Capítulo 2-

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  Com o fim da excitação do momento, a fome voltou a apertar forte em Válter e em seu companheiro, Gerúndio. Por sorte, os homens já estavam em uma rua que tinha algumas bancas de frutas, e resolveram comprar um melão para comerem ali na hora. Por ser uma fruta com bastante água, não gastariam tanto.

— São quarenta réis — disse o dono da banca, vendo o interesse dos homens nos melões.

— Oxente, quarenta réis? Isso é um roubo, esse melão até meio murchinho tá! — exclamou Gerúndio, indignado.

— Quarenta réis e ponto, se não quiser, vá pra baixa da égua! — retrucou o dono, com raiva. Alguns volantes oprimiam muito as pessoas, e o jeito de falar de Gerúndio fez o pobre senhorzinho achar que ele era um deles.

— Peço desculpas, mas quarenta réis é realmente muito caro, e parece que os melões estão na banca há dias. Poderia fazer por vinte réis? — falou Válter, tentando negociar com o vendedor.

— Quarenta, deu trabalho plantar!

— Eu sei, mas a banca tá bem cheia e, nessa seca, com certeza não está cheia por fatura. Terá mais lucro vendendo por vinte do que não vender.

  Ouvindo isso, o vendedor pensou e resolveu fazer pelos vinte réis. Os dois homens compraram a fruta e decidiram comer ali mesmo. Gerúndio pegou um pequeno canivete da cintura para cortar o melão, mas foi parado por Válter.

— Oxi, homi, cê num tá pensando em cortar com esse canivete que vosmicê já meteu em uns vinte cabras, não né? — questionou, indignado.

— Esse só uso pra cortar comida — ele riu e cortou um pedaço do pequeno melão, dando para o amigo.

— Gradecido! Quer um pedaço? — Válter perguntou gentilmente ao dono da banca. Sua aparência esquelética demonstrava que ele estava passando por dificuldades, mas a resposta acabou sendo curta e grossa.

— Se eu quisesse, teria comido!

Ouvindo aquilo, ele desistiu de tentar conversar com o senhor. Além disso, um novo cliente havia chegado. Era um homem na faixa dos 27 anos, usava roupas finas, tinha pele clara, cabelos castanhos e olhos cor de avelã. Um homem da alta dessa região. Válter conhecia muitos ricaços, mas esse não estava na lista.

— Santos, a cada dia que passa, está agindo pior do que um louco. Está difícil suportar essa situação — comentou Válter com o amigo de forma discreta, para que as pessoas ao redor não o ouvissem. Em seguida, deu uma mordida no pedaço do melão, que naquele momento pareceu ser a comida mais saborosa do mundo.

— Sim sinhô, às vezes ele perde as estribeiras conosco, que somos seus próprios companheiros — concordou Gerúndio, sem entender a indireta de Válter. — Mas continuo sem acreditar que a tal da Pétala Negra matou o coronel Lorenzo. Ninguém desse bando havia matado alguém! — prosseguiu, mordendo o melão.

— Oh my God! Coronel Lorenzo foi morto pela cangaceira?! — perguntou o cliente, atônito, com um sotaque americano ao ouvir o que os dois homens estavam falando.

— Sim, encontramos morto, apunhalado. Tudo indica que foi o bando dela que cometeu o crime — respondeu Válter, franzindo a sobrancelha. "Ora, cabra saiu da América pra ficar ouvindo fofoca de Pernambuco", pensou ele, um pouco irritado. Falava baixo para ninguém se intrometer, mas ainda assim, foram ouvidos.

— Oh God! Uma fatalidade, Lorenzo era meu conhecido — lamentou o gringo, pagando e pegando as compras. — Até mais, obrigado pela informação! — agradeceu e saiu do local.

   Ao se afastar um pouco, Válter se aproximou da orelha de Gerúndio e disse:

— Enquanto ele falava, notei. O sotaque dele não é de americano, não passa de um brasileiro forçando.

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