Gurunga 13 de 14

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Bairro São Sebastião, Beija Flor, 10:38 AM

— Opa! Ô délicia! Achei um pedação! — Disse Paulo —

Tiago olhou para o que o amigo tinha encontrado, era um massivo pedaço de ferro cilíndrico que devia ter uns trinta centímetros de comprimento por vinte de circunferência.

— Esse aí vai ajudá pra pesá mais. — Disse Tiago —

Os meninos estavam num terreno baldio nos fundos de uma oficina mecânica, ali era depositado parte do lixo da oficina, em meio a montes de terra e entulho haviam peças e pedaços de ferro, algumas destas peças metálicas estavam enterradas ou parcialmente enterradas. A que Paulo havia acabado de achar estava totalmente enterrada, ele a achou por puro acaso enquanto cavava com pedaço de pau. Todo ferro que era encontrado pelos dois amigos estava sendo colocado numa velha carriola enferrujada que pertencia ao pai de Tiago. Todo aquele ferro seria vendido para Seu Joaquim, o comprador de materiais recicláveis do bairro (o único) que pagava 10 centavos por quilo de ferro. Embaixo de um grande pé de mamona, Tiago encontrou várias latas de tinta de 3 litros e meio, a maioria já meio enferrujada.

— Oba! Essas lata vai ajudar a gente ganhá uma graninha a mais, mais a gente vai tê que amassar elas e colocá num saco porque não vai cabê na carriola. — Anunciou Tiago —

Paulo foi até onde Tiago havia encontrado as latas e as olhou pensativo.

— Você fica aí amassano elas e eu vô caçá um saco pra nóis colocá elas. — Propôs Paulo —

— Tá bom — Concordou Tiago —

Paulo saiu caminhando pelos arredores em busca de algum saco para colocar as latas, mas como acontece na maioria das vezes... as pessoas quase nunca encontram o que procuram no momento que mais precisam daquilo. Depois de procurar muito por um saco de nylon ou de plástico e não achar, Paulo mudou a estratégia, ele passou a procurar por qualquer coisa que pudesse servir de recipiente para as latas e não mais focou sua atenção especificamente em sacos. Depois de vascular em um monte de lixo, Paulo achou um pedaço de rede de pesca, era grande o suficiente para acomodar todas as latas, com o pedaço de rede em mãos ele retornou para onde Tiago estava.

— Por que cê demôrô tanto? — Perguntou Tiago —

— Môç... deu um trabái da porra pra achá êss trem. — Disse Paulo jogando o pedaço de rede aos pés de Tiago —

Tiago olhou para a rede de pesca e franziu a testa.

— Uma tarrafa véa? — Questionou Tiago —

— Não é tarrafa, é um pedaço de rede véa, tarrafa é diferente. — Corrigiu Paulo —

Tiago que não entendia muito sobre instrumentos usados em pesca não discutiu sobre o que de fato era aquilo, eles estenderam a velha rede no chão e começaram a colocar as latas amassadas no centro da rede. Depois de todas as latas terem sido postas no centro da rede, os garotos juntaram as quatro pontas da rede e amarram formando uma espécie de trouxa. Com tudo pronto, Paulo ficou responsável por empurrar a carriola com todo o seu conteúdo e Tiago levou a trouxa feita de rede de pesca com as latas.

— Já deve sê quase mêi-dia, Seu Joaquim já deve tê fechado, vâm gurdá tudo lá incasa e depois do almoço a gente leva lá pra vendê. — Propôs Tiago —

Paulo olhou o horário em seu relógio de pulso digital da marca AquA, faltavam, menos de cinco minutos para o meio-dia.

— É, a gente dêxa os ferro na sua casa que fica mais perto da casa de Seu Joaquim e depois que ele abri a gente vai lá vendê os ferro. — Disse Paulo —

E assim foi feito.

