Capítulo 13:

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_Sicely pov_

─ " A sensação que me persegue é a real face do medo mais profundo " ─

A claridade incomodava meus olhos de maneira a me fazer despertar do que parecia ter sido um sono profundo e pesado. Eu pisquei algumas vezes despertando de vez e então notei onde estava. A escrivaninha no canto do quarto, a pequena janela com uma fina cortina branca e o criado mudo ao lado da cama onde sempre deixava um pequeno vaso com uma rosa e meu celular.

Era o que eu esperava que fosse ver ao acordar, porém, o que vi foi a sacada a frente da cama a qual tinha uma vista magnífica para cidade, Jerusalém, eu ainda estava ali, eu acordei ali novamente, não voltei para o meu século..não sabia exatamente o que fazer ou o que pensar sobre isso. Eu deveria ter voltado, eu fiz o que era preciso então porque continuo aqui? Eu me levantei e caminhei até a beira da sacada tentando aliviar a tensão instaurada em meu corpo. Eu tinha medo do que minhas ações poderiam causar no futuro, havia uma frase que rodeava em minha mente, "o mínimo contato com algo do passado poderá mudar drasticamente o futuro", eu o salvei, mudei o seu destino e de todos nesse reino, o que isso afetará no futuro? E se ficasse aqui, sendo alguém de um século tão distante deste e ao mesmo tempo pertencendo aqui também o que afetaria no meu futuro?
Talvez eu nunca saberei como aquele século está com o que eu fiz.

Mas se fosse preciso, eu faria tudo de novo, por ele. Para vê-lo bem e feliz como um homem normal e saudável, para que ele seja livre em suas escolhas e não seja limitado nunca mais em absolutamente nada, e mesmo se eu soubesse que ao curar ele o meu século não seria mais nem sombra do que era ou foi algum dia, eu ainda sim o faria. 

Sinceramente não há nada naquele futuro que me importe, não há nada lá que me prenda naquele século, eu tentei voltar porque era o certo a se fazer, mas não voltei por algum motivo, esse é o meu lar eu sinto isso, sinto que devo ficar e quero ficar, para sempre.

Quero ficar com ele, ao seu lado como sua rainha, agora sinto como se a barreira de culpa e medo que me impedia de amar ele como tanto queria tivesse desaparecido assim que abri meus olhos. Apesar da confusão, a certeza de pertencer a este reino e a este século me preencheu assim que que acordei. Eu sorri feito uma criança, ri sozinha ali admirando aquela bela cidade, o meu coração batia forte em resposta a felicidade que aos poucos ia me consumindo. Queria correr até ele, abraçá-lo e não soltar mais, queria senti-lo novamente como ontem.

Eu estava tão eufórica que não queria perder mais um minuto longe dele, corri para dentro e me troquei rapidamente deixando o vestido e o colar que ele havia me dado em cima da cama, recostei a ponta dos dedos sob ambos sorrindo de canto e então me virei para a porta.

Antes de abri-lá notei um pequeno envelope no chão, eu o peguei curiosa, pensava que tinha sido Balduíno que o deixará ali hoje mais cedo, mas estava assinada por Renaud.
Oque aquele homem detestável queria comigo para enviar uma carta por debaixo da minha porta? Eu me perguntava enquanto abria o papel.

Um dos meus pacientes, Frendel, um garotinho de apenas 8 anos o qual tinha um grave problema no coração, eu havia o tratado, ele estava estável e bem se recuperando, era previsto que ele ficaria bem dentro de algumas semanas porém, segundo Renaud seus pais tinha mandado me chamar, suplicando para que eu fosse até ele pelo medo de perdê-lo devido a sua piora.

Eu realmente não esperava por aquilo, o tratamento havia corrido bem, mas algo deve ter acontecido. Meu encontro com Balduíno haveria de esperar, nós temos todo o tempo do mundo agora, e uma vida inteira juntos.

Eu cobri meu rosto com um lenço e então sai pelos portões do palácio, evitei passar no meio da via principal para que chegasse mais rápido por entre as casas. Eu corria por entre as vielas pensando em como ele estaria, talvez tivesse visto a mensagem tarde de mais, eu garanti que ele ficaria bem como todas as outras crianças e que poderia finalmente brincar sem ter a preocupação que seu coração falharia a qualquer momento, eu prometi a ele, não poderia decepcionar aquela criança e desenganá-lo tão friamente assim, eu tinha total certeza de que tinha corrido tudo bem, e enquanto corria me perguntava e tentava pensar incessantemente no que poderia ter acontecido e ia pensando em todas as possibilidades já tentando achar uma solução para tratá-lo.

