Despedidas

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Ao contrário do que Jeremy esperava, há mais do que uma só pessoa esperando por ele no vagão. Juntamente ao seu pai, Stephanie Forbes está esperando por ele.

Ela está de braços cruzados e o seu rosto está evidentemente vermelho, um sinal claro de que chorou muito durante o percurso. A estação de trem fica distante do distrito 12, embora seja uma extensão dele, e Jeremy se pergunta se seu pai e Stephanie conversaram um com o outro no caminho longo até ali, ou se seguiram em repleto silêncio.

Conhecendo seu pai como Jeremy o conhece, ele imagina que se trate da segunda opção.

Stephanie se levanta quando Jeremy fecha a porta, finalmente notando a sua presença e ficando agitada com isso. Dá para ver que ela está lutando contra tudo de si para não agarrar Jeremy em um abraço apertado ali mesmo. Ele entende, ele realmente entende, porque em todos esses anos, Jeremy nunca sentiu que precisava tanto ser tocado como sente que precisa agora.

Mas apesar de querer, Jeremy não faz nada a respeito. Ele sabe que o seu corpo não vai reagir bem, e ele sabe que no fundo, é só aquela pequena parte tátil dele já sentindo falta do pai e da melhor amiga, mas que não é racional e nem amistosa, então o seu emocional também não vai reagir bem a esse contato.

A partir do momento em que Jeremy tocar alguém, principalmente em um momento de tensão como esse, ele vai se despedaçar. Os Jogos Vorazes começaram no segundo em que seu nome foi chamado, e Jeremy não pode se dar a esse luxo.

Então eles permanecem nesse impasse. Apenas três corpos que se contraem para não invadir o espaço um do outro. É egoísta da parte de Jeremy não se deixar ser abraçado mesmo em uma despedida? Seu pai não parece ferido, apesar de magoado pela perda do filho, ele o conhece o bastante para saber que um abraço faria mais mal do que bem a Jeremy. Mais do que isso, Jeremy sente que se seu pai o abraçasse, seria incapaz de soltar.

Stephanie provavelmente também pensa o mesmo, porque ela estica os braços para trás do corpo e seu queixo treme. É particularmente doloroso de se assistir, uma dor causada a quem ele mais ama e por culpa exclusivamente sua. Jeremy não consegue suportar.

— Me desculpe — Essa é Stephanie. — Eu não tive coragem... Eu queria tanto, mas não tive coragem de me voluntariar por você.

— Que bom — É tudo o que Jeremy diz por um tempo. — Porque Stella e Lizzie precisam de você. Eu preciso de você, Steph. Preciso de você em casa, sabendo que está segura e à salvo.

Stephanie maneia com a cabeça.

— Isso não é justo — Ela diz. — Por que você? Era seu último ano! Nós estávamos tão perto.

Pois é, Jeremy pensa. E agora eu estou sendo enviado para a arena junto de um garoto no qual sou apaixonado.

Não que Stephanie saiba disso, nem que seu pai saiba. Ninguém além de Jeremy, completamente consciente e auto sabotador, sabe.

— Eu sei que é pedir demais, mas talvez se vocês... Se vocês não assistissem aos jogos...

— Nós vamos assistir, filho — Já esse é seu pai, um homem alto e grande mas que possui uma gentileza enorme, e se Jeremy não estava chorando antes, agora ele definitivamente está. Apenas a voz do seu velho é capaz de fazê-lo se encolher e soluçar. Sem Jeremy por ali, seu pai não terá mais ninguém.

Há muito tempo, na verdade, ele não tem tido ninguém. Porque Jeremy é apenas um fantasma assombrando a própria casa, morando ali mas não vivendo realmente ali. Ele e seu pai sempre tiveram essa relação complexa, apesar de estável. Sem a menor comunicação, nunca foram necessárias palavras ou declarações para demonstrar o carinho que nutriam um pelo outro. Eles simplesmente sabiam. Mesmo que doentes e tediosos, Jeremy e seu pai se entendiam e nunca faziam perguntas. Era parte de como conviviam um com o outro, mas também como não conviviam.

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