the hunger games

O Amor Está No Ar

Num primeiro momento, quando abre os olhos, seu pescoço dolorido devido a posição no qual dormira, ele não tem certeza de onde está. Há muito pouco para olhar, na verdade. Acima de sua cabeça, Jeremy encontra apenas o teto altíssimo e rochoso que se assemelha ao de uma caverna.

Antes de se obrigar a levantar e encarar o que há ao redor, no entanto, Jeremy se permite ficar deitado por incontáveis segundos. É quando uma nova onda de angústia o varre, mais forte e poderosa do que todas as outras, e Jeremy consegue precisamente diagnosticá-la: saudades de casa.

Logicamente, Jeremy sabe que sofreu abuso quando ainda era criança. Ele sabe que não há uma razão concreta para sentir falta de casa, uma vez que tudo no distrito 12 o lembre constantemente o porquê ele quer morrer. Ele sabe que o dano interno é mais profundo do que qualquer cicatriz que a vida tenha lhe dado e que ele é, efetivamente, uma vítima da síndrome de Estocolmo, identificando-se com sua raptora, considerando uma bondade quando sua mãe não abusava dele. Jeremy poderia dissecar interminavelmente suas próprias reações e a de todos que o conhecera quando sua mãe estivera viva, mas no momento tudo o que ele consegue pensar é: Quero ver meu pai. Quero ver Steph. Quero voltar a vida que eu tinha antes de todo esse inferno, porque isso é infinitivamente pior.

É quando Jeremy se lembra, realmente, onde está: na arena. É seu quinto dia nos Jogos Vorazes, ele está há três dias desde que se separou do restante dos seus aliados e assassinou uma pessoa, e há vinte e quatro horas sem movimentar-se para lugar algum, apenas Isaac e ele pressionando-se contra as paredes e torcendo para não serem vistos. Os dois não ousaram sair da caverna no quarto dia, Isaac estava mal demais devido a queimadura no seu ombro e Jeremy estava traumatizado demais para ousar se esgueirar para qualquer lugar — ele não sabia se conseguiria levantar a mão para alguém novamente, e isso era tão perigoso quanto um alívio.

No quarto dia, nenhuma morte foi anunciada, o dia se expressou de forma extremamente longa e, ao mesmo tempo, fácil de aturar. Ele e Isaac só precisaram se manter escondidos e então aproveitaram dessa boa oportunidade para dormir tanto quanto podiam. Eles não sabiam se haveria outra oportunidade para descansar, trataram cada soneca como se fosse a última.

Não houve mais conversas profundas nem declarações, nada desde a noite do terceiro dia, onde Jeremy murmurou promessas ao ar em sua forma meio sonolenta.

— Isaac? — ele chama agora, no quinto dia, levantando-se meio grogue e pondo as pernas para funcionar, esquecendo-se por alguns instantes da dor presente em sua batata esquerda.

Quando Isaac não responde, Jeremy rodeia o lugar. O desespero lhe chega ao peito e ele sai da caverna.

Jeremy não é um gênio, embora seus professores sempre tenham lhe dito "Jeremy, suas notas são excelentes!" ou "Jeremy, seu cérebro é fascinante!", ele não se considera um gênio, mas ainda assim está ciente de que tem uma boa noção de tempo apenas pela localização do sol. É cedo, muito cedo, ele pode dizer que o sol acabou de acordar também, então Isaac não deve estar muito longe. Ele não seria maluco de sair por aí no meio da noite.

Ao menos que tenham pegado ele, pensa Jeremy, porque antecipação sempre foi a sua forma predileta de tortura.

Do lado de fora, o sol é fraco e não lhe queima a pele — não ainda — mas a pele de Jeremy já está prejudicada devido as caminhadas no sol que eles deram nos demais dias. Felizmente, Jeremy não precisa se preocupar com a sua aparência, há muito pouco para ele viver dali em diante.

— Isaac? — Ele repete, desta vez mais alto, e o som de passos chegam nos seus ouvidos juntamente ao desespero.

Se há algo no qual a arena lhe ensinou e nada mais poderia fazer na mesma intensidade, é que ele deve se manter sempre em alerta. Assim que escuta os passos, Jeremy volta para onde suas coisas estão e puxa a sua lança em direção a sombra do indivíduo que se forma do lado de fora. Chega a ser automático, agora, o quão preparado Jeremy está para ser atacado em qualquer direção. Ele supõe que isso esteja o deixando paranóico.