Em meio a correria eu não notei que acabei chegando a uma viela sem saída, me virei frustada pela falta de atenção que me custaria alguns minutos mas parei assim que a entrada foi bloqueada por uma carruagem e de lá saiu duas figuras com seus rostos escondidos atrás de um lenço preto. Eu senti um arrepio gélido por todo o meu corpo e um aperto no peito em resposta ao medo que ia crescendo em mim a cada batida desenfreada do meu coração causada também pela euforia de ter corrido tanto, era como se meu próprio corpo tentasse me avisar de algo ruim que se aproximava.

Eu estava encurralada, totalmente sem saída, pedi que me dessem licença para passar mas não obtive resposta. Meu rosto estava tampado, e mesmo se estivesse descoberto que valor eu teria para eles? Minha posição atual não traria a eles muitas moedas, então que motivação fazia com que os mesmos tivessem a intenção de me sequestrar? Pensar naquilo estava me deixando apavorada, contudo, não tive mais que três minutos para pensar em algo para fazer e sequer consegui gritar por ajuda.

Eles me cercaram e tamparam meu rosto com um pano com o que parecia conter éter ou algo parecido, eu senti meu corpo perder as forças e meus olhos se fecharem lentamente, eles me carregaram e me colocaram dentro daquela carruagem e então fui envolta de uma escuridão.

Recobrei a consciência um tanto rápido, somente um deles estava comigo e ele estava distraído com a outra janela, o mesmo estava inquieto, com as mãos e pernas trêmulas, ele sequer notou que eu havia acordado, nós estavamos chegando na entrada da cidade, eu tentei não me mexer muito para não atrair a atenção dele em mim, mas me ergui o suficiente para olhar melhor pela janela.

Eu vi Balduíno cavalgando com Rosalie, e em questão de segundos ficamos lado a lado, vi ali minha oportunidade de gritar por ajuda, gritei por ele uma única vez antes de ter minha boca tampada, eu usei todas as minhas forças para me soltar dele, mas era tarde de mais, nos afastamos tão rapidamente como nos aproximamos, e o vi se virar para adentrar a cidade novamente com ela. O desespero tomou conta de mim quando percebi que estava completamente sozinha agora, e que se não fizesse nada eu seria levada por aqueles homens.

Alcancei algo no banco e bati nele com força, com toda força que eu tinha na esperança de abatê-lo pelo menos o suficiente para deixá-lo atordoado para correr, ele caiu aos pés da carruagem e vi ali minha oportunidade de fugir, me levantei e fui até a porta, porém antes mesmo de abri-lá ele agarrou meu braço e me jogou de volta no banco. Eu conseguia ver a raiva estampada em seus olhos pelo o que eu havia feito, escorria sangue de sua testa, embora não conseguisse ver quem era por trás daquele lenço, aquele olhar rude e rodeado de maldade era familiar. Antes que pudesse pensar em fazer algo a mais eu senti meu rosto arder e um gosto metálico preencher a minha boca.

Ele havia cerrado a mão em meu rosto como se descontasse toda raiva que sentia, eu levei a mão em meu rosto e senti meus olhos arderem tanto quanto minha bochecha. Era como se houvesse algo tampando minha garganta e o desespero corresse por cada uma das minhas veias.

Ele apertou aquele pano contra meu rosto mais uma vez e fui aos poucos perdendo a consciência. Antes de apagar completamente eu o ouvi balbuciar " seu querido rei não virá salva-lá, não depois de abandoná-lo ".

E foi ali nos segundos mais longos de toda minha vida, quando a angústia atuava com o trabalho de me punir tão brutalmente em nome da sensação que eu mais odiava, que me fazia relembrar de quando estava finalmente nos braços dele noite passada, completamente segura e amada, " eu nunca devia ter soltado ele" eu repetia a mim mesma enquanto ia sendo tomada pela escuridão mais tenebrosa e incerta da minha vida.

𝔓𝑟𝑒𝑑𝑒𝑠𝑡𝑖𝑛𝑎𝑑𝑜𝑠𓂃⊹๋࣭ ⭑Onde histórias criam vida. Descubra agora