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RAFAELA

A semana tinha sido cansativa. Não parei quieta nem por um segundo, para falar a verdade, não me lembro da última vez que pude respirar com tranquilidade. Essa é a primeira vez depois de dias. Seja bem vindo fim de semana.

O sol já tinha ido embora deixando a inicio da noite um pouco mais fresco. Eu havia acabado de tomar um banho para me livrar daquele cansaço persistente. Esfregando os olhos vou para o sofá pronto para assistir meu programa favorito, mas uma batida na porta me interrompe.

Era minha mãe. E ela não parecia estar muito feliz.

-Então vocês estão realmente namorando?- Ela diz batendo o pé no chão e erguendo uma revista que apareciam eu e a Duh na capa, com as testas se tocando um olhando uma nos olhos da outra. Eu sei que não é um bom momento, mas aquelas fotos realmente ficaram boas.

-A gente ainda não decidiu nada... Estamos apenas ficando- Digo com um nó se formando na minha garganta.

-Que vergonha Rafaela. Você é uma policial com um futuro brilhante, para que estragar sua vida assim? Gostando de garotas? É errado.

-Não é errado mãe. A gente apenas se ama, não estamos quebrando nenhuma lei.

-Rafaela você não enxerga? Isso é um absurdo! Namorar uma mulher? Isso é a coisa mais nojenta e sem noção que já existiu. Eu não criei minha filha para trazer outra mulher para dentro de casa. Essa não é você! Está destruindo sua vida.

Seu rosto estava vermelho. Ela tinha tanta raiva dentro de si que não encontrava argumentos, falando qualquer baboseira que vinha em sua cabeça. Aquilo começa a me deixar enjoada.

-Não tem o que fazer se eu não sinto nada por homens.

-Tem sim minha filha. Eu posso pagar um psicólogo para você e podemos resolver isso.

-Mãe! Está ouvindo os absurdos que está dizendo? Isso é ridículo.

-Eu não quero que você acabe com sua vida casando com mulher. Já pensou em como vão falar de você por ai?

-Eu não ligo para a opinião dos outros.

-Filha você precisa acabar com esse relacionamento e ir se tratar. É para o seu bem.

-Mãe eu já sou maior de idade e sei o que estou fazendo com minha vida- Tento fechar a porta, mas ela coloca o pé.

-Não. Não enquanto estiver embaixo do teto da minha casa. Quero você para fora Rafaela. Só volte quando estiver curada.

-O que?

Eu não estava acreditando. Esperava que a qualquer segundo minha mãe começasse a rir e dizer que era tudo uma piada, mas não era. Ela está mais vermelha do que nunca e eu desconfiava que a qualquer momento ela pudesse me pegar pelo pescoço.

-Pra fora Rafaela. Quero você para fora de casa até dar um jeito nessa sua rebeldia.

Alguma coisa quebra dentro de mim naquele momento. Acho que era os olhos cheios de raiva que me encaravam, ou pode ser o rosto decepcionado do meu pai que observava tudo pela janela sem dizer uma palavra. Minha mãe me agarra pelo braço encravando as unhas em mim e me empurra, como seu eu fosse um objeto sem sentimento.

-A saída é para lá. Anda logo.

De repente eu volto a ter treze anos, quando um grupinho me arrancou do armário a força e começou a fazer bullying comigo. No intervalo eu era zoada e espancada. Os olhares de nojo sempre voltados para mim. Ninguém nunca fez nada para impedir.

A coisa que eu mais queria fazer era fugir dali, daquela memória, daqueles olhares. Eu nunca imaginei que meus próprios pais poderiam fazer uma coisa dessas. Deve ser por isso que guardei segredo por tanto tempo. Agarro as chaves do carro e me apresso para ir embora, porque eu não queria que eles me vissem chorar. No caminho sinto algo passar ao lado da minha cabeça. Era a revista, toda amassada e rasgada.

Dirijo sem rumo por mais ou menos uma hora até minhas lágrimas terem secado totalmente. Eu sentia tanto ódio dentro de mim, tanto nojo, tanta angustia que só desejava poder trocar de pele. Talvez assim eu me sentisse mais limpa.

Então decido ir para casa da única pessoa que poderia me ajudar em uma hora dessas e a principal causadora de tudo isso. Dirijo acima da velocidade permitida para chegar a seu prédio. Não faço ideia em qual andar fica seu apartamento, então mando uma mensagem e sou obrigada a esperar na portaria dando meu máximo para não inundar aquele lugar com minhas lágrimas.

Atraídas pelo mesmo ritmoOnde histórias criam vida. Descubra agora