Arwin II - Chama Verde

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As torres verdes, palácios e fortalezas em Versi-Hay projetavam uma sombra imensurável do entardecer sobre os campos de trigo. A velha cabana no campo era um refúgio do frio do crepúsculo. Seria a noite para nunca mais voltar. Iria pisar em Versi-Hay pela última vez em sua vida.

Arwin fingia estar interessado nos abrolhos que cresciam ao pé da muralha da cidade, ele havia deixado sua carroça um pouco longe, só para escutar a conversa dos guardas. Falavam sobre a preocupação da guarda real em fortalecer as entradas da cidade nessa noite. Mas nenhum deles sabiam o motivo em específico, e isso era perfeito, nenhum deles realmente estaria preocupado em ver se a família do Mão do rei iria tentar sair pelos portões de mercadorias. Iria dar certo.

Arwin então foi até sua carroça e com um movimento da guia, o cavalo andou em direção ao pequeno e discreto portão sudeste.

— Boa tarde, senhores – disse Arwin, escondendo o máximo do rosto em sua capa e na máscara – posso passar com minha mercadoria nada suspeita? – ele riu forçadamente.

Os guardas se entreolharam e fizeram cara de desdém.

— A cidade está fechada hoje, ninguém pode entrar, volte amanhã – disse o responsável pela guarda.

— Sim, claro, – respondeu Arwin, balançando a cabeça em confirmação – Mas eu não tenho para onde ir, vou ficar à mercê dos bandidos da estrada. Talvez se eu deixar meus barris com vocês aqui essa noite, podem até tomar um gole ou dois do meu vinho de Ellys, eu possa dormir em uma cama confortável, comer uma comida quente e voltar para buscá-los amanhã.

Um dos guardas, o mais jovem, puxou os outros para longe e sussurrou com eloquência. Parecia estar surtindo algum efeito, já que as feições começavam a mudar. O mais jovem então gritou de longe.

— Desça da carroça e destampe os barris – eles riram – deixe-nos ver sua mercadoria nada suspeita.

Arwin obedeceu, desceu da carroça, destampou todos os barris e deixou os guardas se aproximarem. O aroma se espalhou no ar, ele entrava em sua narina como o perfume de uma donzela. Os guardas ficaram apenas cheirando o vinho, nada falaram. Até Arwin lambeu seus lábios.

— Nos comovemos com sua situação, mercador. Vamos deixar que entre na cidade, e cuidaremos da sua mercadoria.

— Muito obrigado, bons senhores. – agradeceu Arwin. Ele então foi tapar os barris, mas o guarda segurou seu pulso.

— Não. Primeiro beba um gole de cada barril. Não podemos correr o risco de guardar mercadoria envenenada.

Arwin sorriu e assentiu com a cabeça. Ele não podia ser suspeito. Apenas baixou sua máscara, e com uma caneca, suja de feno e pó, deu um gole de cada barril. Bebeu um atrás do outro, não era difícil, o vinho da cidade de Ellys era irresistível. No oitavo gole seus olhos pesaram. Tinha que continuar, não podia se dar ao luxo de cair no próprio truque agora.

— Aqui está, senhores – ele jogou a caneca vazia no fundo da carroça – o sabor mais doce de todo o mundo conhecido. Tenham uma boa noite, até amanhã.

— Cuidado onde dorme, viajante, Versi-Hay está louca nesses últimos dias.

A estrada para o centro da cidade estava calma, apenas alguns patrulheiros rindo nas portas de bordeis. A fortaleza real estava escura, um gigantesco amontoado de pedras, tão fácil de se perder dentro como em uma floresta densa. Haviam histórias sobre túneis que levavam ao centro da terra, corredores que se conectam formando um caminho impossível de ser percorrido sem se cansar e cair ao chão. Mas hoje era apenas um amontoado de pedras, quase completamente apagado, onde apenas uma janela indicava luz vindo de seu interior. Arwin sabia exatamente qual era aquele cômodo. Era o quarto do rei, era daquela janela que ele apresentava seus filhos, e era de lá que jogavam rosas no dia da vitória.

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⏰ Última atualização: 20 hours ago ⏰

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