decidi voltar a utilizar as roupas da mamãe. Coloquei o vestido predileto dela e decidi caminhar por aí, já que nem Kwanghee e nem Hyori estavam em casa.

Caminhei pela casa naquele vestido, até ouvir uma funcionária nova me chamar pelos pronomes femininos. Ela provavelmente achava que eu era Hyori, porque ela me chamou de senhorita Shin. Senhorita! Com um "A" no final!

Eu juro, nunca me senti tão feliz ao ser "confundida" com uma mulher. Os meus cabelos estavam na altura do ombro, então foi mais fácil para a funcionária se enganar. Eu nem fiz questão de a corrigir, eu simplesmente estava tão eufórica que esqueci de a responder e saí correndo em direção ao meu quarto.

Me olhei no espelho e sorri com o que vi. E naquele momento eu percebi: Eu era uma mulher.

Pesquisei sobre o assunto mais a fundo, e percebi que eu realmente me identificava com aquilo. Nunca me senti tão feliz na minha vida. Porém, eu tinha medo da reação das pessoas ao descobrirem. E se elas não me aceitassem? E se elas reagissem mal?

Eu agora era uma CEO. Eu tinha uma reputação a manter.

Eu havia acabado de completar vinte anos. E para ser honesta, naquela altura e naquele momento, eu estava verdadeiramente assustada.

Mas não tanto como agora.

Chaeryeong olhava para mim com uma feição incrédula, provavelmente tentando assimilar o que eu havia acabado de dizer.

Aquele silêncio era ensurdecedor e estava me matando.

Por favor, diga alguma coisa... Sussurrei, cabisbaixa. Minha perna tremia involuntariamente e eu só queria chorar.

Eu... Chaeryeong começou. Eu não sei o que dizer.

Pelo tom de voz, eu sabia que ela estava decepcionada. Agora, com o quê? Comigo? Muito provavelmente.

Ryujin, você... Você tem noção do peso das suas palavras naquele dia? Sua voz estava embargada. Do quanto ouvir aquilo de você doeu?

Chaeryeong...

Eu cheguei ao ponto de não conseguir comer! Eu não conseguia olhar para a nossa filha sem me lembrar de você, porque ela é a sua cara! Fechei o punho com força ao ouvir Chaeryeong soluçar. Porquê você fez aquilo?! Porquê?! E só de saber que, anos depois, você teve uma filha com outra pessoa, depois de esfregar na minha cara que você era estéril!

Permaneci em silêncio, sentindo as lágrimas molharem as minhas bochechas. Abri os olhos, e senti vontade de me estapear quando vi a mágoa nos olhos dela.

O meu pai... Comecei, a minha voz trêmula. Kwanghee, ele falsificou aquele teste. Eu não sou estéril. E eu só descobri isso quando Yeji engravidou. E eu juro que, a partir daquele dia, eu não parava de pensar em você, em Yeoreum, e eu me sentia culpada por ter te abandonado mesmo que eu não soubesse que aquele teste era falso. E eu queria tanto, mas tanto ir atrás de você, mas eu sabia que você não ia me reconhecer porque eu não era mais o Jaehyun que você conhecia e amava. Ou odiava, sei lá. Eu... Engoli a seco. Eu sei que o que eu vou dizer agora não vai alterar absolutamente nada do que eu fiz, mas... Eu peço desculpas. Por ter dito o que eu disse, por ter feito o que eu fiz, e... Por não ter ficado do seu lado. Eu fui uma idiota. Ri nasalado, limpando as lágrimas em meu rosto.

Chaeryeong permanecia apática, olhando para um cantinho qualquer da cozinha. De repente, ela se levantou e fez menção de sair.

Chaeryeong...

Eu preciso de um tempo para pensar. Ela me olhou, os olhos encharcados pelas lágrimas que insistiam em sair. Isso é muita coisa para processar, e eu... Eu só preciso de uma tempo.

E sem dizer mais nada, ela saiu da cozinha.

DUAS SEMANAS
DEPOIS.

Chaeryeong não veio mais trabalhar depois daquele dia. Ela não se demitiu, ela simplesmente não aparecia mais.

Durante esse tempo, tive que deixar Yuna com Hyori, porque Joohyun estava de férias e obviamente eu não deixaria uma criança de cinco anos sozinha naquela casa.

Então, durante essas semanas, era só eu naquela casa. Eu apenas me afogava no trabalho, saía de casa às cinco da manhã para depois voltar às dez da noite. Eu não tinha uma boa noite de sono há um bom tempo.

Me rendi às seduções de minha secretária e transei com ela. Foi meio estúpido, eu sei. E para piorar, enquanto eu fazia sexo com Jihyo, eu pensava em Chaeryeong.

Após o sexo, me senti imediatamente culpada por tê-lo feito, então eu apenas me levantei, vesti as minhas roupas e saí, ignorando os chamados da minha secretária. No dia seguinte, fiz questão de esclarecer as coisas com ela, e por pura sorte, Jihyo aceitou bem.

Depois desse dia, eu e Jihyo mantivemos uma relação estritamente profissional.

Enfim, nesse exato momento, estou assinando alguns papéis na minha mesa quando de repente, recebo uma chamada no telefone da empresa.

Nayeon? Atendi, franzindo o cenho.Achei que já tinha ido embora.

É, eu estava prestes a sair quando apareceu aqui uma garota querendo falar com você.

E quem é? Arqueei a sobrancelha.Sabe que eu não deixo ninguém subir sem a identificação da pessoa, certo?

Assim, ela não me disse o nome, mas ela me disse uma alcunha que você "reconheceria facilmente".

E que alcunha é essa?

Ruivinha. Chaeryeong...

Deixe ela subir. Desliguei, sentindo a ansiedade me corromper. Será que ela viria aqui para se demitir? Será que ela viria aqui para me perdoar?

Poucos minutos depois, ouvi alguém bater na porta. Sussurrei um "Entre", me sentindo completamente nervosa.

E então ela entrou.

Chaeryeong não tinha mais os cabelos pretos, agora eles estavam num tom castanho-claro, muito provavelmente a cor natural do cabelo dela. Seus óculos não estavam mais ali, e o seu rosto estava livre de maquiagem. De roupa, ela utilizava um moletom cinza e uma calça jeans preta, e nos pés, ela tinha um simples tênis preto. Ela estava absurdamente linda, entretanto.

Me levantei da cadeira, engolindo seco ao ver a feição neutra dela.

Precisamos conversar, Ryujin.

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