Capítulo três- Um passo para a morte

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Palavras machucam e quem as ouve, nunca esquece.

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Vender?

Mordi meu lábio inferior com força e tentei acalmar minha raiva que crescia em meu peito. Eu não devia ficar surpresa, aquela fêmea desejou que eu estivesse morta, vender sua cria não devia ser algo tão ruim assim não era mesmo? Finalmente ela estava se livrando daquele empecilho, eu.

Mas não queria ser vendida, não permitiria que tal injustiça fosse realizada comigo! Neste caso, a única alternativa era fugir dessa casa antes de ser leiloada ao comprador. Sobreviver nessa floresta com minha idade era quase suicídio, mas que escolha eu tinha? Uma era ser vendida e a outra era tentar viver na maldita casa dos monstros. Prefiro a segunda opção, não sou mercadoria e daria um jeito de não morrer na floresta. Até esse momento eu aprendi sobre frutas comestíveis e venenosas, sobre rastrear pegadas de animais carnívoros e herbívoros... Certamente viver no meio daquele lugar não era recomendável, mas ainda possível.

Fiz uma lista mental do que precisava levar, o que não seria muito, pois como esse corpo era pequeno, havia um limite de peso que poderia carregar, mesmo sendo uma férica.

- Duas panelas para cozinhar

- Panos para me cobrir

- Facas

- Cantil

- Roupas

- Barraca

Devo reunir tudo para fugir amanhã, sem deixar nenhum rastro ou desconfiança.


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Não foi difícil reunir os objetivos da lista e os esconder em um tronco oco de uma árvore que ficava perto da minha casa. Não tinha sido difícil olhar para cada compartimento daquele lugar e esperar existir alguma hesitação. Meus pais não tinham nenhum amor por mim, se existiu carinho em algum momento, pode ter sido antes de olharem em meus olhos e perceberem o vermelho vivo que minhas íris eram. Minha mãe mesmo disse, que eu era o monstro que havia devorado sua cria e tomado seu lugar na barriga.

Não sentia desgosto por estar partindo, talvez fosse algo inevitável e uma hora ou outra isso acabaria acontecendo... Só não esperava que fosse tão cedo.

Em meus plenos cinco anos de idade desta vida, precisei decidir entre ser escrava ou correr para uma possível morte. Nenhum dos dois eram uma escolha reconfortante, mas ao escolher a segunda opção, eu ainda continuava a pertencer a mim mesma e a ninguém mais.

Antes que os céus se escurecessem por completo, fugi de casa pela janela e recolhi minha bagagem antes de ir. Lancei um último olhar por trás do ombro, observando aquela residência se afastar cada vez mais. Eu não chamaria aquele lugar de lar, mas foi ali que eu nasci. Havia deixado um bilhete na minha cama, agradecendo por terem me dado uma vida. Talvez eles não soubessem exatamente o significado por trás daquelas palavras, mas eu sabia, e era o suficiente.

Amarrei a bagagem no meu corpo, estava pesada e mesmo que tivesse escolhido o mínimo para que não se tornasse um fardo e diminuísse minha agilidade, era inevitável que sentisse aquele peso me puxando para o chão. Eu tinha um corpo de criança, não tinha como negar esse fato, eu era mais forte se comparada a uma criança humana, mas não estava vivendo no mundo moderno ou do outro lado da muralha, estava indo adentrar uma maldita floresta que iria se tornar minha casa, eu tinha que levar aquilo tudo ou morreria.

Corte de sombras e tormentasOnde histórias criam vida. Descubra agora