Irene corria contra o tempo para organizar a festa de casamento. Enquanto se arrumava, tratava de arrumar algumas coisas faltantes na cozinha e isso tornava o processo de ficar pronta rapidamente mais demorado. Antônio batia os pés contra o piso de madeira e Petra já tinha alisado o vestido por pelo menos vinte vezes.
Quando finalmente ficou pronta, sentiu falta de uma pessoinha que não estava em lugar nenhum. Apertou os olhos e rezou para que ela não tivesse sumido ou simplesmente preparado alguma grande surpresa que poderia acabar com toda a festa.
— Mãe! – Irene respirou aliviada quando a viu descer as escadas, ou melhor, quase aliviada.
MÃE. Poderia significar muitas coisas, muitas mesmo. Mãe, eu matei alguém. Mãe, fui presa. Mãe, bati seu carro e o pior deles Mãe, você vai ser avó e eu não sei quem é o pai. Irene descartou todas aquelas possibilidades, afinal os filhos já eram todos adultos e decididos demais para fazer aquelas besteiras.
— Arruma pra mim, por favor. – a menina virou de costas e a Irene fechou o zíper do vestido.
— Se for depender da Ayla para sermos pontuais, os convidados podem morrer esperando. – Caio alfinetou e a menina lhe mostrou a língua.
— Eu sou mulher, preciso de tempo pra me arrumar e não funciono sob pressão. – retrucou, se colocando ao lado dos irmãos. — E o Daniel?
— Foi buscar a Graça. – Petra respondeu sem muito ânimo, enquanto estava agarrada ao braço de Luigi.
Foram para o jardim da casa e realmente, Irene sabia como dar uma festa. Antônio entrelaçou as mãos e eles saíram andando e cumprimentando os convidados. Ayla e Caio pararam na mesa de salgados e ficaram lá o restante da festa.
Ayla era um milagre. A salvação de Irene no meio da tempestade e viver num mundo onde a filha não estaria não era uma opção para Irene. Ela não se imaginava sem Ayla. Irene sorriu e chamou os filhos junto com o marido para tirar a foto da família. No caminho, Caio caçou o pé da irmã que deu um leve tropeço e rebateu com um tapa no braço dele. Irene revirou os olhos e pousou para a foto. Foram vários cliques e Antônio parecia exausto, mas ainda sim fez o discurso.
— A mulher da minha vida e a quem eu quero dividir o resto dos meus dias, foi ela quem me ensinou o verdadeiro significado do amor e como ele pode ser dividido quando quatro crianças dividiam esse amor. Foi ela que me fez pai, e ela quem me fez amar. E eu quero continuar a altura da mulher que eu amo.
O puxou para um beijo que foi muito bem aplaudido, Ayla e Petra cansaram de tanto tirar fotos.
…
— Mãe? – a filha lhe chamou. — Tá tudo bem?
Irene estava perdida em seus pensamentos que não notou a filha mais nova encostada no batente da porta, brincou com a almofada e assentiu, esticando o braço para a garota lhe fazer companhia. A garota se aconchegou na mãe e recebeu muito bem o cafuné que lhe foi presenteado.
Exatamente um ano que Daniel morreu e um ano que sua vida parou e ela teve que continuar, porque o mundo ainda era mundo sem Daniel.
Há uma grande diferença entre perder e quase perder um filho e Irene passou pelas duas experiências, eram dolorosas. A dor de quase perder um filho se igualava bastante a dor de realmente perder, doía profundamente e nenhuma oração era capaz de confortar uma mãe. Era doloroso e horrível.
Quando perdeu Daniel o mundo pareceu parar, o relógio parou na madrugada do dia 07 de julho. Petra internada por overdose e Daniel morto, cômico se não fosse tão trágico.
— Faz um ano que seu irmão morreu. – ela respirou fundo. — Eu sinto falta dele.
— Eu também. – Ayla se aconchegou no colo dela. — Mas ele tá num lugar melhor, melhor do que aqui.
— É, ele tá. – tentou sorrir, mas foi em vão.
…
Casa agitada, crianças agitadas. Casa calma, crianças agitadas e quando essas malditas crianças crescem tudo se torna mais difícil. Antônio queria matar Irene por ter colocado ao mundo um bando de pestes. Adentrou a sala e eles discutiam por alguma coisa extremamente besta.
Petra estava toda torta no sofá, parecia esconder algo enquanto Caio tentava pegar aquilo da mão dela. Irene olhava desacreditada. Em um estalo, Petra corria atrás do seu pior castigo.
— Ayla, me devolve! – gritou e a mais nova lhe deu a língua. — É meu anel de casamento!
— De qual dos 500? – retrucou e Irene revirou os olhos.
— Para de provocar sua irmã. – Irene pegou a caixinha de veludo e entregou para Petra. — Meu amor! Já chegou?
— Infelizmente. – Antônio a abraçou pela cintura. — O que eles estão aprontando?
— O de sempre. – ela voltou a olhar os quatro. — Infernizando.
— Credo mãe. – Ayla se largou no sofá. — Que maldade você falar assim.
— Não tô contando nenhuma mentira. – Irene revirou os olhos. — Era bem mais fácil quando vocês eram pequenos.
— Por que? – Ayla observou quando os pais andaram de mãos dadas até o sofá.
— Porque vocês eram calmos, e a gente tinha o controle.
Irene segurava Ayla no colo enquanto arrumava os cabelos de Petra, Antônio arrumava as roupas de Caio e Daniel enquanto Angelina preparava as bolsas para saírem.
Ayla se aconchegou no colo da mãe e adormeceu, gostava de dormir sentindo o cheiro de Irene e ficava frustrada quando tinha que dormir no colo do pai. Petra era diferente, sempre foi a mais grudada no pai, mas Ayla tinha um amor inexplicável pela mãe e Irene adorava se gabar por isso.
Assim que chegaram no parque, arrumaram as coisas e se sentaram no banco. As crianças foram brincar enquanto Antônio e Irene brincavam com Ayla. Dado algum momento, o patriarca corria atrás das crianças que o obrigaram a brincar de pega-pega.
O som das gargalhadas infantis era o favorito de Irene, que observava tudo com Ayla em seu colo que ria também.
— Do jeito que você fala parece até uma família saudável. – Ayla se sentou ao lado de Petra.
— Me arrependo todos os dias de não ter te doado.
— Antônio! – Irene lhe deu um tapa na perna.
— O que? Você pariu uma cópia sua, essa garota é impossível.
— Ora papai, não seja bruto. – Ayla se sentou ao lado dele. — Não se esqueça que o seu cartão tá comigo.
— Como?
Em um piscar de olhos, Ayla fazia o próprio pai correr atrás dela para pegar o cartão.
e se…