Bois

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Os companheiros carregados de simbolismo dos homens


     Esta descrição é baseada na narrativa #836 do Arquivo Português de Lendas (APL 836).


     Os Bois, desde há muito companheiros da labuta dos homens na agricultura e no transporte de pessoas e mercadorias e fornecedores das próprias carnes para consumo humano, estão associados à religião cristã. Os trabalhos que estes animais executam e a alimentação dos israelitas de carne bovina são referidos na Bíblia. Este tipo de animais também foi oferecido em sacrifício por mais de uma vez nas histórias bíblicas. Esses sacrifícios, ritualizados como é costume nos atos religiosos, representam os serviços devotos que os sacerdotes devem prestar a Deus. E ainda segundo a visão que Deus deu ao sacerdote Ezequiel, uma das quatro faces dos Querubins (um tipo de espíritos que faz parte da primeira hierarquia dos Anjos) é a de um Boi. Isto porque Jesus Cristo ensinou que os homens devem ser bondosos, tranquilos e humildes no serviço aos outros – tal como os Bois. Não é à toa, portanto, que os Bois figuram em algumas lendas de personagens da mitologia cristã e de fundações de igrejas. É o caso da história da edificação da Igreja do Pergulho.

     Duas aldeias do concelho de Proença-a-Nova disputavam o direito de contarem com uma igreja como parte dos edifícios locais: se os habitantes de Vale de Água queriam que fosse construída na sua terra, os do Pergulho certamente não queriam menos! Rivalidades de aldeias... O mais certo era que a igreja fosse construída no Vale de Água devido a esta terra se situar no meio de várias povoações. Pergunto qual era o sentimento dos habitantes do Pergulho em relação à provável edificação da igreja na aldeia rival!

     Entretanto, andava por aquelas bandas um Boi que não se sabe de onde veio. E a forragem (erva de qualquer qualidade, palha ou grão que serve para alimentar o gado) dos sítios onde ele comia inexplicavelmente crescia muito mais do a dos outros sítios. Como o pasto era escasso naquela zona, todos queriam ser donos do Boi para que fosse comer nas suas propriedades.

     Não sei quando tempo demorou a captura de um animal que veio livre para lá, mas, por fim, um camponês apanhou o Boi. E levou-o a pastar para as margens da Ribeira da Freixada. O Boi então comeu uma alfavaca, uma erva venenosa, que o pôs doente, e caiu ao chão aparentemente morto.

     O camponês foi à povoação dizer que o Boi tinha morrido e pedir a outras pessoas para irem com ele buscar o animal. Arranjou o auxílio que pediu, e ainda levou para as margens da ribeira um tubo que tinha; devia ser um tubo enorme, pois foi em cima dele que o Boi foi posto.

     Estavam aqueles que carregavam o Boi a passar ao pé de uma fonte no Pergulho quando o camponês disse:

     - Se o meu Boi vivesse, eu acarretava a pedra para a igreja.

     Nesse momento, o Boi recuperou os sentidos, e saltou para o chão! E decidiu-se então construir a igreja ao pé da fonte. Presumidamente, o camponês cumpriu a sua promessa.

     Pergunto agora qual foi o sentimento dos habitantes do Pergulho, atualmente chamada Pergulho do Meio, em relação à edificação da igreja na sua terra por indicação divina sob a forma de um Boi! E também pergunto qual foi o sentimento dos habitantes de Vale de Água em relação à edificação da igreja na aldeia rival!



Fonte da imagem: Olhares (site)

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