4 - E Quanto Aos Planos Que Fizemos?

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♪ And I'll be in denial for at least a little while
What about the plans we made? ♪


O dia do lado de fora já havia ido para que a noite pudesse cair. Mesmo com a escuridão em que se encontrava naquele momento, Maria sequer se deu ao trabalho de se levantar do sofá e acender a luz. Enquanto bebericava, sem pressa alguma, o vinho, já pela metade em sua taça, Maria remoía a notícia que havia recebido horas atrás.

"Os resultados da patologia chegaram, a massa que encontramos no seu joelho infelizmente é maligna."

Para alguém que sempre teve facilidade em enxergar o lado bom em tudo, ela já falhava antes mesmo de tentar.

A princípio, a incredulidade tomou conta dela. Se questionava como seria possível acontecer isso com alguém tão jovem. Ela só tem 26. Deveria estar saudável. Por que não estava saudável? Raramente comia besteiras, sempre presou pela boa alimentação, corria todos os dias pela manhã antes de ir para o trabalho e sempre que podia praticava algum esporte.

"Sarcoma sinovial, estágio dois."

E então a ficha caiu. Câncer. A palavra que muitos se recusam a pronunciar. A doença que todos temem mas jamais imaginam que possa acontecer consigo.

Na sala do médico, Maria se manteve quase sem expressão. Foi debruçada sobre o volante de seu carro que ela desabou, chorou como nunca havia chorado antes.

"Vamos marcar a cirurgia para remover o tumor, com sorte ela irá resolver. Mas se não, a quimioterapia será nosso segundo plano."

Maria se encontrava perdida em seus pensamentos, a taça de vinho a essa altura já estava vazia pela segunda vez.

- Maria? - chamou Natasha, estranhando o fato de chegar em casa e encontrar a residência totalmente escura.

- Oi... - ela respondeu baixinho e então Natasha acendeu a luz, se deparando com a esposa sentada no sofá - Como foi na audiência? Venceu o caso?

- A corte entrou em recesso outra vez. - suspirou deixando a bolsa e pasta sobre a mesinha de centro. - Porque tava no escuro? Acabou de chegar?

- Tipo isso. - foi breve e tratou de mudar de assunto - Quer vinho?

- Talvez mais tarde, preciso de um banho primeiro.

Após tirar o casaco, a ruiva finalmente se aproximou para cumprimentar a esposa. Ela apoiou a mão nas costas do sofá e se inclinou para deixar um beijo nos lábios de Maria, mas a morena a puxou pela cintura fazendo com que caísse em cima dela.

- Se continuarmos assim eu vou acabar te arrastando pro banho comigo. - falou Natasha, cessando os beijos. Maria apenas sorriu de lado enquanto, com a ponta do dedo, traçava todas as linhas do rosto da ruiva.

- Você é tão linda!

Natasha sorriu com o elogio, mas algo ainda a incomodava. Maria, apesar de estar bem ali em baixo dela, parecia com a mente em outro lugar, um lugar bem longe.

- Tá tudo bem? Seus pensamentos parecem estar longe.

Maria suspirou. Ela não queria contar a Natasha, não tinha coragem. Tinha medo de que a ruiva a deixasse quando soubesse, ou de que, mesmo que ela ficasse, as coisas não serem mais como antes. Ela não queria ser um peso para a esposa.

Mas por outro lado, ela sabia que Natasha jamais a perdoaria caso ela escondesse algo tão grave.

Encarando os olhos verdes preocupados da esposa, Maria juntou coragem para contar o que estava fazendo seus pensamentos se perderem.

- Eu tenho câncer.

Ela falou sem delongas. Natasha piscou algumas vezes tentando entender se havia ouvido corretamente.

- O-oque? - a ruiva gaguejou

Natasha levantou rapidamente de cima de Maria e sentou-se ao seu lado no sofá. Sua expressão era puro espanto.

- Eu tenho câncer. Estágio dois.

- Maria, se isso for uma das suas brincadeiras, eu vou...

- Infelizmente não é. - ela cortou a ruiva - Sabe que adoro te pregar uma pegadinha às vezes, mas não brincaria com algo assim, é demais até pra mim. - forçou um sorriso tentando amenizar o clima, o que obviamente não deu certo.

Natasha abriu a boca algumas vezes, mas nada saía. Ela se levantou e caminhou em silêncio até a varanda dos fundos. Maria queria, mas não a seguiu. Sabia que assim como ela precisou antes, Natasha precisava de um tempo para assimilar a notícia também.

Romanoff nunca foi do tipo religiosa, mas apesar de não seguir nenhuma religião, acreditava que existia um Deus ou um ser poderoso lá em cima que olhava por todos. Pensar assim lhe trazia um certo conforto às vezes. Mas não dessa vez.

- Não pode ser... - Natasha soluça.

As lágrimas caem pelo seu rosto enquanto sua mente gira em uma mistura de medo e confusão.

- Por que? Por que isso está acontecendo com ela? Ela é tão jovem! - gritou para o céu escuro e ausente de estrelas.

Ela não queria acreditar. Estava com raiva e precisava de alguém para culpar. E deixando ser guiada por essa raiva, Natasha pegou um dos vasos de flores da varanda e o lançou o mais forte que pôde, fazendo-o se espatifar no meio do quintal.

- Como isso é possível? Como Deus pôde deixar que isso acontecesse? - sua voz agora saiu em um sussurro frágil, quase inaudível.

Ela desaba no chão, com as lágrimas escorrendo descontroladamente por seu rosto.

- Se você existe, porque está deixando isso acontecer? O que fizemos para merecer isso? - voltou a gritar para o céu. - Onde está a justiça nisso? Onde está a compaixão?

Natasha continuava a gritar com Deus, o universo e seja lá quem mais estivesse ouvindo naquele momento.

Depois de longos minutos, Maria decidiu intervir. Escutar o choro e os gritos da esposa estava lhe doendo mais do que qualquer outra coisa naquele momento. Na varanda ela encontrou Natasha sentada no chão, abraçando suas pernas enquanto as lágrimas - agora um pouco mais contidas - continuavam a molhar suas bochechas rosadas.

- Eu não quero perder você, Maria. - confessou quando a morena sentou ao seu lado, Maria nada disse, apenas a trouxe para os seus braços e a abraçou o mais forte que pôde. - E quanto aos planos que fizemos?

Olá Pra Sempre | BlackhillOnde histórias criam vida. Descubra agora