Às duas da tarde eles foram até a casa de seu Joaquim levando tudo que haviam coletado, Paulo bateu palmas e chamou o dono da casa pelo nome, uma voz rouca respondeu: "Já vai!". Seu Joaquim eram um homem de meia-idade, barrigudo e com uma pele avermelhada, o homem pesou todo o material trazido pelos garotos e disse: "Deu 35 quilo e mêi". Ele pagou 3 reais e 55 centavos aos meninos, com esse dinheiro em mãos, eles foram direto para a locadora de videogame mais próxima, que não era tão próxima assim para quem iria a pé, eram mais ou menos 5,2 quilômetros até a locadora que ficava no bairro Vomita Mel, na rua Visconde de Ouro Preto.

A locadora estava com a porta de enrolar baixada até a metade para evitar a entrada direta da luz solar, então as pessoas precisavam se abaixar para entrar. Tiago e Paulo entraram, por sorte a primeira parte da locadora onde ficavam os televisores com o console da SONY, o PlayStation estava quase vazia, apenas um pivete jogava Winning Eleven 4 (jogo de futebol), na última e menor parte da locadora onde ficavam dois televisores com dois PlayStation 2, Gó, o rapaz que tomava conta da locadora estava jogando Need for Speed Underground 2 (jogo de corrida). Tiago e Paulo foram direto para os fundos onde Gó estava.

— E aí Gó, põe o Métal Slugui X pra nóis. — Pediu Tiago —

Tiago se refere a Metal Slug X Um jogo 2D com gráficos cartunescos onde se pode atirar para todo lado e em praticamente tudo, o objetivo é derrotar inimigos comuns e chefes para avançar.

Gó pausou seu jogo e se levantou com sua habitual cara de tédio para atender ao pedido dos clientes. Após colocar o CD do jogo no PlayStation 1 Slim, ligar o console e depois também ligar a TV, ele perguntou quanto tempo eles iriam jogar.

— Põe duas hora. — Disse Tiago entregando uma nota de dois reais a Gó. —

Gó ajustou o contador de tempo para a televisão desligar automaticamente após duas horas. Os meninos se acomodaram nas cadeiras de plástico e começaram a jogar. Após pouco mais de uma hora e meia eles terminaram o jogo e pediram a Gó que colocasse Mortal Kombat 4 (jogo de luta), Gó desligou o aparelho e fez a troca dos discos e ligou-o novamente. Depois de muitas lutas a TV exibiu uma contagem regressiva de um minuto para o desligamento da mesma. Eles aproveitam aqueles segundos que faltavam e continuaram lutando, Tiago acabou vencendo pouco antes do televisor desligar.

— Ô Gó! Coloca o Vigilante 8 e põe mais meia hora. — Pediu Tiago —

Tiago se refere a Vigilante 8: Second Offense, um jogo de combate veicular onde o principal objetivo e destruir os veículos inimigos.

Gó retornou com sua cara de tédio e com o porta CD em mãos, ele fez a troca dos jogos, ligou o console e a TV novamente, depois pôs mais 30 minutos no contador de tempo para desligamento. Os amigos se divertiram destruindo um ao outro no modo versus (um contra o outro) e também no modo cooperativo (os dois contra os veículos inimigos controlados pelo jogo). Ao fim do tempo determinado a TV desligou, Paulo e Tiago colocaram os controles sobre a mesinha onde ficava o PlayStation e foram embora. Do dinheiro obtido com a venda do ferro, ainda sobraram 1 real e cinquenta e poucos centavos, Paulo propôs que esse dinheiro fosse usado para eles comprarem sonhos (pães com recheio doce) numa pequena padaria próxima ao Estádio 2 de Julho.

— Vale a pena véi! Os bicho é grandão cê come que chega injuá! — Disse Paulo —

Os sonhos custavam 50 centavos cada, um valor um pouco alto, mas Paulo tinha razão quanto ao custo-benefício, eles eram realmente grandes e tinham bastante recheio de goiabada. Os garotos seguiram de volta para suas casas comendo suas guloseimas.

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